SUPERSTIÇÃO? ORA, QUE GRAÇA...
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Publicado
no Folha da Manhã, domingo, 03 de maio de 1953
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Neste texto foi mantida a grafia original
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Origem
de Algumas das crendices mais difundidas frutos da imaginação
ou de boatos mal espalhados
só servem para atrapalhar a vida daqueles que crêem
nelas.
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A pessoa supersticiosa tem geralmente mil e uma pequenas manias
que, em geral, atrapalham não só a sua propria vida
como a de numerosas pessoas que a cercam.
Ela não pode ver um gato preto que pensa logo: "Hoje
vai me acontecer qualquer coisa". Se vai andando pela calçada
e encontra um predio em construção, não passa
debaixo da escada ou andaime nem que lhe paguem uma fortuna, ali,
na mesma hora. Se o marido chega com a "novidade" de que
vai trazer alguns amigos para o jantar no dia do seu aniversario
e estes perfazem o numero de onze, mais ela e o marido, treze pessoas,
portanto, ela fica mal humorada, irritadiça, imaginando que
a todo momento um dos convidados vai sofrer qualquer ataque, receber
noticia má. Quando o garoto cai de cama, ela põe toda
a culpa em certa senhora que passara na calçada e ficara
olhando não sei quanto tempo para o garoto. "Ah, foi
o mau olhado daquela mulher", "ela pôs mau olhado
no meu filhinho" e assim por diante.
Durante todos os dias em que o garoto ficou de cama ela não
parava de falar na "mulher do mau olhado". Outra vez foi
com uma das amigas. Chegou, toda elegante, conversando, foi até
o quarto e num gesto natural, depositou o chapéu em cima
da cama. Na hora do jantar, ficou enjoada, não quis comer
direito e dali a vinte minutos quase desmaiou, de tão tonta
que estava. Muitas semanas depois é que o médico lhe
disse da razão do enjôo, mas antes disso comentou duas
ou três vezes que "sabia que ia acontecer qualquer coisa".
"Fulana pôs o chapéu em cima da minha cama, imagine".
O que acontece, entretanto, é que ela é supersticiosa
. Em cada coisa vê o sinal de alguma desgraça. Se a
empregada derrama sal, é outro "aviso". Quase tudo
o que acontece de ruim é precedido de "avisos".
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Porque
são raros os gatos pretos
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Pois bem. Vejamos logicamente o que pode acontecer quando uma pessoa
vê um gato preto, de dia ou de noite. Os felinos inteiramente
brancos ou inteiramente pretos são os mais raros e belos
e, portanto, os mais dificeis de serem encontrados. Podemos ver
todos os dias gatos rajado, amarelado, preto e branco, marrom e
cinza, etc, mas inteiramente preto ou branco é dificil. Por
este ou aquele motivo, o fato é que o aparecimento de um
gato branco ou inteiramente preto provoca surpresa e nem sempre
era bem recebido, pois não sabiam exatamente como tratá-lo,
como guardá-lo. Vem de há muito essa crença
de que são maleficos. Não há nada disso. São
gatos como quaisquer outros, com a diferença de serem mais
bonitos, mais raros. É motivo de orgulho e não de
receio ter um felino puro, belo, raro, em casa. Quem não
gostaria de possui um gato angorá branquinho como a neve?
Só não gostando de gato, de qualquer raça que
seja.
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E
a escada?
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Depois, vem o caso da escada no predio em construção.
Quando começaram a ser construidos os grandes predios, era
comum o transeunte ser apanhado por um tijolo, uma tabua ou qualquer
outro elemento que caía lá de cima do edificio, porque
os operários, habituados às construções
baixas, não tinham lá muita prática e jeito
para o trabalho em um primeiro ou segundo andar, e geralmente deixavam
cair pedaços de madeira, tijolos e outras coisas que, atingindo
quem passava em baixo, em geral produzia ferimento.
Daí começou a surgir o comentario que era perigoso
passar debaixo de uma escada de um predio em construção
- não porque a escada fosse perigosa, mas porque ela indicava
que existiam operários lá em cima, e que qualquer
um deles poderia deixar cair um tijolo, uma viga de madeira ou qualquer
outro objeto que machucaria certamente a pessoa atingida. Hoje em
dia, entretanto, raramente isso acontece, os operarios são
cuidados e as construções revestidas de protetor de
madeira em toda a volta. O que acontece mais frequentemente é
o proprio operario perder o equilibrio e a vida ao memo tempo, vindo
terminar seus dias na calçada.
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Treze
à mesa
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A seguir, o "treze" à mesa. Em todas as reuniões,
desde a antiguidade, sempre foi procurado o numero par para uma
refeição, pois isso evitava principalmente que alguem
ficasse fora de lugar ou não encontrasse companhia para discutir,
conversar, se distrair. Hoje em dia, entretanto, quanto mais heterogenio
for o grupo, melhor há mais entusiasmo nas conversas,
mais oportunidades, ambiente mais cordial.
A dificuldade de servir numero impar de pessoas à mesa tambem
desapareceu, de forma que a questão numero impar é
até bom indicio num baile, por exemplo, se há
numero impar de rapazes e numero par de moças, é claro
que há vantagem. E assim por diante.
O fato de o garoto ter sido vitima de mau olhado tambem nos parece
sensato. Quanto mais passam os anos parece que as crianças
ficam mais levadas, mais espertas, "impossiveis" como
dizem as mamães bravas. Acreditamos que não exista
neste mundo uma criança que olhe fixamente mais de cinco
segundos para uma pessoa desconhecida. Se der cinco minutos de atenção
a um conhecido já está fazendo muito.
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Chapéu
em cima da cama
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Se
a amiga colocou o chapéu em cima da cama naturalmente foi
porque achou muito mais comodo do que importunar a dona da casa
perguntando onde poderia colocá-lo. Se ela ficou enjoada
na hora do jantar, naturalmente é porque ela já vinha
esperando "ficar enjoada" há uns três meses,
quando o marido lhe confessou que gostaria de ser pai de uma garota.
A empregada derramou sal? A "desgraça" que está
por vir depende exclusivamente da epoca. Se for em tempo de guerra,
em que o sal custa uma fortuna e é dificil de adquirir, certamente
será uma "desgraça" desperdiçá-lo,
não é? Mas se custar pouco e puder ser encontrado
na venda da esquina, deixe a empregada derramar quanto quiser.
Geralmente as superstições são frutos da imaginação
ou boatos mal espalhados, e que com o tempo vão sendo deturpados
de tal forma que muitas vezes é dificil encontrar a razão
de uma crendice.
Muitas são engraçadas e tão infantis que servem
apenas para ilustrar ou complementar piadas e ditos espirituosos,
mas há outras que contadas seriamente e acompanhadas de exemplos
que aconteceram com "uma prima do meu vizinho" ou a tia
da irmã de Fulana, aquela que trabalha com Beltrana"
chegam a infundir certo receio nos espiritos menos prevenidos e
cultos.
Um pouco de leitura, bom conhecimento de costumes antigos, lenda
e crendices de povos atrasados e em estado semi-selvagem são
elementos seguros para que a gente descubra a explicação
pitoresca e sem consequencia em nossos dias dos motivos em torno
dos quais foram criadas e desenvolvidas as superstições
que atualmente seculo XX só servem para atrapalhar
não só aqueles que crêem nelas como tambem os
que cercam essas pessoas.
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