Prosseguindo
no curso introdução historica à filosofia,
o professor Roland Corbisier proferiu, quinta-feira ultima, no
auditorio do Museu de Arte Moderna, a sua primeira conferencia
sobre a "Filosofia Existencial de Heidegger".
Iniciou o professor Corbisier a sua conferencia salientando a
importancia do pensamento de Heidegger no quadro da filosofia
alemã contemporanea. Lembrou que Heidegger foi aluno de
Husserl e seu substituto na Universidade de Heidelberg.
Assim com Scheler e Hartmann, Heidegger tambem sofreu uma profunda
e decisiva influencia do autor das "Meditações
Cartesianas". Afasta-se, porem, do mestre ao recusar a "redução
fenomenologica", o que levou Husserl a acusar a sua doutrina
de "autropologismo".
Heidegger se utiliza da fenomenologia apenas como metodo, capaz
de permitir a constituição de uma ontologia geral.
A esse respeito, salientou o professor Corbisier que para Heidegger
a "analitica existencial", isto é, a fenomenologia
da existencia humana não é o objetivo ultimo da
filosofia, mas uma introdução à ontologia
geral. A metafisica encontra assim o seu ponto de partida na analise
do "Dasein", isto é, da existencia humana. Essa
precedencia explica-se por ser o homem o unico ente capaz de refletir
e de formular a questão relativa ao ser. "O homem
é o ente que se interroga sobre o ser de todo ente".
Embora seja frequentemente incluido entre os filosofos existencialistas,
o proprio Heidegger esclarece que "minhas tendencias filosoficas
não podem ser classificadas na "Existenzphilosophie".
A questão que me preocupa não é a da existencia
do homem; mas a do ser em seu conjunto e enquanto tal".
O autor de "Sein und Zeit" estabelece uma distinção,
intraduzivel em português, entre a sua analitica "existentiale"
e a de Jaspers, por exemplo, que chama de "existentielle"
por ser "a fenomenologia de uma existencia particular".
O ponto de partida da "analitica existencial" é
o exame de uma estrutura ontologica unitaria e fundamental, que
é o "in-der-Welt-sein", quer dizer, o "ser
ou estar no mundo".
O conceito do "in-der-Welt-sein", disse o professor
Corbisier, não passa da repercussão, no plano da
autropologia, da tese fenomenologica da estrutura intencional
da consciencia.
O homem e o mundo são termos correlatos e inseparaveis,
pois assim como não é possivel admitir nem imaginar
o homem fora do mundo, tambem não é possivel conceber
o mundo fora da perspectiva humana, na qual se configura como
mundo. Essa inserção ou "inerencia" no
mundo constitui o proprio motivo da nossa existencia.
Entre os primeiros "existenciais" que revelam essa "inerencia"
do "Dasein" no mundo, encontramos a "preocupação".
O ser humano se preocupa com este ou aquele objeto porque fundamentalmente
é o ser preocupado com o mundo. O "Dasein" está
assim em contacto com o mundo dos objetos ou dos "utensilios"
e tambem em contacto com os outros "Dasein".
E porque o "Dasein" não é uma coisa, um
objeto, mas um conjunto de possibilidades, sua vida é luta,
esforço e conquista do proprio ser.
No seu "convivio" com os objetos e com os outros entes,
o "Dasein" corre sempre o risco de perder-se, de alienar-se,
diluindo-se na "objetividade" das coisas ou despersonalizando-se
na existencia banal que se desenvolve sob a tirania do que Heidegger
chama de "Das Man", isto é, "todo mundo".
O "Dasein" pode, pois, perder-se na falta de autenticidade
da existencia banal ou recuperar-se e encontrar-se a si mesmo
na existencia autentica.
O exame desses dois modos de ser, que segundo Heidegger, se oferecem
ao homem, será o assunto da proxima conferencia do professor
Corbisier.