NO ADEUS, OUTRA GOLEADA


Publicado na Folha de S.Paulo, quinta-feira, 24 de junho de 1982

O Brasil completou ontem sua participação na primeira etapa da Copa do Mundo, em Sevilha, ao derrotar facilmente a fraca seleção da Nova Zelândia por 4 a 0, com dois golpes de Zico e os restantes de Falcão e Serginho, também com participação do atacante do Flamengo, o melhor da partida. Mas o técnico Telê Santana já tem um forte motivo para preocupação: Serginho, ao fazer seu gol, sentiu forte dor na coxa esquerda.
Depois da partida, os médicos Ricardo Vivacqua e Neylor Lasmar não quiseram fazer qualquer prognóstico, dizendo que isso só seria possível dentro de 24 ou 48 horas.
A seleção brasileira deverá viajar para Barcelona amanhã, onde ficará hospedada no Hotel Mas Pado, realizando apenas treinos até o dia 2 de julho, quando fará a primeira partida da segunda fase.
Os resultados dos outros dois jogos de ontem - Argentina 2 x El Salvador 0, em Alicante, e Itália 1 x Camarões 1, em Vigo - definiram os adversários do Brasil na segunda fase da Copa, no Grupo C, em Barcelona. Serão a Argentina, 2° lugar no Grupo 3, e a Itália, 2° lugar no Grupo 1. A Hungria, no Grupo 3, e Camarões, no Grupo 1, foram eliminados.
Também está formado o Grupo A, onde ficaram a Polônia, vencedora do Grupo I, de La Coruña; a Bélgica, ganhadora do Grupo 3, de Alicante, e União Soviética, 2° lugar do Grupo 6, da Sevilha. A primeira partida pelo Grupo A, em Barcelona, será entre belgas e poloneses.
Hoje, haverá mais três jogos, que poderão ser decisivos para os grupos 1, 4 e 5: Argélia x Chile, em Oviedo; França x Tchecoslováquia, em Valladolid, e Honduras x Iugoslávia, em Zaragoza.

Agora é a vez da Itália e a Argentina

Em Barcelona, Telê pretende manter o mesmo time, apesar de Serginho ser dúvida por causa de sua contusão

Aroldo Chiorino, Roberto Salim, Luiz Fernando Rodrigues

Sevilha - O técnico Telê Santana não pensa em qualquer alteração na equipe do Brasil para os jogos da segunda fase da Copa, contra a Itália e a Argentina, apesar da contusão de Serginho. Mas ele espera que durante os nove dias de folga até o próximo compromisso o jogador possa estar fisicamente recuperado. Adiantou, no entanto, que tem três opções para o comando do ataque, com Sócrates, Renato e Roberto Dinamite. Entretanto este último não haveria outras mudanças na estrutura da equipe, mas se Sócrates tiver de jogar de centroavante, Zico passa para o meio e Paulo Isidoro entra na ponta direita. "Não façam a pergunta se vou mexer no time porque eu repondo o de sempre, escalação somente na véspera de cada partida" - disse Telê na entrevista com a imprensa, depois da vitória de ontem, sobre a Nova Zelândia, por 4 a 0.
Por volta dos 30 minutos do segundo tempo o técnico tinha duas substituições planejadas e assim é que Edevaldo e Edinho foram para o aquecimento. Mas, com a contusão de Serginho, entrou Paulo Isidoro para a ponta e Edinho foi ocupar o lugar de Oscar, que atuou ainda um pouco resfriado. A oportunidade de Edevaldo ficou para outra vez. Telê afirmou que colocaria Edevaldo para que o jogador pudesse ter uma oportunidade, pois "vem treinando muito bem e não acho nada de anormal numa alteração desta natureza". Houve, no entanto, especulações de que o treinador gostaria de testar, juntos, Edevaldo e Edinho, que até poderiam entrar contra a Argentina, porque são jogadores mais vigorosos e que sabem corresponder nas jogadas mais difíceis, ou até mesmo numa possível violência do adversário. Por outro lado, falou-se que Paulo Isidoro seria mantido na ponta, caso Serginho não possa jogar dia 2, contra o vencedor de Itália x Argentina. Tudo na base da especulação, porque o técnico nada mais adiantou do que as três opções que tem, caso o centroavante do São Paulo não possa atuar.

Sobre os próximos adversários, afirmou o treinador:

"Aquele que cair temos que enfrentar e não podemos ficar escolhendo adversários. Parece-me que a Argentina andou melhor do que Itália, que empatou os seus três jogos. O time italiano é bom e acredito que poderá crescer daqui para a frente. A equipe argentina já demonstrou que realmente tem qualidades. Quanto a nós geralmente jogamos de acordo com o adversário e a equipe cresce quanto mais difícil e o compromisso. Espero que isto realmente ocorra na segunda fase. Porque os adversários devem ser respeitados, como o foram todos até agora. a Itália teve chance de ganhar de Camarões, perdeu oportunidade mas pode melhorar. A Argentina todos nós conhecemos, pois está praticamente com os mesmos jogadores da Copa de 78".
O técnico acredita que o grupo formado com o Brasil, Argentina e Itália poderá ser o mais difícil da nova fase da Copa, destacando, principalmente a rivalidade continental que existe com os argentinos. Crê também que Itália e Argentina poderão realizar boa partida e que para ele não deixa de ser uma vantagem ver os adversários em confronto antes de enfrentá-los. "Mas aquele que nos enfrentará por último também terá a oportunidade de observar melhor a nossa maneira de jogar".
Assim se manifestou sobre a participação brasileira na primeira etapa: "Tivemos um jogo nervoso contra a União Soviética, sofremos o primeiro gol e pudemos nos recuperar bem na fase inicial. Praticamente aconteceu a mesma coisa contra a Escócia, mas os soviéticos foram mais difíceis. A Nova Zelândia não foi um adversário difícil e a equipe se resguardou, principalmente nas bolas divididas. Isso foi instrução dada e eles, automaticamente, procuraram se poupar quando sentiram que a partida já estava ganha. O que precisamos é manter o treinamento, para que a equipe possa progredir mais ainda e chegar realmente ao ponto ideal".
Telê analisou a partida de ontem: "Estivemos bem, com muitos chutes a gol, com a equipe jogando com movimentação e interesse. O rodízio pela direita funcionou satisfatoriamente aparecendo melhor na fase inicial, passando pelo setor vários jogadores. O time da Nova Zelândia marcou bem e isso foi bom para nós, que mesmo assim conseguimos fazer quatro gols. Outros poderiam ter surgido, mas estou satisfeito, porque o trabalho da equipe me agradou."
Ao saber que o técnico da Nova Zelândia disse que o Brasil será o campeão do mundo, Telê respondeu: "Acho que futebol a gente prova no campo. Não adianta apenas ser bom, é preciso saber jogar com eficiência e chegar às vitórias. Não podemos nos esquecer do que aconteceu com o Brasil em 50 com a Hungria em 54 e com a Holanda em 74, que tinham as melhores equipes e não conseguiram chegar ao título".
Para o técnico brasileiro foi importante a conquista dos seis pontos na primeira fase, por entender que o Grupo 6 foi o mais difícil de todos. "É importante vencer porque assim o time ganha cada vez mais confiança. Respeito os adversários sem temê-los e espero o mesmo sucesso na segunda etapa da Copa."
Telê Santana acha que, na partida de ontem, Éder não teve muita chance pela esquerda, porque as jogadas saíram mais pelo meio e pelo rodízio feito pela direita. Não estranhou que Éder tivesse desperdiçado três escanteios, por entender que o jogador tentou o gol direto. "Nos treinos o Éder tem procurado fazer do escanteio uma jogada difícil e perigosa para a área adversária, e acho normal que o mesmo seja tentado durante a partida, mas hoje (ontem) ele não foi muito feliz" - disse o técnico.
Finalizando a entrevista, Telê Santana agradeceu a ordem e a disciplina em que ela transcorreu, a acolhida que a seleção brasileira teve em Sevilha e elogiou publicamente a imprensa estrangeira, em especial a da Espanha.

Jogadores aprovam "quadrado mágico"

Nem Zico reclamou, desta vez, do "sacrifício" que representa jogar fora de posição, "cumprindo as ordens do técnico". É certo que ele já tinha avisado na concentração do Parador Carmona: "Quando estamos ganhando, todos querem cair pela direita. Quando o jogo é difícil, não aparece ninguém." Mas o mau humor do jogador do Flamengo não se justificaria sequer no começo do jogo, quando Sócrates, Falcão, Cerezo e Leandro diminuiriam tanto "sacrifício" revezando-se pelo setor direito de ataque, como pretendia Telê. Depois do jogo, falava-se da fragilidade do adversário e da duvidosa validade de um teste para o "quadrado mágico" montado pelo treinador. Mas Falcão garantia que nem houve sacrifícios, nem a partida contra a Nova Zelândia foi inútil: "Não vejo por não manter essa mesma forma de atuar contra adversários como a Argentina e Itália. É certo que não será tão simples contar com o apoio contínuo dos laterais, que hoje tiveram liberdade para descer à toda hora, sem se resguardar muito, mas houve mais sintonia do que no jogo contra a Escócia, não ficamos limitados ao trabalho de um ou dois. Às vezes a triangulação partia desde a intermediária e acabava com lançamentos cruzados para a área, tudo pelo lado direito. Então, é verdade que funciona. Resta aproveitar esses dias de folga para treinar mais e manter um ritmo de rodízio rápido e permanente."
Para Sócrates, só o fato de três dos quatro gols do Brasil terem surgido à partir do setor direito já justificaria a utilização da tática e sua manutenção para os dois próximos jogos:
"A estratégia deu certo, melhor do que contra a Escócia, pois o Leandro se apresentou, o Cerezo conseguiu finalizar uma ou duas vezes e os gols aconteceram naturalmente, com lances curtos e trabalhados. Faltou, talvez, mais sorte nas finalizações, porque as chances criadas foram muitas, quase todas da direita".
E até Serginho surgiu em uma ou duas oportunidades na ponta direita, arrastando seus marcadores, trabalhando bem e abrindo espaço para as descidas de Falcão, Cerezo e até Luisinho:
"Acho que o "quadrado" está aprovado. Você não viu que durante o jogo tinha um "quadrado" (pipa) voando sobre o campo? É no céu e na terra, meu chapa. É o "quadrado mágico". Mas, sem brincadeira, a experiência foi melhor do que a primeira. Todos se mexeram e os gols partiram daquele setor. Mudar agora seria negar esse trabalho."

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