"GOVERNAREI SÃO PAULO SEM ODIOS NEM RESSENTIMENTOS"

Em "algum lugar da capital", o sr. Janio Quadros concede uma entrevista exclusiva às FOLHAS - Já escolheu três secretarios e vai fazer o levantamento da situação do municipio

Sairá de São Paulo para votar às vesperas da posse

Publicado na Folha da Manhã, quinta-feira, 26 de março de 1953

Neste texto foi mantida a grafia original

Janio Quadros, o prefeito eleito a 22 de março, concedeu ontem uma entrevista exclusiva às FOLHAS. Mais magro do que no decorrer da campanha que precedeu sua vitoria, sente-se ainda sob o efeito do desgaste fisico provocado pelos comicios, reuniões e conferencia politicas que realizou às centenas em todos os bairros da capital. Alimenta-se pouco e reforça as refeições diarias com copos de leite. Encontra-se em "algum lugar de São Paulo, depois de ter passado dois dias numa chacara localizada tambem em "algum lugar do Estado de São Paulo", para onde se retirara quando foram conhecidos os primeiros resultados do pleito eleitoral. Ambos os "lugares" eram do dominio deste reporter, que assumiu o compromisso de não dizer a ninguem onde Janio se encontra. Podemos informar, no preludio desta reportagem, que o estado de saude do futuro prefeito não inspira cuidado e que os medicos que o assistiram e ainda o assistem, estão certos de que ele necessita somente de repouso. São os primeiros a recomendar que descanse e descanse bastante.

"Governarei São Paulo sem odios e sem ressentimentos"

Suas primeiras palavras foram as seguintes:
"Governarei São Paulo sem odios nem ressentimentos. Não guardo rancores nem me disponho a realizar uma politica pessoal que se oriente pelo desejo mesquinho e condenavel de perseguir os que me combateram. Com relação ao funcionalismo municipal, devo dizer que adotarei um só peso e uma só medida, desejando que todos trabalhem e cooperem com a administração municipal, que não enxerga afilhados e protegidos. Que não tem inimigos nem favoritos. Desenvolverei, enfim, uma politica de justiça".

Não queira ser candidato

A seguir, o prefeito eleito relembra os dias que precederam o lançamento de sua candidatura. E reafirma que não queria ser candidato à Prefeitura.
"Os srs. Jango Goulart, Marrei Junior, Prestes Maia, Antonio Queirós Teles, Juvenal Sayon, alem de amigos que tenho na imprensa, sabem perfeitamente que eu desejava ver ou Prestes Maia ou Marrei Junior como candidatos e quando senti que meus esforços eram inuteis, admiti que se lançasse minha candidatura que só tinha um sentido: o da recuperação moral da administração de São Paulo."
"Preocupado com a politica, ao ingressar nela, tive apenas e continuo a ter a intenção de demonstrar que o regime democratico exige apenas honestidade e trabalho. Esforço, dedicação e honradez aplicados à causa publica para dar ao povo que sofre o que ele não encontra e nem vislumbra quando sob a ação e a influencia diretas de politicos que enxergam na causa democratica apenas a oportunidade de tirar vantagens."
"É evidente que eu me empolgo com o resultado do pleito, mas desejo destacar que já esperava a vitoria. Os numeros, as cifras, os resultados eu não podia prever. Mas eles encerram, na sua eloquencia, a grave responsabilidade que me cabe e que aceitei com satisfação: a de governar esta cidade."
Depois de uma pausa, Janio retoma a palavra para responder a uma indagação nossa e esclarecer:
"Estou coligindo dados sobre a situação atual do municipio, particularmente no setor financeiro, que parece apresentar excepcional gravidade. Tão logo conclua esse trabalho farei ao povo um relato minucioso das condições reinantes na Prefeitura, a fim de que sejam do conhecimento comum as circunstancias que envolvem o inicio da nova administração. As irregularidades existentes serão imediatamente corrigidas e as responsabilidades respectivas apuradas com o maximo rigor".

Vai sair de São Paulo

Janio sairá de São Paulo até o fim da semana, mas ainda não escolheu a cidade onde descansará alguns dias para só voltar um ou dois dias antes de sua posse.
Uma serie de perguntas sobre a administração ficaram sem resposta. Janio insiste em declarar que necessita inicialmente de tempo para coligir todos os dados que se relacionam com o exame minucioso da situação da Prefeitura.
"Antes desse levantamento, qualquer coisa que eu diga é prematura, mas desejo consignar que só a malicia e a maldade podem assoalhar que eu, sem ter tomado posse do cargo de prefeito, alimento o desejo de me candidatar a governador do Estado. Não penso nisso. Penso que é preciso restabelecer a confiança popular no regime democratico. Farei tudo que estiver ao meu alcance para realizar esse trabalho. Sei que a tarefa reclama esforços inauditos, mas não ignoro que a minha capacidade de trabalho, posta a serviço do povo na Camara Municipal e na Assembléia Legislativa Estadual, se redobrará".

Três secretarios escolhidos

Apanhamos a deixa e indagamos do futuro governo municipal. A resposta foi pronta:
"Até agora escolhi três secretarios, que, convidados, aceitaram o convite que lhes fiz: o de Negocios Internos e Juridicos, o impoluto Marrei Junior; o de Finanças, o honesto e culto Carlos Alberto Carvalho Pinto; e a de Educação e Cultura, essa admiravel educadora, que é Helena Iraci Junqueira.
"Os outros colaboradores do novo governo municipal serão escolhidos futuramente. Não tenho pressa. Desejo fazer, primeiro, o levantamento da situação do municipio, para depois me dedicar a essa tarefa maior que me confiaram os que me elegeram prefeito, ou seja, a de governar com dignidade e atento às necessidades do povo paulistano".
Essas palavras marcaram o termino da entrevista que o prefeito Janio Quadros nos concedeu. Um grupo de colaboradores da campanha memoravel o esperava.

© Copyright Empresa Folha da Manhã Ltda. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Empresa Folha da Manhã Ltda.