A economia é a base do bem estar, dizem, e a mulher compreendendo
tal, faz um culto de tão formosa virtude. E é por
isso que a vemos percorrer quantas lojas e mercadorias existem por
ahi, para adquirir, a baixo preço, aquillo que pretende comprar.
Os pobres vendedores, quando attendem a uma clientela que se diz
admiradora da "Economia Domestica", tremem e suspiram
ante a perspectiva de um trabalho improprio sem beneficio de especie
alguma...
Entra a gentil compradora. Seu sorriso amavel, sua voz meiguissima,
seu porto airoso encantam o caixeiro.
- O senhor tem "crêpe de chime, bols de rose"?
- Sim, senhora.
- Pôde mostrar-m'o?
- Pois, não.
O vendedor esboça um sorriso que - ai, delle? - lhe ha de
custar muito caro. A compradora, vendo a gentileza do empregado,
faz descer das prateleiras, peças e mais peças do
artigo. E ... Esta côr serviria se não fosse tão
viva... Esta... não seria má se não custasse
tão cara!... Aquela poderia servir se não fosse tão
transparente...
- Não tenho outros, minha senhora, diz o vendedor com a fronte
alagada de suor.
- Procure, sim? Faça o favor... Talvez haja alguma escondida...
Recomeça a procura. O pobreza suspira, respira, enxuga a
testa.
- Se esta fazenda não fosse tão cara...
- Agrada-lhe esse genero? Quanto a senhora offerece? pergunta o
pobre caixeiro quasi a cahir de cansaço. A moça dá
um preço e elle, sem dizer palavra, desdobra a peça.
- Quantos metros?
- Trinta e cinco centimetros que, bem medidos, darão quarenta.
O desventurado caixeiro ensaia um projecto livido de sorriso para
que a compradora não perceba o projecto assassino que lhe
brilha nos olhos. Dispõe-se a cortar.
- Oh! exclama ella, com um beicinho. Não seja tão
mau! Côrte um pouco mais...
Resumindo: o empregado perdeu 55 minutos e a compradora leva quarenta
centimetros de fazenda... pela metade do valor!...
***
Ha necessidade de fazer-se um presente? O marido encarrega a esposa,
ou o irmão encarrega a irmãs de fazer a compra, certo
de que ella saberá adquirir o objeto por preço muito
mais baixo.
Com effeito. A mulher percorre todas as lojas, todos os bazares,
inquirindo preços, pedindo amostras, implorando abatimentos,
fazendo offertas. Terminada a "via sacra", quando já
não existe casa por visitar, faz um balanço, compara
preços e qualidades, e, finalmente se decide... depois de
haver semeado o desespero na alma de um centena de caixeiros!
***
Alguma casa importante annuncia uma liquidação? A
agglomeração de mulheres é enorme. As donas
de casa, ou as que o pretendem ser, correm á casa em liquidação,
remexendo tudo o que encontram ao alcance das mãos e, por
fim, sáem satisfeitissimas da compra feita depois de haver
olhado e reolhando o cartão que, junto á mercadoria,
ostenta estes dizeres: ANTES 80$ - AGORA 79$900.
Ao entrar em casa nota que perdeu uma luva de pelica, e que na agglomeração,
lhe quebraram o cabo do guarda-sol. Mas, não importa! Conseguiu
comprar um artigo barato... Está compensada dos apertos,
dos pisões nos callos, das cotovelladas, da luva perdida,
da sombrinha quebrada, do vestido rasgado...
Nada disso tem importancia. O importante é que ella conseguiu
fazer economia de $100...
**
Este admiravel espirito de economia têm-no todas as mulheres,
pobres e ricas, modestas e vaidosas, tolas e intelligentes... mas
só quando são ellas que vão pagar as compras.
A companhia de um homem faz desapparecer nellas, immediatamente,
esse afan de economizar um nickel.
Senão vejam: Um noivo offerece à sua noiva um presente.
Que ha de ser?
- Compra-me um vestido, lembra ella.
Vão à loja. E ella, que ali estivera, no dia anterior,
discutindo com o caixeiro por causa de 300 réis a mais em
certo artigo, escolhe, a seu gosto, o vestido que mais lhe agrada.
- Quando custa?
- Trezentos mil réis, diz o caixeiro.
- Não lhe parece um pouco caro, querida? Arrisca o noivo
timidamente.
- Parece. Mas veja a qualidade da seda... olhe como ficam bem estes
"godfets"... E que combinação linda fazem
com este "jabot"...
O rapaz - coitado - que não entende nada, paga sem dizer
nenhuma palavra mais.
***
Dois noivos vão fazer um passeio. O cinema, o theatro, ou
lá o que seja, fica cinco quadras adiante.
- Vamos andando? pergunta elle.
- Ah! com muito prazer eu iria a pé. Mas estou tão
cansado... Os sapatos me apertam tanto... Vamos tomar um auto. Olha,
esse que vae passando.
O rapaz não tem outro remedio senão tomar o taxi.
Devido ao trafego, o auto embica por outra rua, dá uma porção
de voltas e, finalmente, param á porta do cinema.
- Não! Ahi não! diz ella. A concorrrencia ahi não
é das melhores! Ha muitos bolinas... E que fitas ordinarias!
Vamos a um outro! Ao Rosario! É verdade que ahi a entrada
é mais cara um pouco...
- Isso não faz mal... exclama o noivo calculando o dinheiro
que tem no bolso.
Vão ao cinema. Á sahida vão a uma sorveteria,
com orchestra...
Emfim, ao se despedirem o coitado nota que gastou 50 mil réis
- dois dias de trabalho!
***
Estas coisas, porém, só se dão durante os flirts
e noivados. Mas desde que a mulher se casa, recupéra, como
por encanto, seu espirito de... economia.
- Quanto você pagou por esta duzia de lenços? pergunta
ella ao marido.
- 15 mil réis.
- A mais de mil e duzentos cada um?! Você está louco!
Porque não me deu o dinheiro que eu iria compral-os! Garanto
que eu comprava isso por 6 mil réis!
E comprava mesmo!
SAÉM JUNTOS.
- Vamos tomar um taxi? Pergunta o marido.
- Sempre essa mania de esbanjar! Parece que o dinheiro faz cocegas
no seu bolso! Vamos tomar um bonde!
- E... vamos ao theatro!
- Qual theatro! Vamos a um cinema! Quanto tivermos de ir ao theatro
pedirei a papae que nos arranje um camarote com o empresario.
Entram numa confeitaria. E, modestamente, pédem dois refrescos.
Entra um homem acompanhado de uma mulher e duas crianças.
- Olha! Os Silveiras!
Saudações. Risadinhas. Beijócas. O garçon
approxima-se. Os recem-vindos pédem chocolate com torradas
e leite para as crianças. Após meia hora de palestra,
chega o momento de pagar a despesa.
- Não! diz um. Quem paga sou eu.
- Não! Faça o favor.
- Não, senhor!
- Eu faço questão de...
Cada uma das mulheres procura sugestionar o marido, por transmissão
de pensamento, para que elle demore em tirar o dinheiro do bolso.
Chega o garçon.
- Pague-se!
- Não! aqui!
O rapaz sorri e recebe o dinheiro do que lhe ficou mais perto. Despedem-se.
O casal fica só. E a mulher, com o olhar fuzilando:
- Porque você não demorou mais pra tirar o dinheiro?!
- Mas, querida...
- Basta! Não me irrite mais!
O marido resmunga, de mau humor, jurando que é essa a ultima
vez que sáe com a mulher...
|