AFUNDADO PELO "RIO BRANCO" UM SUBMARINO DO "EIXO"


Publicado na Folha da Manhã, quinta-feira, 29 de outubro de 1942

Neste texto foi mantida a grafia original


Rio, 28 (Da nossa sucursal — pelo telefone) O vice-almirante Americo Vieira de Mello, chefe do Estado Maior da Armada, louvando-se no expediente publicado no boletim do Ministério da Marinha, pelo diretor-geral do Pessoal da Armada, em oficio nº 491 (EM. 2), de 1942, acaba de elogiar, nominalmente, a guarnição da peça de artilharia montada a bordo do cargueiro "Rio Branco" da frota do "Lóide Brasileiro".
É o seguinte, na íntegra, o elogio publicado pelo boletim da Armada:
"De conformidade com o oficio nº 491 (EM. 2), de 1942, o exmo. sr. chefe do Estado Maior, da Armada resolveu elogiar, nominalmente, o 1º sargento Augusto Jonas de Sousa, o cabo Saturnino Dias de Sant'Anna e os marinheiros de 2ª classe Antonio Telles Carvalhal e Antonio Pedro de Lima, pela presteza, energia e eficiência com que agiram no desempenho de seus deveres, no canhão montado no vapor "Rio Branco", concorrendo, assim, para que esse navio se livrasse do ataque que se tornara iminente por um submarino em águas do Mar dos Caraibas".
As primeiras informações a respeito do caso eram as seguintes: um submarino alemão fora afundado no mar dos Caraibas, por um cargueiro do "Lóide Brasileiro" que se dirigia para Nova York. De posse desses elementos, a reportagem se pôs imediatamente em ação. Efetivamente, um navio brasileiro havia atacado um submarino do "eixo", quando este, em posição de combate, se preparava para lançar os seus torpedos.
O encontro do "Rio Branco com o submarino inimigo ocorreu quando a unidade do "Lóide Brasileiro" se dirigia para o porto de Nova Orleans. Foi em pleno mar dos Caraibas, onde a ação inimiga mais se vinha fazendo sentir. Interessante é notar que o "Rio Branco" já foi dado como afundado pela rádio de Berlim.
Das circunstâncias que cercaram o ataque ao "Rio Branco" ressalta uma que vem demonstrar, inequivocamente, os subterfúgios e os meios covardes utilizados pelos nossos inimigos, para atingirem seus objetivos. Verificado o perigo, o comandante do "Rio Branco", Raymundo de Araujo, determinou que a estação rádio-telegráfica de bordo emitisse sinais de "S. O. S.", que foram captados pela estação costeira de Barbados, onde se providenciou para o envio de socorro com a necessária brevidade. Enquanto o operador brasileiro emitia aqueles sinais, o aparelho do submarino irradiava um terrivel zumbido, visando interferir nas mensagens do navio nacional. Apesar, porém, dos recursos empregados pelos piratas totalitários, o socorro chegou, tendo sobrevoado o "Rio Branco" uma esquadrilha da força aérea norte-americana de nº 7 585, que durante longo tempo perscrutou os arredores, voltando, mais uma vez, para prosseguir nas suas operações. Em seguida, o comandante Raymundo Araujo, pondo em prática as providencias que o caso indicava, ordenou a mudança de rumo, logrando o "Rio Branco" chegar a salvo a seu destino.

O "Rio Branco"

O "Rio Branco" é um dos melhores e maiores cargueiros da frota do "Lóide Brasileiro". Adquirido recentemente nos Estados Unidos, apenas há pouco mais de dois anos, foi incorporado à nossa marinha mercante.
Desloca cerca de 4 925 toneladas de registro e é de construção norte-americana. Está devidamente "camuflado" como de resto todos os nossos navios. Dispõe de um canhão defensivo de 75 m/m embasado na popa.

O comandante do navio

O seu comandante e o capitão de longo curso Raymundo de Araujo, experimentado lobo do mar que, desde os 18 anos de idade, ingressara na marinha mercante.
Durante a última guerra mundial, de 14 a 18, serviu a bordo de várias unidades nacionais que cruzavam a zona perigosa.
"Tivemos oportunidade de encontrar um desses submarinos do "eixo" no mar dos Caraibas, mas tivemos a sorte de saber defender-nos muito bem. Prosseguimos nossa viagem até esse país amigo. Não posso, por carta, descrever esse acontecimento. Você saberá depois".
Era um expressivo trecho de uma carta do comandante Raymundo de Araujo à sua esposa, d. Edith Pinto de Araujo.

Como ocorreu o afundamento

A reconstituição de toda a aventura com o "Rio Branco" é a seguinte:
O cargueiro do "Lóide Brasileiro" navegava pelo Mar dos Caraibas, seguindo a rota habitual. Amanhecia.
Horas antes, havia sido deixada para trás a ilha de São Vicente. O mar estava calmo. Nenhuma nuvem se via nos ceus. Manoel de Oliveira o imediato acabava de entrar de quarto. Observava a posição, a rota seguida, enfim, fazia as verificações da rotina habitual. Eis que, de binóculo em punho, divisou qualquer coisa estranha a bombordo. Firmou mais a vista, chamando a atenção de seus companheiros. O objeto se aproximava vagarosamente. Agora, lá estava a uma distância aproximada de três mil metros. O imediato Manuel de Oliveira podia divisá-lo bem. Era o periscópio e parte da torre de um submarino. A esse tempo era dado o alarma a bordo. Todos corriam para seus postos. Os artilheiros da nossa marinha de guerra de mão na culatra aguardavam, impacientes, o momento de entrar em ação. O objeto continuava a mover-se vagarosamente. O submarino inimigo se colocava em posição de ataque. Em breve, arremessaria um torpedo contra o "Rio Branco". Agindo com a rapidez e a decisão que a situação exigia, o imediato Manoel de Oliveira ordenou uma manobra rápida - a única alternativa que restava no momento. Rumando para noroeste o cargueiro deu a popa para ao submarino "eixista" que ficou na sua esteira. Pouco mais de cinco minutos durou a manobra salvadora que possibilitava ainda ao "Rio Branco" poder atacar o inimigo com seu canhão de 75 m/m alem de diminuir poderosamente a probabilidade de ser atacado. O submarino já se achava a uma distância de 2 300 metros mais ou menos. Antes mesmo de completada a manobra, já o canhão do "Rio Branco" entrara em ação. A primeira granada fora arremessada. Em seguida, outros tiros foram desfechados em direção ao inimigo. Nove ao todo. A torre e o perioscópio do submarino começam a submergir lentamente. Minutos depois, desapareciam sob as águas.
Denso rolo de fumaça branca desprende-se das ondas, no local em que, momentos antes, era visto o submarino nazista. Este desaparecera para sempre.
A esse tempo de acordo com as normas estabelecidas, o "Rio Branco" emitira reiterados pedidos de "S.O.S."
Vinte minutos depois surgia no horizonte uma patrulha das força aéreas norte-americanas. Sobrevoando o navio, os aparelhos efetuaram rigorosas pesquisas nas redondezas. Foram verificadas várias manchas de óleo na superfície das águas. Não havia mais a menor dúvida. A suspeita dos tripulantes do "Rio Branco" tornava-se realidade. O submarino inimigo afundara sob as granadas dos marinheiros brasileiros.


Entusiasmo entre a tripulação

A bordo, a marujada não podia esconder seu contentamento. Eram manifestações de alegria e entusiasmo de toda espécie. Cada vez que um avião norte-americano se aproximava do "Rio Branco" era saudado pelos marinheiros que, espalhados pelo convés, à popa e à proa, gesticulavam empunhando bandeiras brasileiras. Alguns cantavam o hino nacional.

Rumo a Nova Orleans

Foi dada toda a força ao navio. E o "Rio Branco" continuava sua viagem para Nova Orleans. Já agora sob a proteção dos poderosos aviões das forças aéreas norte-americanas.
Dias depois, sem que qualquer outro acontecimento sobreviesse, o cargueiro do "Lóide" lançava ferro em Nova Orleans. A maior preocupação de seus tripulantes era escrever ou telegrafar para seus entres queridos, relatando o ocorrido.

A guarnição da peça

O canhão de 75 m/m do "Rio Branco", está guarnecido por quatro homens: um sargento, um cabo e dois marinheiros especializados.
São os seguintes os artilheiros: — sargento Augusto Gomes de Sousa, cabo Saturnino Dias Sant'Anna e marinheiros Antonio Telles Carvalhal e Antonio Pedro Lima.
Já no Rio, o comandante do "Rio Branco", capitão Raymundo de Araujo, reproduziu tudo o que acima dissemos, confirmando-o integralmente.

Nota do ministério da marinha

RIO, 28 — O Ministério da Marinha informou que o navio do "Lóide Brasileiro" "Rio Branco" durante recente viagem no mar dos Caraibas, lutou com um submarino alemão. O corsário do "eixo" foi avistado a três quilômetros do navio brasileiro, que manobrou, escapando ao ataque. Em seguida, os artilheiros brasileiros deram oito tiros de canhão contra o submarino que foi atingido pelo menos uma vez, pois se levantou de bordo do submersivel uma espiral de fumaça branca.
Após o ataque, o "Rio Branco" emitiu "S. O. S.", vindo em seu socorro um avião norte-americano quando já o inimigo havia desaparecido.
O navio brasileiro seguiu viagem para Nova Orleans, onde chegou a salvo.
O comandante do "Rio Branco" é o capitão Raymundo Araujo, sendo ele e sua guarnição elogiados pelas autoridades navais.


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