LUTA REFLETIU SUBDESENVOLVIMENTO

Publicado na Folha de S.Paulo, domingo, 5 de julho de 1992

Neste texto foi mantida a grafia original
Ricardo Bonalume Neto
Da Reportagem Local

A Revolução Constitucionalista de 32 criou no país um esforço militar superior àquele exigido anos depois pela participação brasileira na Segunda Guerra. Só o conflito com o Paraguai (1865-1870) trouxe uma mobilização comparável pelo que exigiu dos recursos do país. Apesar disso, os combates não ocorreram em grande escala e duraram pouco, cerca de três meses.
O subdesenvolvimento do Brasil se refletiu no péssimo equipamento e no treinamento ruim das tropas enviadas à luta e no modo sem imaginação como foram empregadas.
Em 1932 os principais exércitos do planeta estavam atrelados a dogmas militares da Primeira Guerra (1914-1918). Os alemães ainda não tinham inventado a Blitzkrieg (guerra-relâmpago). Os exércitos tinham tanques mas não sabiam direito o que fazer com eles. As tradicionais infantaria e artilharia, apoiadas discretamente pela aviação, eram a norma. A defesa tendia a triunfar sobre a ofensiva.
Se a doutrina militar era retrógrada nas Forças Armadas do centro, na periferia não dava para esperar muita inovação. A revolta paulista não teve nenhum lance brilhante de estratégia, nem grande batalhas decisivas.
Vence quem comete menos erros, diz um dos clichês da profissão militar. Os paulistas fizeram uma sucessão deles. Começaram esperando demais por tropas prometidas por aliados que não chegaram. Não tomaram a iniciativa de um grande movimento de forças dirigido contra a sede do governo no Rio de Janeiro. Uma força mais fraca que permanece na defensiva apenas contra os dias de sua eventual derrota.
São Paulo enfrentou combates em praticamente toda a divisa do Estado. As duas principais frentes eram a do Vale do Paraíba e a da divisa contígua com Minas Gerais, ou seja, na direção do eixo São Paulo-Rio. As outras frentes tinham importância secundária, embora contribuíssem para o cerco de São Paulo. O ponto básico da estratégia do governo era isolar o Estado para impedir que os paulistas recebessem reforços de tropas ou pudessem importar armamentos.
A disparidade de forças era grande. Estimativas dão 35 mil homens para os paulistas e cerca de cem mil par ao governo de Vargas (como comparação, a Força Expedicionária Brasileira que combateu na Itália em 1944-45 tinha em torno de 25 mil homens).
São Paulo tinha bem menos canhões e aviões e não dispunha de Marinha. Os navios governistas puderam bloquear o porto de Santos, asfixiando economicamente o Estado ao impedir a exportação de café. Também não foi possível trazer armas compradas no exterior.
Mas assim como São Paulo não tinha condições de uma resistência prolongada, o governo não tinha meios para uma ofensiva fulminante. Foi o desmoronamento gradual das frentes que trouxe a derrota.
O equipamento obsoleto dos combatentes também não contribuiu para que grandes avanços táticos fossem feitos. Os paulistas mostraram uma boa capacidade de improvisação ao fabricarem equipamento e munição. O caso mais conhecido é o do "trem blindado". Trata-se de um equipamento quase inútil em uma guerra moderna, já que trens são presos a trilhos. Na melhor hipótese um trem tem mobilidade limitada; e é fácil de conter, bastando arrancar os trilhos. Mas em 32 o "trem blindado" serviu para assustar tropas bisonhas.
Também houve episódios na direção certa da evolução da técnica militar. Por exemplos, aviões paulistas atacaram navios da Marinha que bloqueavam Santos. Não conseguiram sucesso e um deles foi abatido pela artilharia antiaérea de um cruzador. Eram biplanos obsoletos e mal-armados. Naquela época se duvidava de que aviões fariam grandes danos a navios. Os japoneses mostraram o contrário ao arrasar a frota norte-americana em 1941 no Havaí.
O "sucesso" dos aviões que sobrevoaram Santos foi outro. Foram a gota d'água para que Alberto Santos-Dumont se suicidasse, triste com o uso bélico do aparelho que ajudou a criar.


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