ELES NÃO SABEM O QUE DIZEM
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Publicado
na Folha da Manhã, domingo, 10 de agosto de 1952
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Neste texto foi mantida a grafia original
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No terreno esportivo em geral e particularmente no terreno futebolistico,
a rivalidade entre paulistas e cariocas sempre foi um fato indiscutivel.
Houve tempos em que não se podia jogar no Rio. Foi durante
os anos em que os paulistas ostentavam indisfarçavel superioridade.
São Januario transformava-se em verdadeiro fortim, onde a violencia
imperava, onde arbitros eram coagidos e jogadores ameaçados
até pela policia, que se tornou famosa pela capacidade que
tinha de arranjar truques que pudessem ajudar os cariocas. Depois,
quando a hegemonia ficou com eles, quando a seleção
guanabarina, e os clubes metropolitanos podiam prescindir de expedientes
escusos, o ambiente ficou um pouco melhor. Os paulistas, dispondo
de melhor formação esportiva, aceitaram como natural
a superioridade dos velhos rivais e tudo ficou mais facil. Teve inicio,
então, a fase bonita das trocas de flamulas e flores, com os
cariocas recebidos aqui de braços abertos e os paulistas geralmente
bem tratados no Rio.
O tempo passou, porem. Nosso futebol recebeu a contribuição
valiosa do interior, graças à instituição
da Lei do Acesso. A renovação de valores se processou
em larga escala e em breve nos colocamos, outra vez, em posição
de superioridade. Tudo isso coincidiu com a construção
do Maracanã. Quando chegamos ao maximo de nossas possibilidades,
passamos a vencer os cariocas no Rio, vezes seguidas, e não
tardou que alguns cronistas de lá, que não compreendem
o mal que estão fazendo, passassem a fomentar discordias. Tudo
serve de pretexto. Vem aqui o Peñarol e ofende os nossos brios,
com cenas revoltantes, atentatorias à moral, e certos jornalistas
nos acusam de maus anfitriões. Vem depois o Flamengo, com Flavio
Costa à frente. Maltrata cronistas, afronta a torcida, e nós
é que somos maus hospedeiros. Agora, por ultimo, veio o Vasco.
Friaça agrediu Dema; Lola procurou, acintosamente, tirar Vila
do jogo, e Ademir, maldosamente, chutou o joelho de Fabio, que terá
de ficar um mês inativo.
Sabem o que aconteceu? Houve, no Rio, quem nos chamasse de violentos,
de maus esportistas, para concluir que o Pacaembu é um antro
de desordeiros, onde não se pode mais jogar. Tais conclusões
raiam pelo absurdo! Enquanto eram eles os maiorais, soubemos manter-nos
numa linha digna, aceitando os reveses sem procurar desculpas que
pudessem desvalorizar os seus triunfos. Agora, que nossa superioridade
é incontestavel, eles não conseguem esconder o despeito.
Estão convencidos de que, pelo fato de sermos os donos da casa,
devemos tolerar seus desmandos, aceitando com indiferença tudo
que eles façam no Pacaembu, mesmo quando Friaça agride
Dema e depois se insurge contra todos, inclusive contra a policia,
para demonstrar que virou valente no Rio. Tudo tem limite. A torcida
é soberana e tem direito de manifestar seu desagrado, e, notem
bem os instigadores: aqui ninguem jogou pedras nos jogadores, como
aconteceu com Olavo no Maracanã. Estavamos dispostos a silenciar,
porque cada um dá o que tem, e porque eles não sabem
o que dizem. Mas já passou da conta. Tudo tem limite.
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