INFLAÇÃO AINDA NÃO FOI VENCIDA
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Publicado
na Folha de S.Paulo, terça-feira, 17 de maio de 1966
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Neste texto foi mantida a grafia original
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O sr. Roberto Campos fez ontem duas declarações importantes
em Curitiba.
A primeira foi esta: "O governo espera ainda este ano avizinhar-se
da estabilidade dos preços, mas é possivel que o novo
governo tenha de prosseguir na luta antiinflacionaria". Disse
tambem que "já escapamos da inflação com
estagnação, pois ainda temos inflação,
mas com desenvolvimento". E lembrou que "o combate à
inflação não é o objetivo único
deste governo".
A segunda foi esta: o deficit nacional habitações é
mais de 7 milhões de moradias. A demanda anual é de
350 mil novas casas. Anunciou tambem que seu Ministerio já
tem pronto o "Estatuto do Planejamento Integrado Municipal"
para orientar a prefeitura do interior.
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Campos:
país precisa de 7 milhões de casas |
CURITIBA, 16 (FOLHA) - O ministro Roberto Campos encerrou o I Encontro
Nacional dos Arquitetos, hoje à noite, nesta capital, como
um discurso em que afirmou ser superior a 7 milhões de casas
o deficit nacional de habitação. Anunciou novas medidas
a serem adotadas pelo governo para atenuar a demanda de residencias,
que é de 350 mil por ano, e disse que já está
pronto o "Estatuto do Planejamento Integrado Municipal",
que modificará, entre outros dispositivos, a atual legislação
sobre o loteamento de areas urbanas.
É o seguinte, na integra, o discurso do ministro do Planejamento
em Curitiba:
«Arquitetos. Este é um encontro que já há
algum tempo se tornava necessario. Considero-o oportuno para mim e
para os senhores.
O governo federal vem sentindo que é chegado o momento de se
abrir uma nova frente de desenvolvimento pela participação
mais ativa, neste processo, das celulas basicas dos nosso sistema,
representadas pelos municipios, grupos de municipios, areas urbanas
e metropolitanas do país. Até este momento, concentraram-se
os esforços do governo, como é sabido por todos, em
resolver aqueles problemas maiores, sem cuja solução
nada seria possivel realizar. O combate à inflação,
o equilibrio do balanço de pagamentos, a recuperação
do nosso credito financeiro internacional, a disciplina orçamentaria,
a reforma bancaria e monetaria, a reforma do mercado de capitais,
são algumas dessas medidas no campo financeiro. A estas se
acrescentam os instrumentos de ação do governo como
a reforma tributaria, a reforma agraria e a reforma habitacional.
Com relação à ultima, começam nossos pontos
de identificação mais estreitos. Já aqui, acredito
na necessidade da participação direta dos arquitetos
brasileiros. Diriam alguns, até o momento, pouco tem acontecimento.
Essa idéia não é entretanto exata. Para a montagem
de um plano habitacional nacional, como aliás em nossos outros
planos nacionais, era necessario começar praticamente do nada.»
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Deficit
e Programa |
«A montagem de um sistema financeiro habitacional visa à
realização efetiva de um programa de construções,
que viesse minimizar o deficit habitacional, que como sabem é
estimado em mais de 7 milhões de casas, acrescida ainda de
uma demanda anual de 350 mil novas residencias, sendo 200 mil em cidades
de mais de 10 mil habitantes. Não é tarefa simples e
muito menos rapida. As medidas legais e administrativas já
foram tomadas e completadas, e começa agora a sua implementação
efetiva.
Já para este ano as perspectivas de aplicação
no sistema financeiro da habitação são estimadas
em 200 bilhões de cruzeiros, isto é, 10 vezes mais do
que foi aplicado em 1965, havendo ainda possibilidade de ampliação,
através de outros emprestimos em base de negociação
pelo Banco Nacional de Habitação, que é o agente
do governo nessa operação de teor altamente social mas
com definido impacto sobre a economia do país.
Esses fatos são uma parte de operação global
que estamos promovendo. Sabemos que um sistema nacional de habitação
não pode ser operado isoladamente. Ele está inserido
dentro de uma problematica maior de problemas de urbanização,
problemas de infra-estrutura, problemas de desenvolvimento urbano
e problemas regionais.
Assim em fevereiro deste ano encaminhei formalmente ao Banco Interamericano
de Desenvolvimento uma consulta sobre a viabilidade de ajuda tecnica
ao governo brasileiro. Esta ajuda tecnica seria sob a forma de um
financiamento de 516 mil dolares para a realização de
um "Estudo Sobre o Desenvolvimento Urbano no Brasil", estudo
esse basico para formulação de uma politica nacional
que oriente a ação do governo no setor. Essa politica
tem como objetivo proporcionar ao governo federal os elementos necessarios
para orientar as inversões publicas e privadas de infra-estrutura
economica e social, de modo a permitir o aumento de capacidade geradora
de economias externas e de absorção e integração
da populações dos principais centros urbanos e rurais
do país. Com a finalidade de orientar os trabalhos, foi proposta
uma relação esquematica dos estudos necessarios, que
incluem uma analise das teorias existentes nas ciencias sociais a
fim de fixar-se uma imagem da estrutura urbana futura do Brasil e
das funções que deverá cumprir essa estrutura
em relação ao desenvolvimento economico e a mudanças
sociais assim como uma investigação das possibilidades
tecnologicas para oferecer soluções mais adequadas a
problemas de importancia, como o da habitação e dos
serviços de infra-estrutura.
Sabemos que atualmente quase 50% da população brasileira
vive em areas urbanas. Sabemos tambem que a taxa de incremento das
populações urbanas tem sido em media 3 vezes superior
a das populações rurais. Estamos conscientes de que
até 1975, aproximadamente 20 milhões de brasileiros
ingressarão nas areas urbanas do país. Estamos assim
em franco processo de "Explosão Urbana". Isto, evidentemente,
nos preocupa e requer cuidadoso planejamento da infra-estrutura urbana,
até hoje deixada a um crescimento expontaneo e vegetativo.
A Lei de Assistencia Financeira aos Estados e Municipios, o Fundo
Nacional de Financiamento para o Abastecimento de Agua, o Fundo para
Investimento Sociais são instrumentos já em operação
visando atender a problemas das micro-economias e comunidades sociais.
Quando foi criado em julho de 1965 o Setor de Planejamento Regional
e Municipal do Ministerio do Planejamento, admitiamos que essa area
deveria ser coberta em função da estrategia geral e
desenvolvimento economico posta em pratica através do PAEG
1964/66. Este setor foi entregue a direção de um arquiteto.
Acreditamos que pela formação profissional e mesmo pela
tradição de trabalhos, debates e discussão, o
arquiteto apreende mais facilmente a problematica economico-social,
quando se trata de planejamento das comunidades urbanas. Em conjunto
com os outros tecnicos e profissionais, através das equipes
de planejamento integrado, muito se poderá realizar neste setor.
Verificando as dificuldades em que se encontram os municipios brasileiros
em participar do esforço nacional do desenvolvimentos instrui
o FINPE no sentido de aplicar parte dos seus recursos no financiamento
de Planos Integrados Municipais, ainda que, numa primeira fase a titulo
experimental. Não seria compreensivel admitir que se planejasse
o desenvolvimento nacional e regional, como vem sendo feito na região
do SPVEA, na SUDENE, sem que houvesse uma correspondencia de atitude
ao nivel local. Admito contudo que quando falo em planejamento integrado,
seja visualizada a idéia não de planos utopicos, planos
formais ou puramente esteticos, mas sim de ferramentas praticas e
objetivas na orientação das lideranças politico-administrativas
locais. Isto poderá acelerar o processo de desenvolvimento
social produzindo um aumento da renda per capita e maior realismo
nas despesas de investimentos de capitais municipios visando a rentabilidade
dos recursos publicos e privados e abrindo novos espaços economicos.
Estou informado que as tecnicas de planejamento integrado e de desenvolvimento
estão sendo objeto de discussão e em certos casos já
se encontram em fase de execução em varias regiões
do municipio do país.
Tenho recebido inumeros pedidos de governadores e prefeitos, no sentido
de orientar e auxiliar trabalhos e programas de planejamento local.
De diferentes partes do país chegam solicitações
de financiamento para programas e planos de desenvolvimento municipal,
como, por exemplo, Feira de Santana, Natal, Santos, e tambem esta
capital, que já enviaram as suas consultas, com a finalidade
de verificarem a viabilidade de financiamento através do FINEP.
Acredito que isto demonstre o interesse legitimo de fugir da atitude
passiva e indiferente que caracterizava esse setor da vida brasileira.
A atenção para as novas formas dos aglomerados humanos
já vem se fazendo sentir tambem entre nós. As grandes
areas metropolitanas de Recife, Belo Horizonte, Rio, São Paulo,
apresentam sintomas que estão a exigir uma "Revisão
de Perspectiva". "Revisão de Perspectiva" que
devemos e fomos conduzidos a excluir em nosso vernaculo, e que deve
condicionar na nossa forma de raciocinar sobre as fisicas de "Metropole",
e já a esta altura de Megalopolis, que começam a se
decidir na região Rio, São Paulo e Belo Horizonte. As
"conurbações" tambem já vem se formando
pelo alastramento das cidades. O esforço pioneiro que vem sendo
feito nesta cidade de Curitiba, que ora nos hospeda, no sentido de
institucionalizar, de forma permanente e dinamica, o Planejamento
Integrado Local é mais uma vez sintoma dessa situação.
Espero que nesta reunião boas informações tenham
sido trocadas e aproveitadas. Vejo tambem com interesse o movimento
que se delineia não apenas no centro-sul, mas em todo o país
no sentido de planejar, em todas as escalas, evitando-se assim os
desperdícios, que repugnam. Não é mais possivel
despender enormes recursos provenientes de tributação
e de poupança popular em aparatosos sistemas de iluminação
publica ou viadutos ou outras de menos utilidades em cidades que não
possuem um simples sistemas de abastecimento de agua ou mesmo equipamentos
escolares para a formação primaria.
É necessario encerrar a etapa de construções
monumentais em favor do equipamento urbano e social, da oferta e oportunidades
de empregos, da racionalização da administração
publica tendo como consequencia uma menor peso fiscal sobre o contribuinte.
Estamos em nossa revolução industrial.
Sabemos que temos ainda pela frente a "Revolução
da Automação" e como consequencia desta a "Revolução
Intelectual" que já se vem processando nos países
desenvolvidos.
Não podemos saltar etapas, mas podemos acelerar o processo
se todos contribuirem com seu esforço. Espero que o objeto
e as conclusões destes encontros profissionais venham contribuir
para esta revolução intelectual. que nos afastará
do espectro do sub desenvolvimento.
Da analise da situação feita, seria oportuno falar sobre
providencias legais em andamento».
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Planejamento |
«Temos
pronta e a serem encaminhadas à sua excelencia da Republica
o «Estatuto do Planejamento Integrado Municipal». Trata-se
de um diploma que terá profunda repercussão urbana e
local. Partindo de sugestões para reformulação
do decreto-lei n. 58-1937, chegamos à conclusão de que
se impunha uma reformulação total do assunto ferindo-se
o cerne do problema isto é a falta de uma orientação
efetiva por parte do governo federal, nos assuntos do planejamento
fisico e global municipal.
Falar em planejamento fisico, sem examinar as implicações
economicas e sociais seria tambem investigar. A solução
deve provir de um mecanismo de planejamento integrado.
Tendo em vista as dificuldades naturais do país e a pressão
do tempo que não permite e nem permitira programas com um alto
nivel de sofisticação de soluções, imaginou-se
proceder pelos mecanismos e aproximações sucessivas,
e assim contar de forma exequivel o «Sistema Nacional de Planejamento
Integrado aos Niveis Regional e Municipal».
Preve o projeto em seu texto normas tecnicas para loteamento, disposições
administrativas sobre contratos de transferencias, e acima de tudo,
disposições orientadoras na conduta dos municipios para
a realização de Planos Diretores Integrados. Preve tambem
o projeto os poderes e instrumentos necessarios ao planejamento regional
e local, sem os quais seria impossivel o desenvolvimento racional
das comunidades urbanas.
O projeto atribui ao Ministerio do Planejamento os encargos de expedirem
instruções de diretrizes tecnicas para a orientação
e execução da lei, e tambem a de fiscalizar e controlar
sua aplicação, diretamente ou através de orgãos
governamentais, sem o que nada seria possivel realizar.
Condiciona-se ainda o auxilio pedido, por via de subvenções,
emprestimos e financiamentos, a existencia de Planos ou «Diretrizes
de Desenvolvimentos» aprovadas por lei local, mantendo-se assim
a autonomia municipal e de acordo com os requisitos minimos previstos
na lei.
Assunto de maior importancia é a instituição
da «Concessão de Uso da Terra», figura juridica
nova, de direito publico e privado, para fins de urbanização,
industrialização e cultivo da terra.
A criação deste instrumento legal viria facilitar tremendamente
o trabalho dos planejadores do país.
Outro projeto que tambem concorrerá para uma maior racionalização
das urdiduras urbanas é a criação de Areas Metropolitanas.
Vejam assim que a nova frente de desenvolvimento que estamos programando
pressupõe uma participação ativa e efetiva em
grande escala, dos profissionais ligados ao planejamento tais como
os arquitetos, economistas, sociologos, geografos, administradores
e juristas.
Mas é necessario que um grande esforço seja feito por
parte de todos os tecnicos, a fim de se familiarizarem com os instrumentos
à nossa disposição.
Tecnicos de programação, economica espacial, gerencia,
administração, utilização e computação
eletronicas e pesquisas operacionais, adaptadas à nossa fragilidade
e informações, terão que ser utilizadas, experimentadas
e mesmo criadas.
Não será suficiente a colaboração do «know-how»
externo sem que se faça um esforço interno correspondente».
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