MENOR PAULISTANO: LAZER UTIL É SOLUÇÃO
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Publicado
na Folha de S.Paulo, quarta-feira, 28 de maio de 1969
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Neste texto foi mantida a grafia original
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Recreação
deve vir da escola |
O que fazer para resolver o problema infanto-juvenil em São
Paulo?
A desocupação e a ociosidade de dezenas de milhares
de crianças e adolescentes - situação caracteristica
de São Paulo - são um permanente convite para uma atividade
menos util, quando não nociva.
Já houve quem definisse - não sem uma dose de razão
- os movimentos juvenis surgidos ultimamente no mundo inteiro, como
um «movimento dos ociosos». Algumas pessoas, ao mesmo
tempo em que reconhecem a legitimidade das aspirações
juvenis e compreendem seu carater agressivo, negam a seus portadores
a autoridade necessaria para o questionamento que fazem da vida social.
Segundo essa corrente de opinião, os membros desses movimentos
são rapazes e moças a quem não se transmitiu
o sentido do dever, do trabalho proprio para garantir a sobrevivencia
e da autodisciplina na vida. Não conhecem, tais jovens, esses
sentimentos e perderam - se algum dia tiveram - todo o elã,
interesse e curiosidade tipicamente juvenis, sendo inferiores às
instituições que renegam e questionam, mais por incapacidade
e inercia que por uma verdadeira superação intelectual
e moral das mesmas. Uma geração ociosa, em suma, segundo
essa corrente.
Mas presente, num permanente desafio a tudo e a todos.
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Ocupá-la eis uma solução.
Mas ocupá-la com quê?
Os projetos individuais de seus pais - realizados ou frustados, não
importa muito o resultado - não conseguem entusiasmá-la
e ao contrario, são razão de seu enjoamento.
É preciso chamá-la a uma realização que
transcenda os limites do projeto individual e pessoal - a nova geração
compreende que não existe mais isoladamente, percebe o quanto
seu destino e seu futuro se vincularam às demais pessoas.
Um projeto coletivo que envolva os proprios destinos da Nação
parece cada vez mais o unico capaz de envolvê-la. Aí
estão os resultados da «Operação Rondon»
a demonstrá-lo, como amostra do muito a ser feito nessa direção.
E existe algo melhor pessoal e coletivamente que a construção
de um grande país, de uma nação forte, poderosa
e independente? Não estaria tambem aí o caminho para
se alcançar o equilibrio necessario entre a moderna liberdade
individual e os interesses nacionais?
Ao mesmo tempo, não existe outra alternativa capaz - tanto
quanto essa - de desencadear o potencial de ação, imaginação
e inteligencia dos jovens, por natureza altruistas e dispostos a se
sacrificar em beneficio de causas coletivas. E tambem não há
melhor remedio contra o autocompadecimento, tão comum nos jovens
de hoje, que buscam - quando podem - a enganosa cura dos divâs
de psicanalistas.
Se não se entusiasmam os nossos jovens com o trabalho à
base de tecnicas atrasadas, mais semelhantes a suplicios, se comparadas
com o que aprenderam nos livros da Universidade ou nos modernos filmes
de ficção cientifica, é possivel demonstrar-lhes
a extraordinaria aventura que será a construção
de um país grande e forte. É preciso propor-lhes o fascinante
desafio de apagar do Brasil algumas de suas chagas, de forma que estas
se tornem para eles lembrança do passado, quando homens maduros.
É possivel e é necessario demonstrar-lhes que nosso
subdesenvolvimento, sendo uma fraqueza, pode tambem se transformar
em força se formos inteligentes o suficiente para acharmos
caminhos proprios, sem os compromissos, impasses e dilacerações
de países mais evoluidos.
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O instrumental
para esse objetivo de integração juvenil nos destinos
nacionais, deve ser acionado desde a infancia e um sistema integrado
de lazer e recreação, tendo a escola como seu ponto
fulcral e centralizador, talvez seja a forma melhor.
É da escola que deve partir a iniciativa da diversão
infanto-juvenil, de maneira a que esta perca seu carater gratuito
e ocasional de hoje, ganhando a noção de formação
da cidadania e criterios cientificos de uso do corpo e da mente.
Que uma partida de futebol não tenha apenas o carater de uma
disputa em que vencerá fatalmente o mais forte, mas que seja
um esforço de inteligencia permanente para saber como vencer
o adversario pela habilidade e não pela força. É
preciso aprender, definitivamente a lição de Ulisses
em sua luta contra Polifemo.
E essas noções só a escola pode dar. E poderá
dar, se souber integrar em seu programa a tarefa de promover o lazer
e a recreação dos seus alunos, como algo intrinsecamente
ligado a seus designios, como um importante aspecto de formação
do cidadão.
É evidente que o equipamento é escasso e sobre a necessidade
de se construirem mais unidades não pesa a menor duvida. Mas
uma tentativa de aproveitamento do que já temos, poderia surpreender
a todos, evidenciando a existencia de muitos serviços, atualmente
ociosos, parcial ou totalmente .
E num país em vias de desenvolvimento, que não se pode
dar ao luxo de atingir desde logo os padrões otimos internacionais
- que são, afinal os dos paises ricos - é interessante
perguntar se o que caracteriza um bom tecnico é o relacionamento
quantitativo do que falta fazer para atingir o otimo, conhecendo-se
de antemão a inexistencia dos recursos para tanto e se um bom
administrador é aquele que tambem, quantitativamente, luta
para atingir tais objetivos, empenhando recursos sem recorrer ao esforço
e à imaginação na busca de alternativas menos
caras e demoradas.
Enfim, é preciso se um bom tecnico, como um bom administrador
são esses ou aqueles capazes de criar, dentro da escassez.
Essa capacidade de criação dos administradores tem muita
relação com o acrescimo da area e das atividades de
lazer e recreação infanto-juvenis de São Paulo.
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O problema do adolescente - e mesmo da criança - que trabalham
poderia promover uma rediscussão do atual criterio educacional,
o qual recomenda não se forme um profissional antes dos quinze
anos de idade - quando, em teoria, terminaram os 8 anos de educação
fundamental comum.
A esse criterio tecnico, sobrepõe-se uma verdade social: são
milhares, em São Paulo, as crianças e os adolescentes
inteiramente desocupados e à mercê do acaso, estando
uma faixa cada dia maior nos limites da delinquencia. E a atual escola
não os contem, não apenas por seu pequeno numero de
unidades, mas principalmente por suas funções estarem
limitadas institucionalmente ao ensino didatico.
Outra verdade, não menos, dramatica, se junta a essa: a mão
de obra adolescente é hoje fundamental em alguns setores da
atividade economica, particularmente nos serviços. São
menores de idade que respondem pelo funcionamento de um sem numero
de bares, escritorios, lojas.
E na industria, sua presença é visivel - compareceram
com 5% dos acidentados no trabalho no ultimo semestre de 1968.
O jovem que trabalha compõe um outro tipo do chamado "poder
jovem", ainda desconhecido.
A especialização profissional dessa camada deve ou não
ser um objetivo do governo?
E não entendia como a passagem - longa e cara para a familia
média brasileira como para a economia do país - pelos
bancos universitarios, mas como uma formação pratica
e funcional. Operacional, antes que tudo.
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Independentemente da discussão educacional uma verdade é
patente: a Prefeitura de São Paulo participa hoje com apenas
13% do total da rede do ensino primario. E possui provavelmente a
rede escolar mais deficiente em relação às escolas
particulares e estaduais, estando com 27% de repetentes e 18% evasão
escolar (dados de 1963).
De outra parte, e ainda de acordo com dados de 1963, do ensino medio,
apenas 9,6% dos alunos chegam ao ensino superior.
Como resolver este problema?
Não seria mais conveniente adotar-se uma solução
em que a Prefeitura entregasse ao Estado sua rede escolar primaria
e seguisse decididamente o caminho do ensino tecnico, assistindo à
população de 11 anos em diante, a qual - apesar dos
criterios tecnicos educacionais indicarem o contrario - já
está trabalhando?
Não se trataria de introduzir grandes novidades nesse campo
e sim de enfatizar e aprofundar os atuais convenios já feitos
pela municipalidade com o SENAI e com Ministério da Educação,
dos quais proximamente resultarão 5 escolas para 10 mil alunos,
que aprenderão uma profissão.
E de outra parte, ampliar, atendendo ao adolescente, os cursos de
adestramento rápido da mão de obra, que já vem
sendo feitos pela Secretaria do Bem Estar Social da Prefeitura.
A passagem do ensino primário municipal para o Estado traria
seguramente uma economia em dinheiro, pois hoje há duas secretarias
de educação atuando no municipio, realizando o mesmo
trabalho, duplicando, rotinas, repetindo esforços. O falecido
Prefeito Prestes Maia parecia ter compreendido essa situação
quando, em 1963, não só iniciou a entrega de algumas
escolas municipais ao Estado, como paralisou o investimento nesse
setor.
Um novo quadro educacional nessas direções, sobre estar
mais próximo da realidade social do municipio, também
poderia interessar a muitos pais que hoje não insistem na escola
para seus filhos ou porque eles se chegarem ao ginásio não
chegarão à universidade ou porque sequer ao ginasio
terão acesso.
E dezenas de milhares de adolescentes estariam ocupados de maneira
util.
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As
opções do jovem: da solução heroica à
solução pratica |
O saguão de entrada do Othon Hotel é imponente. Os tapetes
macios amortecem o ruido dos passos. Uma voz educada pergunta:
- "Em que posso servi-lo?"
- "Em que quarto está hospedado Mr. Stephan?"
- "308, elevador à direita".
Se a pergunta fosse feita em ingles, Pedro, o recepcionista, também
responderia com a mesma gentileza. Em frances ele também atenderia
o visitante.
É que Pedro, apesar de seus 18 anos, tem bastante experiencia
sobre o funcionamento de um hotel de primeira categoria. Ele fez o
curso de Hotelaria mantido pelo SENAC, Serviço Nacional de
Aprendizagem Comercial.
Há dois anos Pedro era um garoto bom de bola, que tinha terminado
o curso primario e não sabia muito bem o que fazer na vida.
Ser um novo Pelé era uma possibilidade muito remota. Como ele
havia muitos outros garotos da Vila Manchester que eram bons de bola.
Mas daí até ganhar a vida com os chutes e os dribles,
a distancia era grande. E dificil de ser percorrida. Desistiu logo
de ser um profissional do futebol. Surgia então a questão:
que profissão exercer?
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Por
que não recepcionista? |
Através de um amigo que estava fazendo o curso de hotelaria
do SENAC, Pedro ficou sabendo que havia uma possibilidade para adquirir
um treinamento profissional em um ano, e depois tentar ganhar a vida
com mais chances.
A Escola de Hotelaria João Nunes Junior funcionava ainda na
rua 24 de Maio Pedro foi até lá. Fez um teste de capacitação
e foi indicado para o curso de Porteiro-Recepcionista. Ficou sabendo
que receberia um salario-incentivo (30 por cento do minimo para menores).
Que estudaria em regime de tempo integral, fazendo suas refeições
na propria escola. E que a escola pagaria as despesas de condução.
Pedro foi para casa radiante. Tinha uma boa oportunidade para substituir
seu sonho de entrar num campo de futebol vestindo a camisa de algum
time famoso. Ia trocar esta camisa pelo uniforme de porteiro.
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Primeiro
contato |
Nos primeiros contatos com a Escola de Hotelaria ele teve uma idéia
do que significavam aquelas palavras "Porteiro-Recepcionista".
É quem atende os novos hospedes de um hotel, indica os quartos
onde devem hospedar-se. Responde a eventuais perguntas sobre a cidade
e seus pontos turisticos. Sempre bem educado, solicito.
Para isto ele tinha aulas de relações humanas, de inglês,
francês e português. Atrás do balcão de
recepção da escola atendia os visitantes, os fregueses
do restaurante onde seus colegas do curso de garçon serviam
as refeições preparadas pelos aprendizes de cozinheiro.
Todos, como ele, entre 13 e 17 anos de idade.
Ao lado dele neste balcão estava sempre um instrutor. Corrigindo
seu português quando havia erros. Lembrando sempre sobre a necessidade
de demonstrar boas maneiras. De não esquecer a capacidade de
comunicação que um sorriso tem na hora certa. Atender
os fregueses do restaurante era parte do curso. Uma aula pratica.
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A
adaptação |
Dificil no inicio esquecer os gestos largos, o tom de voz elevado,
seguindo as modulações de seu estado de espirito. Mas
para ser um Porteito-Recepcionista era absolutamente necessario saber
conter-se e manter um tom neutro nas conversações. Ser
formal. E formalmente bem educado.
Vivendo durante doze horas por dia no ambiente educador da Escola
de Hotelaria, depois de cinco meses Pedro já tinha feito grandes
progressos no aprendizado. Nem pensava mais em ser jogador de futebol.
Quando terminou o curso, o diploma do SENAC abriu-lhe as portas de
um dos melhores hoteis da cidade. Agora Pedro está na portaria
do Othon.
"Em que posso servi-lo?"
Seu tom de voz é neutro e bem educado. Realmente ele é
um Porteiro-Recepcionista.
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Outras
oportunidades |
O SENAC mantém atualmente 24 cursos, a maioria para formação
profissional de jovens que tenham terminado o curso primário.
Alguns de aperfeiçoamento para profissionais que já
estejam exercendo uma profissão com os conhecimentos adquiridos
no proprio trabalho. É o caso dos cursos de Otica, Tecnicas
de Venda, Pratica de Farmacia, Enfermagem.
Num edificio moderno e funcional da av. Tiradentes, inaugurado em
janeiro deste ano, centenas de jovens vão complementar a formação
recebida nas escolas, para poder exercer uma profissão no comercio.
Haydée, 16 anos, aluna do curso de datilografia, define muito
bem o objetivo dos que procuram os cursos do SENAC.
"Com o que aprendo no ginasio não dá para arranjar
emprego. E eu quero trabalhar já, já já".
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Uma
escola que siga a criança e o adolescente |
É necessario ter muito cuidado quando se defende a tese da
formação profissional do adolescente. Os tecnicos em
educação, em quase todos os países, concluiram
que existe um periodo de pelo menos oito anos no qual a criança,
e depois o adolescente, devem frequentar a escola comum, aprendendo
a educação fundamental. Formar a criança para
o trabalho profissional antes disso pode resultar inutil por varias
razões, inclusive psicologicas. E no caso brasileiro, pode
ser inutil porque o adolescente, embora tenha aprendido uma profissão,
vai encontrar dificuldades de colocação no mercado de
trabalho onde há grande oferta de mão de obra.
Quem pensa assim, e o declara, é Celso Lamparelli, professor
e tecnico em planejamento educacional, que recentemente trabalhou
num projeto do Fundo Estadual de Construções Escolares,
visando conseguir financiamentos do Banco Internacional de Reconstrução
e Desenvolvimento, (BIRD), para ampliar o sistema escolar do Estado.
Celso Lamparelli tambem assessorou o Plano Urbanistico Basico de São
Paulo nos problemas de educação.
Para ele, o abandono ou a ociosidade infanto-juvenil não devem
ser creditados apenas à escola.
"A escola mudou, como todas as instituições devem
mudar, progredindo com o tempo. Hoje não se pode fazer uma
criança depender exclusivamente da familia: os pais estão
cada vez mais fora de casa, têm de trabalhar. Praticamente desapareceu
a familia patriarcal, que era o mundo e o universo da criança.
Da mesma forma, a escola tambem perdeu muito de suas funções.
O aluno recebe mais informações, de todos os tipos,
fora da escola que no seu recinto. A ela cabe portanto ajudá-lo
a aprender um metodo de selecionar as informações, filtrá-las,
classificá-las. Enfim, a escola moderna deve ensinar a criança
a pensar, a orientar-se entre as coisas. E não competir com
os atuais meios de informação, no conjunto muito mais
poderoso do que ela propria".
Celso Lamparelli concorda que há solução para
o abandono e a ociosidade do menor: uma rede de varios equipamentos.
A escola é apenas um deles. Deve haver parques infantis, creches,
bibliotecas e centros esportivos à disposição
das crianças.
Ainda assim, Lamparelli considera que houve um grande avanço
na luta contra este abandono e ociosidade com a mudança dos
criterios para o ingresso no ginasio, ocorrida em 1968. Os numeros
trabalham em favor de sua opinião.
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Em 1967, inscreveram-se nos ginasios estaduais 580.496 alunos, 8,8
por cento a mais que em 1966.
Em 1968, inscreveram-se nestes ginasios 757.916 alunos, 30,05 por
cento a mais que em 1967. Era o novo exame de admissão.
"Na medida em que desapareçam os criterios seletivos do
antigo ginasio, aumentará o numero de alunos fixados à
escola. Ao mesmo tempo - junto com a queda dos critericos academicos
de ensino-surgirão outros mais adequados à realidade
social e economica do país. O ensino medio será então,
para o adolescente, um periodo que podemos chamar de "sondagem
profissional". Ele ainda não aprenderá uma profissão,
mas irá tomando contato com todas as chances que tem, irá
definindo sua vocação e aprendendo seus rudimentos".
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Fora deste quadro, Celso Lamparelli não vê outra solução
para o menor além da criação da rede de equipamentos
destinados ao lazer e à recreação.
Isto não seria dificil se a administração publica
enfatizar mais seu papel de prestação de serviços
e não apenas de construção de obras".
Lamparelli explica que muitas vezes o estabelecimento infanto-juvenil
já existe, mas não é utilizado, ou é subutilizado
porque o poder público, na ansia de construir coisas novas,
não se preocupa devidamente com o já existente.
Ele concorda que uma solução seria a programação,
pela escola, de atividades para recreação e diversão
das crianças, de forma a preencher seu tempo vago. Sendo na
escola, pelo menos através dela, e sob seu controle.
Seria assim objetivo e dever dos estabelecimentos escolares programar
toda uma serie de atividades, fora de seu recinto mas consideradas
como escolares, apesar de não serem realizadas durante o periodo
de aulas. As demais instituições existentes seriam utilizadas
para isso.
Lamparelli conclui:
"Atualmente, no periodo em que estamos, os problemas são
mais quantitativos que de qualidade. Trata-se ainda de escolarizar
todas as crianças construir escolas para todos. Só no
futuro pode-se pensar nessa programação e centralização.
Já se avança alguma coisa nessa direção,
nas propostas do Plano Urbanistico Basico, onde se preconiza a construção
de predios contendo a escola, o parque, a biblioteca, enfim todos
os equipamentos que permitam às crianças e aos adolescentes
preencher educativamente seu dia. Mas isso ainda é coisa a
ser feita.
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Juizado
tambem tem seus problemas |
O Juizado
de Menores de São Paulo não está suficientemente
equipado para fazer frente, de maneira satisfatoria, ao desafio crescente
do menor abandonado ou delinquente.
No ano passado foram atendidas por aquele orgão 30 mil processos
que apresentavam invariavelmente menores como maiores vitimas - abandono,
delinquencia, desajustes, perambulagem pelas ruas. Pouco mais de 9.500
crianças e adolescentes passaram em 1968 pelo Juizado para
serem internadas nos órgãos de correção,
reinternadas, dispensadas, entregues a suas familias.
Não parecem existir, porem, condições para um
correto encaminhamento dos casos.
As soluções dadas são, via de regra, advindas
de habitos, de rotina quase mecanica e não são feitos
estudos completos dos casos, o que impede a identificação
das causas do problema; não se fazem pesquisas para dimensionar
o problema do menor e conhecer os recursos da comunidade para o seu
atendimento. Não existem projetos para a reestruturação
do Juizado, de maneira a dar-lhe meios para a sua tarefa.
O juiz Arthur de Oliveira Costa, titular da Vara de Menores da Comarca
da Capital, perguntado sobre o que poderia ser criado, melhorado ou
transformado no Juizado, para um atendimento mais efetivo, assim respondeu:
"Com o esvaziamento progressivo do actual quadro do Juizado de
Menores, a impossibilidade de serem preenchidos os claros havidos,
e a não inclusão de inumeras funções no
Regime de Dedicação Exclusiva, vê-se o Juizado
de Menores tolhido para a implantação de inumeros serviços,
que, certamente, bons resultados trariam ao trato do problema do menor."
"Os predios aos quais são recolhidos os menores não
apresentam, tampouco, condições satisfatorias, fato
agravado pela insuficiencia do numero de obras destinadas a esse fim.
Em consequencia, os menores permanecem nos locais de triagem por periodos
prolongados, o que permite a ocorrencia de dois processos altamente
nocivos ao interno: a possibilidade de contatos entre menores em diferentes
estagios de marginalização, e a adoção
de atitude passiva ante o futuro, com desanimo e posição
fatalista, desde que não lhe é comunicado, durante essa
espera, qual será seu encaminhamento."
"Paralelamente, constata-se uma completa desarticulação
entre as obras destinadas ao tratamento do menor, sendo as decisões
tomadas sem mutuo acordo ou estudo previo e comum, podendo, muitas
vezes serem de natureza conflitante."
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O
assistente social |
- "A
solução preferida pelo Juizado - manter o menor no seio
da familia, nem sempre alcança resultados satisfatorios: as
causas que levaram o menor a abandonar o lar e tornar-se delinquente
ou infrator, geralmente são de ordem economica ou psicologica,
o que dificulta ou impede sua remoção, aplicando-se
o processamento convencional e frequente.
Por outro lado, o auxilio economico dado pelo Serviço de Colocação
Familiar, que atende este ano a 15 mil familias, apenas mantém
a familia isenta de total desintegração, sem solucionar
as contradições mais profundas que geram os desajustes".
"Estudos recentes sobre as celulas familiares que recebem o auxilio
do S. C. F. revelaram o seguinte:
- "O encerramento de um caso dessa natureza só se verifica
quando os menores envolvidos completam a idade limite prevista na
lei (14 anos), ou quando da ocorrencia de algum imprevisto. Não
se tem conhecimento de algum caso que tenha sido encerrado pelo reajustamento
da familia. Varios menores, cujas familias recebem tal auxilio economico,
permanecem em situação de abandono ou infração,
sendo objeto de processos judiciais e contando com inumeras passagens
por outros setores da Vara".
E, concluindo, "a atuação preventiva do Juizado
de Menores se processa de maneira isolada, o que impossibilita alcançar
resultados satisfatorios; a forma inadequada de atendimento ao problema
cria para o cliente (menor) uma situação de dependencia
permanente numa atitude de passividade, não concorrente para
sua capacitação".
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O
assistente social |
Em São
Paulo, no meio desse emaranhado de fatores adversos, e da falta de
programação dos trabalhos e racionalização
das soluções, surge como um alento para o menor e um
ponto de referencia de onde podem partir iniciativas compensadoras,
o trabalho do assistente social.
Entrando no Juizado em substituição aos antigos comissarios
e exercendo ali as mais variadas funções, o assistente
social, o elemento mais numeroso em serviço no órgão,
tem pelo menos uma caracteristica fundamental para o trato do menor
- é sensivel aos seus problemas e humano no contato com as
crianças e adolescentes.
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