FATORES
DO DESENVOLVIMENTO DA SOCIOLOGIA NOS ÚLTIMOS TEMPOS
Entrevista
concedida pelo prof. Donald Pierson da Escola Livre de Sociologia
e Política de São Paulo
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Publicado
na Folha da Manhã, terça-feira, 28 de agosto
de 1945
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Neste texto foi mantida a grafia original
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A reportagem da "Folha da Manhã" ouviu na Escola
Livre de Sociologia e Política o sr. Donald Pierson, professor
contratado para a cadeira de Sociologia, autor de diversos trabalhos
sôbre a matéria de sua especialidade e que publicou ultimamente
dois interessantes volumes: "Brancos e Pretos na Bahia:"
e "Teoria e Pesquisa em Sociologia".
O nosso entrevistado, que se encontra entre nós desde 1939,
colaborou, na república de Roosevelt, com o prof. Robert Park,
da Universidade de Chicago, no Seminário de Raça e Cultura,
tendo também trabalhado em outros setores da sociologia.
Inquirido sôbre o desenvolvimento dessa ciência e indagado
dos fatôres que para isso contribuíram, declarou-nos
o prof. Donald:
- "Entre os mais importantes motivos de desenvolvimento da Sociologia
durante os últimos anos, temos: uma rápida expansão
das atividades de pesquisa e o estabelecimento de organizações
dedicadas exclusivamente à pesquisa; a preocupação
com métodos e técnicas de investigação;
o desenvolvimento de importantes órgãos para a procura
de fatos, especialmente nos Estados Unidos, como "Fortune",
publicando êste pormenorizadas monografias de pesquisa, de tal
exatidão, que os editores podem manter uma oferta de 10 dólares
a qualquer leitor que descubra um êrro de fato; uma mudança
de atenção por parte dos antropólogos, de análise
de sociedades agora em rápido desaparecimento isoladas, pré-letradas,
para o estudo da aculturação e da "história
natural" e função das instituições
penetrando assim cada vez mais no campo do interesse e da pesquisa
sociológicas; a descoberta feita pelos psiquiatras de que as
neuroses e as psicoses são doenças de personalidade,
que é por sua vez um produto dum meio social criado pela interação
de personalidades; o desenvolvimento nos Estados Unidos e na Europa
de uma Sociologia do Direito, que encara como produtos naturais da
vida do grupo as normas que os tribunais procuram racionalizar, sistematizar
e aplicar a casos específicos e, finalmente, o desenvolvimento
de uma Sociologia do Conhecimento que, particularmente com Karl Mannheim,
promete trazer o próprio conhecimento para o campo da explicação
sociológica."
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A
sociologia não abrange o todo social |
A respeito da confusão entre o "sociológico"
e o "social", o nosso entrevistado assim se expressou:
- "É um êrro identificar o "sociológico"
com o "social", como muita gente o faz. Embora um conhecimento
de tôdas as ciências sociais seja altamente vantajoso
para o sociólogo, a Sociologia não pode ser concebida
como um enorme cêsto, por assim dizer, onde se atira um pouco
de Geografia Humana, de História, de Economia, de Ciência
Política, de Antropologia Física, de Arqueologia, de
Linguística, um pouco de conhecimento de arte de educação
e de "planeamento social", chamando ao todo formado por
essa massa caótica "dados da Sociologia". A Sociologia
não é uma ciência "inclusiva" que abranja
tôdas as outras ciências sociais; é uma ciência
limitada, possuindo seu objeto especial, que "não é
tratado por nenhuma das outras ciências sociais". Considerar
pois o "sociológico" identificado ao "social",
ou de certo modo encarar a Sociologia como a principal ciência,
ou a "mola mestra" da ciência social, como às
vézes é chamada, é tão inexato como confundi-la
com o Pensamento Social, Filosofia Social, Ética Social ou
Serviço Social."
Continuando , especificou o prof. Pierson:
- "A Sociologia, pois, não trata do todo social; trata
apenas do sociológico e deixa à História, à
Ecologia Humana, à Economia, à Ciência Política,
à Psicologia (no que se refere à Fisiologia) e outras
ciências sociais o estudo dos aspectos histórico, ecológico,
econômico, político e psicológico da vida humana;
isto é, a Sociologia deixa às outras ciências
sociais a maior porção do campo social. Trata apenas
daquilo que "é verdade a respeito dos sêres humanos
em virtude de êles viverem em tôda parte, juntos em grupos
em associação uns com os outros e nunca sózinhos".
Em outras palavras, a Sociologia trata dos processo pelos quais os
indivíduos humanos, separados no espaço, capazes de
existirem biologicamente apartados uns dos outros, combinam-se em
unidades maiores capazes de ação conjugada, (isto é,
"sociedades") e dos processos pelos quais estas unidades
maiores, subsequentemente, se desintegram em suas partes isoladas
originárias.
Com a rara exceção dos irmãos Siameses, cada
um de nós está separado no espaço dos seus companheiros.
Segue-se que cada um de nós é capaz de mover-se independentemente
de todos os outros. Mais ainda, cada qual não sómente
possui seu próprio corpo mas também sua própria
mente e, certo sentido, vive sua própria vida, dentro do seu
próprio "mundo mental".
Mas - conclui o prof. Donald Pierson - apesar desta independência,
desta individualidade, desta separação, nós também
agimos "corporativamente", em grupos, fundindo nossas personalidades
em unidades maiores que a constituída exclusivamente por cada
um de nós. Participamos, por exemplo, de famílias, clubes,
igrejas, nações etc., onde "compartilhamos",
em cada caso, "objetivos comuns" e procuramos fins comuns".
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