JEREMIAS E OS FALSOS PROFETAS
Publicado na Folha de S.Paulo, quarta-feira, 7 de dezembro de 1977.

Acerca dos profetas: O meu coração está quebrantado, todos os meus ossos estremecem, estou como o embriagado por causa do Senhor e das suas santas palavras. Porque a terra está cheia de adúlteros. Estão todos contaminados, tanto os profetas como os sacerdotes —até na minha casa achei sua maldade, diz o Senhor.
Portanto, o caminho deles será escorregadio e escuro; serão empurrados e cairão nele. Nos profetas da Samaria bem vi eu sua loucura; profetizavam em nome do demônio e faziam errar meu povo. Mas nos profetas da capital vejo coisa horrenda - cometem adultérios, andam com falsidades e fortalecem as mãos dos malfeitores.
Portanto, assim diz o Senhor dos Exércitos acerca (destes) profetas: Eu os alimentarei com absinto e lhes darei de beber água venenosa. Porque destes profetas se derramou a impiedade sobre toda a terra.
Assim diz o Senhor dos Exércitos: Não deis ouvidos às palavras dos profetas que entre vós profetizam e vos enchem de vãs esperanças; falam das visões dos seus corações e não do que vem da boca do Senhor.
Dizem (os profetas) continuadamente aos que me desprezam: "O Senhor disse:
— Paz tereis. E a qualquer um repetem
— Não virá mal sobre vós. Mas quem esteve no conselho do Senhor e ouviu sua palavra?
Eis a tempestade (que prepara) o Senhor: Um furor sairá e um redemoinho passará pela cabeça destes perversos. Não se desviará a ira do Senhor até que se cumpram os desígnios do seu coração. Nos últimos dias entendereis isto claramente.
Não mandei estes profetas (diz o Senhor), eles vieram correndo. Não lhes falei nada, eles profetizam por sua conta!
Se tivessem estado no meu conselho então teriam ouvido minhas palavras ao povo e o teriam feito voltar do mau caminho e da maldade das ações.
Acaso sou Deus apenas de perto e não enxergo longe? Ocultar-se-á alguém em esconderijos imaginando que não os alcance?, disse o Senhor.
Tenho ouvido o que dizem estes profetas proclamando mentiras em meu nome, dizendo: "Sonhei, sonhei..." Até quando sucederá isto?
O profeta que tem sonho, conte-o como sonho (apenas), mas aquele em quem reside minha palavra transmita minha verdade. A palha não é trigo, diz o Senhor.
Sou contra estes profetas que furtam (o significado) de minhas palavras. Sou contra estes que profetizam sonhos mentirosos e os contam. Sou contra os que propalam mentiras e fazem vagar meu povo. Eu não os enviei, não lhes dei ordem alguma. Nenhum proveito trazem ao povo, disse o Senhor.
Quando o povo, profeta ou sacerdote, perguntar: "Qual é a pesada sentença do senhor"?, respondereis: "Vós sois o peso". Quanto ao povo, profeta e sacerdote que disser: "Sentença pesada do Senhor" —a este homem castigarei. Nunca façais menção à "sentença pesado do Senhor" —porque a cada um lhe servirá de sentença pesada a própria palavra. Não torçais minha palavra, diz o Senhor. Eu vos arrojarei de minha presença, porei sobre vós perpétuo opróbrio e eterna vergonha que jamais serão esquecidos.

Jeremias (do hebraico Iermiahu) (cerca 630 a. C.) foi um dos mais importantes profetas de Israel. Filho de Hílquias, sacerdote do vilarejo de Anatote, nas terras de Benjamin. No Velho Testamento, o Livro de Jeremias está colocado em segundo lugar. Suas famosas lamentações compõem um livro a parte, escritas sob forma poética mantida até hoje. O papel dos profetas no antigo reino de Israel é extremamente importante. Eram lideranças populares vocalizando sempre a sabedoria dos antigos, tentando influir seja na condução dos negócios do Estado seja nos costumes. Para ganhar autoridade, os profetas falavam em nome de Deus, na primeira pessoa. O estilo hebraico das prédicas e parábolas continuou nas mensagens do Novo Testamento, dele utilizando-se largamente Jesus e os evangelistas de origem israelita. Naturalmente, não existia o mandato de profeta. Ganhava credibilidade aquele cuja mensagem era mais forte, cuja crítica era mais audaciosa e contundente. Por isso, muitos foram encarcerados e perseguidos. Desta forma, surgiram inúmeros falsos profetas, do mesmo modo que da abertura messiânica deixada pela filosofia israelita aproveitaram-se muitos falsos messias, notadamente na Idade Média. Jeremias percebeu o perigo destes falsos com suas perigosas previsões que poderiam atenuar e desviar os desígnios sociais, morais e políticos dos profetas autênticos e investiu contra eles num famoso sermão. O texto abaixo foi atualizado e sintetizado da Bíblia em português (trad. de João Ferreira de Almeida, ed. da Sociedade Bíblica do Brasil, 1969) e está contido no Livro de Jeremias, capítulo 23, versículos 9 a 40.

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