PROJETO FANTASTICO: MAR DENTRO DO SAARA
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Publicado
na Folha de S.Paulo, terça-feira, 24 de julho de 1962
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Neste texto foi mantida a grafia original
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Paris, julho - Um dos projetos mais audaciosos do seculo talvez se
realize. Trata-se de "construir" um mar no deserto norte-africano.
As orlas da imensa bacia já foram traçadas pela natureza
e compreendem as regiões deserticas da Tunisia e da Argelia.
Nessa area, 8 mil quilometros de areias quentissimas acham-se sob
o nivel do mar. Para alagá-las seria suficiente construir um
canal até o Mediterraneo: 45 quilometros de escavações,
menos de um terço do canal de Suez.
Com os modernos meios mecânicos, a empresa, embora apresentando
grandes dificuldades, deveria ser realizavel. Em todo caso, o traçado
já existe e desemboca no Golfo de Gabés, justamente
em frente à Sicilia. Seu custo foi orçado em 1 bilhão
e 200 milhões de marcos (cerca de 135 bilhões de cruzeiros,
ao cambio atual). Desse total, 50% será capital alemão;
o resto, francês, italiano, belga e inglês. A "Companhia
do Mar Interno" será controlada pelo governo de Tunis
e pelo futuro governo da Argelia. Uma primeira reunião realizada
em Bruxelas recentemente, teve a finalidade de apresentar o plano
à aprovação dos dois governos africanos. Devido
à situação transitoria da Argelia, os observadores
da FLN pretenderam a mais absoluta reserva sobre as conversações.
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Como
Será |
Um jornal belga deu o anuncio em poucas linhas e uma revista alemã
forneceu até mesmo preciosas antecipações tecnicas.
Soube-se, por exemplo, que os trabalhos deveriam começar em
1965 e acabar em 1970; que a agua do mar levará um ano para
encher a depressão desertica; que o novo mar banhará
as localidades de Gabés, Matmata, Doux, St. Moussa, Touggout
e Biskra. Mas a novidade, mais extraordinaria é esta: O Saara
tornar-se-ia aos poucos fertil, porque o mar interno mudaria as condições
climaticas locais. A rapida evaporação provocada pelo
calor excepcional, seria causa de abundantes chuvas, que permitiriam
o desenvolvimento de uma forma particular de agricultura racional
prevista pelo projeto. Ao longo da costa construir-se-iam 25 centros
rurais (rodeados por vastas areas cultivadas), 12 conjuntos industriais,
700 salinas colossais, e uma aldeia de portos.
Outra fonte de riqueza seria a pesca. O mar interno, dizem os peritos,
se transformaria em poucos anos numa grande reserva de alimentos preciosos.
O projeto prevê, portanto, pequena frota de navios de pesca
de 220 unidades e adequadas instalações para enlatar
e congelar os produtos. A finalidade principal da fabulosa obra é
todavia outra: levar o mar às fontes do "ouro negro".
Sob o Saara há, de fato, uma das mais ricas jazidas mundiais
de petroleo, ainda mais rica que a do Golfo Persico. Mas o petroleo
saariano alcança os portos de embarque através de centenas
de quilometros de tortuosos oleodutos, que atravessam montanhas.
Pelas condições do ambiente, sua conservação
é dificil e cara. O "mar interno" consentiria aos
petroleiros chegar diretamente às fontes de produção
ou quase.
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Outras
Idéias |
Ao que parece algumas companhias britanicas querem garantir para si
a gestão das principais rotas do novo mar, por um periodo de
pelo menos 10 anos, o tempo necessario para recuperar os capitais
investidos na empresa. As noticias sobre o projeto espalharam-se em
Gabés e em muitos outros centros, não obstante a rigorosa
reserva. Uma empresa dirigida por um italiano lançou a idéia
de construir às margens da depressão uma pequena cidade-cooperativa:
quem participar dos trabalhos tornar-se-á proprietario duma
casinha e terá direito à divisão dos bens municipais.
Tambem a industria turistica interessou-se pelo projeto e em Tunis
formou-se uma sociedade para a valorização internacional
dessa parte do deserto.
Idéias atrevidas? Ilusões? Por enquanto, nada se pode
dizer. Todavia um dado concreto existe desde o inicio de maio: um
grupo de tecnicos internacionais está acampado nas redondezas
de Gabés. Usando mapas militares (no passado somente os exercitos
tiveram especiais interesses por aquela terra pobre e arida) os homens
que trabalham no projeto voam sistematicamente sobre a area da depressão,
para fotografá-la. Espera-se no entanto a chegada dum grupo
de engenheiros hidraulicos alemães e franceses. Conseguirão
esses tecnicos fazer florescer o deserto? Somente o saberemos dentro
de alguns anos.
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