A verdade, entretanto, é que nossa entrevista
saiu sem que nós ou Monteiro Lobato estivessemos com esta
intenção. Ao visitá-lo, não nos passava
pela cabeça entrevistá-lo. Alem do mais, quasi que
não havia nenhuma originalidade em mais uma entrevista com
Lobato.
Raro é o jornalista brasileiro que vem a Buenos Aires e não
corre logo à casa de Lobato. Que belo assunto para jornal.
O reporter nem tem que fazer força. Lobato
e como ele e sua familia sabem receber bem os brasileiros que passam
por aqui!
vai dizendo, com aquele seu geitão de caipira paulista, frases
que podem constituir cada qual uma manchete. Mas, quando a entrevista
sae lá vem o estrilo.
A culpa, porem, nem sempre é do reporter. Não é
nada facil registrar mentalmente o aluvião de coisas interessantes
que o escritor vai dizendo. Alem do mais, aqueles dois olhos negros,
escondidos debaixo de um par de imponentes sobrancelhas, não
param de se agitar. O pobre do reporter nem sabe o que deve registrar
primeiro
as palavras ou a malicia do olhar, as frases ou aquela gargalhada
nervosa e indecifravel.
E enquanto essa pequena tragedia profissional ocorre, Lobato
sem se dar conta de que o reporter esfrega intimamanete as mãos
de contente
vai distilando a sua amargura, essa amargura que o torna um dos
espiritos mais construtivos do Brasil.
Foi
assim que nasceu esta entrevista. Lobato agitou no ar um dos últimos
recortes que recebera de São Paulo, onde alguem colocara
em sua boca que "o Brasil melhorara porque não estava
mais dominado por politicos ossudos, bojudos e soturnos".
Eu nunca diria esse amontoados de asneiras. Ora, ora, politicos
ossudos e bojudos Você é capaz de me explicar o que
quer dizer isso? Naturalmente me referi a qualquer outra coisa e
o reporter fez a confusão.
Sim, Lobato tinha razão. Mas
que diabo!
ele estava falando com um jornalista. E o instinto profissional
se manifestaria ... Assim, de mansinho, partiu a insinuação:
O metodo americano de entrevista de jornal, é que é
batata. O reporter escreve as perguntas, o entrevistado as devolve
datilografadas e não há geito da confusão se
estabelecer.
É isso mesmo, respondeu Lobato. O que nos falta é
metodo, é sistema. É por falta dessas coisas que a
gente passa tantas vezes por desonesto e burro.
Enquanto Lobato falava, rabiscavamos
como quem não quer nada
um questionario. E o escritor mais lido e difundido na America Latina,
caiu na armadilha como um patinho.
Aliás, para aproveitar a deixa, esta não é
a primeira demonstração de inocencia de Lobato. Apesar
de seu ar feroz e casmurrão, ele é um dos homens mais
puros do Brasil. E daí tantas de suas dores de cabeças.
A gente está habituada a vêlo revolver e espicaçar
a vaidade nacional com uma critica impiedosa e incorruptivel, como
raros são os intelectuais do Brasil com coragem de fazê-lo.
Entretanto, por detrás da cortina de ferro de cepticismo
e descrença de Lobato, encontra-se um homem que ama o Brasil
e que para torna-lo melhor vai dos livros ao fundo da terra, cria
a Jeca Tatu, organiza editoras e funda companhias de petroleo e
ferro, para ver se a coisa toma melhor jeito.
Aqui mesmo, em Buenos Aires o dedo de Lobato se acha por trás
de tudo que signifique melhorar o nome e a posição
do Brasil diante do povo argentino.
Há uma exposição de livros brasileiros. Oficialmente,
é a nossa embaixada a sua organizadora. E não há
dúvida que o jovem e eficiente secretario, Murilo Pessoa,
dedicou-se a ela com o melhor dos seus esforços. Mas, é
ele mesmo quem nos confessa:
Monteiro Lobato foi o primeiro e o que mais nos animou e auxiliou
na realização desse empreendimento.
E, se um dia a correspondencia de Lobato for publicada
aliás, por que é que ninguem não se lembrou
ainda de editá-la?
a gente descobrirá a preocupação de Lobato,
por um Brasil melhor através dos inumeros exemplos, sugestões,
planos, criticas, conselhos, que ele envia incansavelmente daqui
para os seus amigos e companheiros do Brasil.
Mas,
isso já é assunto para outra conversa. Aqui, o que
nos interessa é a entrevista, a primeira que Lobato afirma
ser plenamente autorizada para os jornais do Brasil.
E, lá vai ela, tal e qual Lobato a redigiu, respondendo ao
nosso questionario:
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