RICARDO BONALUME NETO
Especial para a Folha
O tarado produzido em laboratório tornou-se realidade graças
a pesquisas feitas nos EUA e publicadas hoje na revista "Nature".
Sem óxido nítrico no cérebro, camundongos se
tornaram muito mais violentos e com apetite sexual insaciável.
Os bichos pertencem a um grupo do qual os pesquisadores retiraram
o gene que codifica a enzima necessária para a produção
dessa substância. A enzima se chama sintase de óxido
nítrico neuronal (conhecida pela sigla nNOS).
Os cientistas dizem que essas são "as primeiras provas"
do papel, em comportamentos sociais, que teriam os neurônios
(células nervosas) da nNOS. Isto é, foi descoberto
um vínculo claro entre um comportamento e a genética.
O óxido nítrico ou de nitrogênio é uma
molécula simples, simbolizada pelas letras NO. Essa molécula
pode agir no organismo como vasodilatadora, servir de agente citotóxico
(que mata células) ou ter um papel nas mensagens entre células
nervosas.
O NO já ganhou o título de "molécula"
do ano da revista científica americana "Science",
devido à grande quantidade de trabalhos científicos
a seu respeito.
Foi na mesma revista que cientistas da Universidade Johns Hopkins
(EUA) mostraram um lado inusitado do NO: "mediador fisiológico
da função eréctil". Foi o que bastou para
esse óxido ser apelidado de "molécula da ereção".
Ironicamente, sua ausência no cérebro tornou animais
tarados.
O NO normalmente existe em altas densidades em regiões do
cérebro responsáveis pela regulação
de emoções.
A equipe de sete pesquisadores, liderada por Solomon Snyder, costumava
colocar grupos de cinco camundongos sem o gene da nNOS em uma mesma
gaiola. De manhã, geralmente havia um ou dois bichos mortos.
Para estudar melhor o que estava acontecendo, eles fizeram estudos
do tipo "intruso-residente", colocando camundongos nas
gaiolas de outros e vendo a reação dos que lá
residiam. Foram usados bichos sem o gene da enzima (nNOS negativos)
e outros normais.
"Os residentes nNOS negativos mostram 3 a 4 vezes mais encontros
agressivos do que os residentes de tipo selvagem", dizem os
pesquisadores. Os camundongos sem a enzima também iniciavam
em média 87% dos ataques -caracterizados por mordidas e lutas.
Os animais sem a enzima mostraram comportamento sexual acima da
média. Nos primeiros 15 minutos após serem apresentados
às fêmeas, tanto eles como os camundongos normais montavam
nas parceiras com a mesma intensidade. Mas sete a oito horas depois
do primeiro contato com as fêmeas, os bichos sem a enzima
continuavam montando nas fêmeas cerca de duas a três
vezes mais que os outros. Persistiam no assédio sexual mesmo
com elas mostrando desinteresse ou reclamando das atenções.
Eles checaram outros fatores que poderiam afetar o comportamento,
como nível do hormônio masculino testosterona. E concluíram
que os tarados surgiram de fato graças à ausência
da enzima.
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