CHIMPANZÉ SÓ NÃO FALA PARA NÃO PAGAR IMPOSTO


Publicado na Folha de S.Paulo, sexta-feira, 26 de maio de 1967

Neste texto foi mantida a grafia original

AMSTERDÃO - A foto de um chimpanzé brandindo grosso porrete e precipitando-se, apoiado sobre suas patas traseiras, contra um inimigo é por si só suficiente para provar que esse antropóide e o homem tiveram uma origem comum, há cerca de 20 milhões de anos.
Os biologistas Jovan Orshoven, belga, e Hans van Zon, holandês, juntos como o fisico e cineasta amador holandês Rein Pfeijffers, regressaram das matas da Guiné com 3 quilometros de filme, 1200 fotografias, 5 horas de gravações sonoras e 256 paginas de notas consagradas ao estudo do comportamento dos chimpanzés.

Seis expedições

Os manuais de biologia afirmam que o homem pôde evoluir e controlar seu medo porque aprendeu a servir-se de objetos com os quais fez suas armas, utensilios etc. Esses manuais afirmam que, ao contrario do homem, os macacos antropóides, em estado selvagem, não usam armas. Entretanto, chimpanzés em cativeiro aprendem rapidamente a servir-se de porretes e outros "utensilios".
Uma primeira expedição, organizada em 1962 pelo serviço de Psicologia e Etnologia do Laboratorio Zoologico da Universidade de Amsterdão e chefiada pelo prof. A. Kortlandt, forneceu a prova de que os chimpanzés que habitam as orlas da floresta caminham sobre as patas traseiras para transportar os alimentos.
A segunda e a terceira expedições, em 1963 e 64, demonstraram que os chimpanzés que habitam a floresta fazem muito barulho e brandem pedaços de pau para espantar o inimigo, mas não se utilizam dessas "armas".
A quarta expedição, no ano seguinte, reforçou a teoria segundo a qual há cerca de 20 milhões de anos o continente africano era habitado por animais pré-antropoides que viviam num território semelhante ao atual habitat da Guiné. Mais tarde entre 5 e 10 milhões de anos atrás, vastos movimentos da crosta terrestre formaram as enormes dobras de terreno que constituem a cadeia de montanhas da Africa Oriental e deram origem ao Nilo. Os animais pré-antropoides que viviam de ambos os lados desse obstaculo, privados do contato entre si, tiveram evolução diferente: a Leste uma variedade carnívora, que caça nas planicies; a Oeste, uma variedade frugivora.
Há mais ou menos um milhão de anos, os antropoides pré-humanos da Africa Oriental, tendo, ao contrario dos atuais chimpanzés, aprendido a nadar, conseguiram transpor o Nilo, e, mais ferozes do que os macacos frugivoros, obrigaram estes a retirarem-se para a floresta.

Islã salva os chimpanzés

A quinta expedição da universidade de Amsterdão, que se efetuou no ano passado e da qual participou o biologista belga de Bernonville, dirigiu-se para a floresta a Oeste da Guiné. Verificou-se que, graças à estreita obediencia das regras do Islã pela população local, que não caçava o chimpanzé para comê-lo, os antropoides sairam novamente da floresta virgem para aventurar-se planicie, habitat que lhes é natural.
A sexta expedição, que regressou recentemente, forneceu a prova de que o chimpanzé da floresta, que perdera a faculdade de servir-se de armas, mas que conservara na sua "memoria genetica" uma centelha que lhe mandava brandir um porrete para vencer o inimigo, ao encontrar de novo o terreno aberto da planicie, reaprendeu o uso das Armas, tal como seus ancestrais longinquos.
Os quilometros de filme cinematografico e as centenas de fotos confirmam enfim a teoria de que o homem e o chimpanzé são descendentes de um ser comum, neste caso o pré-antropóide que viveu na Africa há uns 20 milhões de anos. Realmente, acentua o prof. Kortlandt, apesar de haver o chimpanzé aprendido a viver nas arvores e de ter os braços formados de maneira diferente dos braços do homem, a ultima expedição mostrou que esses antropóides brandem suas armas exatamente como o homem. Alem disso, enquanto o chimpanzé de floresta só excepcionalmente anda sobre dias patas, seu irmão da planicie adotou a locomoção bipedal para atacar o inimigo.
Por outro lado, a planicie humanizou o chimpanzé, tornando-o mais sociavel: ao contrario de seus irmãos da floresta, os chimpanzés da planicie são capazes de ação conjunta e coordenada. Seu comportamento quase humano convenceu os nativos da tribo Susu na Guiné, os quais afirmam que o macaco tambem sabe falar, e só não o faz "para não pagar impostos".

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