ALDO PERDE UM PÊNALTI, VAI PARA CASA E SE MATA


Publicado na Folha de S.Paulo, quarta-feira, 21 de março de 1984

A notícia vem de Lima, no Peru: o jogador Aldo Alfredo Duran, do Deportivo Chao, um clube amador, suicidou-se ontem por ter perdido um pênalti que daria a vitória ao seu time na partida contra o Deportivo Viru, no povoado de Viru, ao norte da capital peruana. O jogador era ponta-direita, tinha 19 anos e bom futebol, o que o levou a ser escolhido pelo capitão da equipe para cobrar o pênalti.
Bateu mal, por cima do travessão. Ficou transtornado e pediu para ser substituído. Foi ao vestiário, trocou-se rapidamente e se dirigiu para casa. Horas depois, matou-se ingerindo veneno contra rato. Deixou uma carta para a namorada, explicando os motivos do suicídio.
Também o futebol profissional do Brasil tem seus perdedores de pênaltis. Que nunca chegaram a tais extremos, é claro. De qualquer forma carregam sempre amargas lembranças. É o caso do ponta-esquerda João Paulo que, jogando pelo Santos, perdeu um pênalti em Goiânia na Taça de Ouro do ano passado, contra o Goiás, e deixou a equipe em um minguado empate de 0 a 0. Antes, tinha desperdiçado dois pênaltis no Maracanã, naquele amistoso entre cariocas e paulistas, no final de 82, um defendido pelo goleiro Gasperin e outro chutado na trave. E ele lembra mais um, perdido na Vila Belmiro, contra o Vasco, pelo Torneio dos Campeões, em 82.
"Não fiquei traumatizado, considero isso coisa do futebol. No ano passado fomos disputar aquele torneio de Montevidéu, houve dois pênaltis - um em cada jogo -, eu cobrei os dois e marquei. Mas nunca mais quero cobrar pênalti", afirma João Paulo. "Fazer gol de pênalti não é mérito, é obrigação. E perder dá muita chateação". Em Pelotas, Rio Grande do Sul, onde está com o Flamengo para jogar hoje contra o Brasil, ele se mostrou estarrecido com a notícia vindo do Peru: "Aquele jogador que se matou devia estar com outros problemas. Só pode ter sido isso, apesar de todos os aborrecimentos que a gente sente ao perder um pênalti".

Careca continua vivo

No São Paulo, a torcida não esquece os dois pênaltis que o centroavante Careca perdeu contra o Grêmio, ambos defendidos pelo goleiro, no mesmo canto, na Taça de Ouro do ano passado. E ele já havia desperdiçado outro, num jogo em Natal, contra o América. "Chutei na trave. Mas decidi que continuaria a cobrar pênaltis. Quando aconteceu aquilo depois, contra o Grêmio, tive vontade de sair correndo do campo ou esconder-me ou compensar com gols", diz o centroavante. Mas não ficou traumatizado, garante: "Por mim, continuarei cobrando normalmente".
Goleiro profissional durante 22 anos, Gilmar dos Santos Neves, ex-Corinthians, Santos e seleção brasileira, lembra com saudade um jogo da seleção em Wembley, Londres, durante uma excursão, em 1956: "Houve um pênalti, eu defendi. Houve outro, a seleção inglesa inteira se afastou da área para não cobrar. Foram buscar lá atrás o quarto zagueiro Bill Wright, que era o capitão do time. Ele bateu, no outro canto como eu previa, e defendi de novo. Eles e o público ficaram perplexos, foi a primeira vez que um goleiro defendeu dois pênaltis no mesmo jogo na história de Wembley. Mais tarde, recebi um convite para participar de um torneio de cobranças de pênaltis que promoveram lá".

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