Folha
subsidia recuperação do documento encontrados em Lisboa
Da Reportagem Local
Eram
23h de 8 de outubro de 1932. A multidão tomada por um "delírio
patriótico" despede-se dos dirigentes da revolução
paulista. Sob custódia do governo provisório, eles
seguiriam de trem para o Rio e em seguida embarcariam, deportados,
para Portugal.
A crônica fatual do movimento constitucionalista costuma parar
por aí. Mas a guerra prosseguiria por mais algum tempo, com
a lavagem de roupa suja no exílio.
"Julgo de meu dever convocar os aqui exilados para que formemos
um conselho de guerra que deve ter como missão analisar as
acusações". Quem escreve é o general Isidoro
Dias Lopes, chefe militar do movimento. Sua carta é inédita
e foi obtida em pesquisa subsidiada pela Folha em Lisboa. A carta
se encontrava no arquivo da família Coimbra da Luz, importadores
de café que abrigaram oficiais e civis derrotados, até
a anistia que Getulio Vargas assinaria em maio de 1934.
O "conselho de guerra" proposto pelo general Isidoro não
chegou a ocorrer. E parte das "acusações"
que o justificavam foram morrendo com a lideranças que evitaram
documentá-las.
"Esses documentos dão uma nova trombada no mito da unidade
paulista, alimentado pela historiografia oficial", diz Otto
Vongal, 32, um dos pesquisadores que saiu à cata de informações
que complementassem ou contradissessem a bibliografia sobre 1932.
As acusações a que se refere Isidoro são graves.
Uma parte delas está contida em carta - também inédita
e restaurada com a ajuda da Folha - do general Bertoldo Klinger,
segundo homem na hierarquia militar da revolução.
Klinger acusa outro militar também exilado em Portugal, o
então coronel Euclides Figueiredo, de ter se beneficiado
impropriamente do dinheiro que o grupo recebia de afortunados paulistas.
Quem vai igualmente para a berlinda é Batista Luzardo, chefe
político gaúcho que aderiu à luta dos paulistas.
Klinger o qualifica de "aproveitador de dinheiro de revoluções
e exílios".
Uma das versões dessa disputa havia sido revelada em 1954
pelo general Euclides, que aliás é o pai do presidente
João Baptista Figueiredo. Em livro sobre a Revolução
de 1932 ele relatou seus desentendimentos com Klinger, que não
o teria perdoado por sua indicação, por 34 oficiais
deportados, como chefe dos revolucionários exilados.
Agora, com a divulgação da carta de Klinger e a gravidade
que lhe é atribuída por Isidoro, a disputa se torna
conhecida a partir de um outro ângulo, e mais uma vez se enfatiza
que as dissidências dos paulistas não se resumiriam
à rendição unilateral da Força Pública
(27 de setembro de 1932) e à transformação
de seu comandante, o coronel Herculano Silva, no bode expiatório
da "traição".
Os arquivos de Lisboa têm mais coisas. Há por exemplo
uma carta a Getúlio de Paulo Haisbeler, cônsul brasileiro
em Nova York, encarregado de investigar as remessas de dinheiro
que chegavam aos exilados de Lisboa. O diplomata propõe que
o governo federal investigue o "caixa dois" (que não
tinha na época esse nome) dos empresários Numa de
Oliveira e Francisco Matarazzo.
O arquivo da família Coimbra da Luz foi vasculhado por Cleide
Azevedo, outra pesquisadora do grupo informal de historiadores.
Ela encontrou, como inéditos, 12 outras cartas ou telegramas.
Há textos de existências previsível, como uma
carta de Paulo Nogueira Filho ao ministro Oswaldo Aranha. Ou então
o relato em que Julio de Mesquita Filho narra a Batista Luzardo
a situação prefalimentar das finanças públicas
de São Paulo.
(João Batista Natali).
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