MCDONALD'S INAUGURA LOJA EM MOSCOU

Publicado na Folha de S.Paulo, quarta-feira, 31 de janeiro de 1990

A rede de lanchonetes McDonal's abre hoje na praça Pushkin sua primeira loja em Moscou. Ontem à noite, apesar do frio de zero grau, havia aglomerações diante da loja, no centro da capital soviética. Ela será a maior da rede em todo o mundo. Poderá atender 15 mil pessoas/dia. Terá 700 cadeiras em quatro ambientes, decorados com motivos japoneses, europeus, norte-americanos e sul-americanos. A fachada traz o conhecido logotipo da rede com uma bandeirinha da URSS. Há 14 anos o McDonald's tenta entrar no mercado soviético.

McDonald's promove revolução

De Moscou

A abertura da McDonald's em Moscou tem um impacto na sociedade soviética muito maior do que se poderia imaginar. Mexe com todos os setores da vida soviética, incluindo costumes e concepções de como vivem e fazem negócios os estrangeiros.
Em primeiro lugar, nunca existiu fast-food neste país, exceto por experimentos muito limitados, como um famoso caminhão que vendia pizzas. Fracassou. Restaurantes soviéticos só atendem com reservas feitas com várias horas de antecedência e cada refeição exige pelo menos duas horas para ser servida e consumida. Uma rede de fast-food introduz uma possibilidade de mudança do ritmo de vida.
A McDonald's promete ser um novo local de aglutinação de jovens, especialmente porque está situada num local nobre de Moscou, a praça Pushkin, que já foi ponto dos dissidentes. Além da praça, só o calçadão Arbat funciona como um esposo público para este tipo de aglutinação social.
Terceiro, o "modus operandi" da McDonald's abre novas perspectivas para a perestroika. Os empregados são soviéticos, toda a estrutura de trabalho foi montada aqui, os rublos obtidos com as vendas pagarão a matéria-prima e os salários em rublos dos funcionários, permitindo a expansão do capital. Em outros termos, oferece uma saída para o dilema da inconvertibilidade do rublo.
Por fim, a McDonald's promete que todos serão atendidos com cortesia. Como em Moscou é "normal" ser atendido por burocratas mal humorados, um serviço cortês pode mostrar que é possível trabalhar sem empurrões, atropelos e caras feias. Só isso já vai trazer novos ventos para a perestroika. (JA)

A perestroika dá a primeira mordida no seu "Big Mac"

JOSÉ ARBEX
De Moscou

A subsidiária canadense da rede de lanchonetes McDonald's abre hoje sua primeira loja em Moscou, depois de 14 anos de projetos e tentativas frustradas. As expectativas dos moscovitas são enormes e se traduziam até ontem à noite, apesar do frio de zero grau, em grandes aglomerações diante da loja ainda fechada, situada na praça Pushkin, em pleno coração de Moscou. Espera-se que hoje as filas cubram os escassos 400 metros da rua Gorki que separam o local da Praça Vermelha. A perestroika, finalmente, encontrou o "Big Mac".
A McDonald's-Moscou será a maior do mundo, terá capacidade para atender 15 mil pessoas diariamente, das 9h às 22h, com 27 caixas funcionando sem interrupção.
Normalmente, o atendimento médio diário de cada uma das lojas da rede (11 mil, espalhadas por 51 países) é de 1.800 pessoas. A sala terá 700 cadeiras divididas em 4 ambientes, decorados com motivos japoneses, europeus, norte-americanos e sul-americanos.
O mais importante é que as refeições serão cobradas em moeda soviética, rublos. Ainda que uma refeição média seja cara para os padrões soviéticos (algo em torno de 4 rublos, quando o salário mensal é de 230 rublos), só o fato de a população local ter acesso aos produtos já representa uma inovação de grande impacto. Os investimentos e os lucros serão igualmente compartilhados por uma "joint-venture" com a empresa soviética "Mosrestau-ranservice"
Fazendo uma pequena provocação com outras empresas ocidentais que só vendem seus produtos por dólares, a McDonald's afixou à porta de sua loja um cartaz avisando: "Só vendemos em rublos". E adverte que os estrangeiros terão que ficar na fila, junto com todos os outros. Isso é também uma óbvia estratégia de marketing para captar as simpatias dos soviéticos, que têm razões de sobra para se ressentirem dos "privilégios" comprados por dólares a eles inacessíveis.
Este esquema só foi possível porque a McDonald's montou no próprio país, pagando em rublos, toda a linha de produção de hambúrgueres, batatas, pepinos e laticínios. Durante dois anos, técnicos canadenses ensinaram seus métodos para a criação e controle de qualidade aos trabalhadores de fazendas coletivas (Kolhozes e Sovkhozes) próximas a Moscou. Os produtos são processados num subúrbio da capital, com capacidade horária para 10 mil hambúrgueres, 3 mil litros de derivados de leite e 14 mil pães.
Caso a experiência moscovita dê certo, a McDonald's vai abrir 20 outras lojas em Moscou e em outras capitais, com um investimento inicial de US$ 50 milhões, o que é pouco, considerando o porte dos negócios e da empresa. Por enquanto, a empresa emprega 630 jovens, com salário médio de 230 rublos. Cerca de 27 mil jovens se candidataram ao emprego - o equivalente a 42 postulantes por vaga -, imediatamente após a publicação de um anúncio nos principais jornais soviéticos. Depois da seleção, foram todos treinados segundo os métodos da rede McDonald's.


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