COSTA E SILVA AFIRMA QUE NÃO HAVERÁ ANISTIA


Publicado no Folha de S.Paulo, terça-feira, 29 de dezembro de 1964

Neste texto foi mantida a grafia original


RIO, 28 (FOLHA) - O ministro da Guerra, general Costa e Silva, desmentiu hoje, nas Laranjeiras —após o encontro que manteve com o presidente Castelo Branco— que o governo esteja cogitando de conceder anistia aos atingidos pelo Ato Institucional.
"É pura conversa. Essa noticia parece com a do enfarte que disseram que eu tive quando da minha viagem ao Norte" —completou o ministro.
A impressão dominante é que os proprios atingidos pelas sanções do Ato Institucional pleitearão a revista de suas punições no Judiciario, que deverá resolver os casos individualmente, à luz dos argumentos apresentados.
Na reunião que o ministro da Guerra manteve com o presidente Castelo Branco, da qual participou o chefe do Estado-Maior do Exercito, gen. Decio Palmeiro Escobar, o chefe do governo aprovou as nomeações dos coronéis Luís Felipe de Azambuja e Airton Pereira Tourinho para adidos militares na Bolivia e no Chile, respectivamente.

Governo não cogita de conceder anistia no fim do ano

RIO, 28 (FOLHA) - Alem do ministro da Guerra, assessores presidenciais anunciaram que o governo não cogita de conceder anistia aos atingidos pelo Ato Institucional, e classificam como sem fundamento as noticias a respeito de uma possivel anistia parcial, que seria determinada pelo presidente Castelo Branco a 31 de dezembro. Comentaram que a anistia, para ser aplicada, deveria ser ampla e nunca assumir o carater particular de beneficiar esta ou aquela pessoa. Admite-se que os proprios atingidos pelo Ato Institucional pleiteiem a revisão de suas punições, especialmente os funcionarios publicos demitidos ou aposentados de seus cargos. Os processos, neste caso, seriam encaminhados ao Judiciario, que deverá resolver os problemas isoladamente, de acordo com os argumentos apresentados.

Heck não acredita

Tambem o almirante Silvio Heck afirmou não acreditar na possibilidade da decretação de anistia, mesmo restrita, embora admita uma futura revisão no sentido de restabelecer os direitos politicos de certos elementos atingidos pelo Ato Institucional.
Interrogado sobre a possibilidade de estarem os srs. Juscelino Kubitschek e Janio Quadros entre aqueles elementos, acentuou o almirante Silvio Keck:
"Por questões de elegancia, não falo, na presente conjuntura, sobre os ex-presidentes Juscelino Kubitschek e Janio Quadros. O primeiro, porque determinou a minha prisão varias vezes, quando era chefe da nação em consequencia de meus pronunciamentos contra ele. O segundo, porque o servi como ministro da Marinha."

Cassados são contrarios à idéia

RIO, 28 (FOLHA) - Tanto o ministro da Guerra, general Costa e Silva, quanto o chefe do Gabinete Militar da Presidencia, general Ernesto Geisel, desmentiram os rumores sobre a decretação de anistia parcial que beneficiaria politicos privados dos seus direitos e funcionarios demitidos. A idéia da anistia de fim de ano foi sugerida, em discurso que fez na Pontificia Universidade Catolica, pelo professor Alceu Amoroso Lima que é muito respeitado pelo presidente Castelo Branco, segundo afirma o proprio presidente. A idéia foi rejeitada por varios politicos cassados que julgam que a anistia significaria uma confirmação de delitos pelos quais eles não se consideram responsaveis.
A maioria prefere uma revisão dos processos em que o presidente se baseou para —à Luz do Ato Institucional— cassar-lhes os direitos. Essa foi —por exemplo— a resposta que o sr. Janio Quadros deu, há alguns meses quando emissarios militares lhe falaram em anistia. Agora, quando elementos da "linha dura", sobretudo aqueles ligados à Liga Democratica Radical, falam na anistia do sr. Janio Quadros, a objeção do ex-presidente tem sido lembrada pelos adversarios da concessão dessa medida.
Apesar dos desmentidos, a idéias da anistia continua sendo discutida nos meios politicos - inclusive naqueles vinculados, diretamente, ao governo. Há mais de quatro meses, o chefe do Serviço Nacional de Informações, general Golberi do Couto e Silva, admitia que "mais cedo ou mais tarde, uma anistia virá". Mas pedia aos seus interlocutores (na epoca em que procurou fazer contatos iniciais com adversarios do governo, o restabelecimentos do dialogo politico) que tivessem paciencia, porque os animos, na area da revolução de março, ainda estavam exaltados.

Revisão de processos

De um modo geral, os politicos da UDN admitem a hipotese da revisão proxima de alguns processos —como balão de ensaio para a concessão de uma medida mais ampla. Esses processos seriam, inicialmente, os de tecnicos de reputação comprovada, como —por exemplo— o sr. Celso Furtado, contra quem nada ficou apurado no que concerne à corrupção ou à subversão. Não passa semana sem que alguma entidade estrangeira —universidade, associação cultural etc.— envie pedido de revisão de processos ou solicite o reexame de punições, sobretudo de escritores, tecnicos e cientistas. Ainda recentemente a familia do sr. Miguel Arraes recebeu uma carta do escritor François Mauriae, para ser entregue ao presidente Castelo Branco, pedindo a libertação do ex-governador de Pernambuco, contra quem nada ficou —tambem— apurado.
No que diz respeito ao sr. Arraes, a sua familia procura manter-se muito discreta. Sabe-se, no entanto, que contactos exploratorios estão sendo feitos há algum tempo entre autoridades e familiares do ex-governador no sentido de ser obtida a sua libertação, após a concessão de competente habeas-corpus pelo Supremo Tribunal. O governo preferiu ver o sr. Arraes fora do país —já tendo sido feita a sugestão, à sua familia, para que ele, no momento oportuno, procurasse asilo em uma embaixada. No entanto, o sr. Arraes prefere sair do país com passaporte , viajando normalmente, sem recorrer ao asilo diplomatico. Nesse caso, iria para a Europa, e, em seguida, procuraria trabalho em organização internacional, em país não-comprometido com qualquer dos blocos politico-militares mundiais, com o intuito de fixar uma posição politica definida.

Na area militar

A idéia da revisão do processo encontra acolhida em algumas areas militares - desde que seja feita caso por caso e desde que não inclua elementos politicos muito radicais, principalmente o sr. Leonel Brizola. Alguns chefes militares admitem um eventual revisão da medida de carater politico que cassou os direitos do sr. Juscelino Kubitschek. Entre esses é apontado o general Nelson de Melo, como figura destacada. O sr. Kubitschek já anunciou que voltará ao Brasil em principios de 1965, ainda não se sabendo se embarcará antes ou depois do primeiro aniversario da Revolução. Há um grande esforço, por parte dos seus amigos, para que ele volte após uma campanha em favor da anistia. Outros, porem, acham isso prematuro.
De qualquer modo, o sr. Kubitschek pretende voltar para residir em Diamantina - o que significa que a sua participação, ainda que indireta, na politica, será inevitavel. Até que ponto terá ele oportunidade de ser anistiado para concorrer às eleições (e o PSD tem feito pesquisas de opinião que o apresentam como um candidato de grande receptividade) é o que não se sabe. Admite-se, no entanto, que alguns dos presumiveis candidatos, na area militar, concordem com a anistia do sr. Kubitschek desde que isso concorra para reforçar as suas respectivas candidaturas. Ontem, afirmava-se que o sr. Juraci Magalhães, embaixador do Brasil em Washington, é partidario de uma revisão dos processos de suspensão de direitos politicos, por julgar que a medida seria muito bem recebida no exterior.


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