OPOSIÇÃO IMPEDE ELEIÇÃO DA MESA

Publicado na Folha de S.Paulo, sábado, 26 de fevereiro de 1966

Neste texto foi mantida a grafia original

BRASILIA, 25 (FOLHA) - Após uma serie de incidentes, de dois adiamentos de sessão na Camara dos Deputados, que deveria eleger hoje sua Mesa, e da divulgação de um veemente manifesto do MDB (ver texto abaixo), alem de uma troca de discursos entre os líderes Vieira de Mello, oposionista, e Raimundo Padilha, do governo, a Oposição declarou-se hoje em obstrução permanente. Anunciou que manterá essa atitude mesmo depois de superada a crise aberta com o episodio da renovação da Mesa, em protesto contra o que denomina de "imposição da vontade totalitaria do governo".
A ausencia dos deputados do MDB impediu a eleição da Mesa que já fora adiada para hoje à noite. A sessão convocada para a noite durou apenas dois minutos. A ARENA não tem em Brasilia os 205 deputados exigidos pelo regimento, para a votação e o sr. Bilac Pinto convocou nova sessão para as 13 hs 30 de 2.a-feira, mas a liderança do governo está avisando seus liderados que a eleição somente se realizará quarta-feira.
No momento em que foram rompidas as negociações entre os dois partidos, apenas 161 membros da ARENA estavam na Camara, cuja portaria acusava o comparecimento total de 281 deputados.
As ultimas horas de hoje, a liderança do governo empenhava-se na arregimentação dos ausentes, num grande esforço para trazer pelo menos mais 50 deputados, o que permitiria eleger a nova mesa.

Os antecedentes

Uma serie de problemas havia provocado, por duas vezes, o adiamento da eleição da Mesa: a primeira, às 10 hs 30, quando se procurava achar uma nova formula de entendimento para distribuição dos postos entre a ARENA e o MDB. E a segunda, às 14 hs 30.
Verificada a falta de quorum, de manhã, após a abertura dos trabalhos, o presidente Bilac Pinto convocou nova sessão para as 14 hs 30.

O manifesto

A Oposição fêz divulgar, antes do inicio da segunda sessão, um manifesto no qual afirma que: «a bancada governista, que encarna, na Camara dos Deputados, a vontade totalitaria oriunda do Poder Executivo, rompeu compromisso assumido com a oposição, violentando principios constitucionais e normas parlamentares, ao negar-lhe condições para participação e fiscalização dos trabalhos da casa. »
«A bancada oposicionista, desde o primeiro momento, pautou sua conduta à luz da mais rigorosa etica, mantendo-se fiel aos entendimentos realizados. Não criou, não animou dissidencias artificialmente formadas, nem com elas se comprometeu, ou delas pretendeu tirar qualquer proveito. »
«Em face do lamentavel procedimento da ARENA o Movimento Democratico Brasileiro deliberou, por aclamação unanime, não participar da farsa que constituiria a instalação de um partido unico no comando da Camara dos Deputados, medida preliminar, talvez, para o esvaziamento de qualquer candidatura presidencial não-originaria do Palacio do Planalto. E resolveu, outrossim, protestando e reagindo contra este monopolio oligarquico dos instrumentos do poder, negar apoio efetivo ou tacito a qualquer de suas manifestações futuras, sustentando desta forma, firmemente, a bandeira da redemocratização e da plenitude da ordem constitucional em nosso país».

Explicações e Acusações

Iniciada a sessão convocada para as 14h30, e verificada a presença de 177 parlamentares, o sr. Vieira de Mello foi à tribuna, para explicar as razões do manifesto. Afirmou que a oposição protestava não porque estivesse afastada da Mesa, "mas por sentirmos que o partido do governo não pretende sequer ser fiscalizado na Mesa, unico lugar que tem a função de aplicar os dinheiros publicos".
Dentro dessa posição de protesto, disse, a resistencia nos trabalhos parlamentares irá até as ultimas consequencias: "Cuide-se o governo de ter 205 deputados para votar suas mensagens, que nós, da oposição, não podemos e nem temos condições morais e politicas para emprestarmos nossa colaboração, já que não se respeita a Camara, nem a Constituição, nem as praticas democraticas das organizações da vida parlamentar".
Fez um historico dos ultimos acontecimentos ligados à constituição da chapa para a Mesa da Camara e revelou:
1. No inicio, de acordo com a proporcionalidade partidaria, as oposições seriam representadas na Mesa talvez com a 1.a e a 4.a Secretarias.
2. Depois, surgiu um "grupo de rebeldes", liderados pelos deputados Nilo Coelho e Mario Gomes, que em dissidencia tentava articular-se com a oposição, formando uma chapa contraria à da ARENA.
3. Houve uma reunião de apaziguamento no Palacio do Planalto e, para atender-se ao "grupo rebelde", foram desfeitos os compromissos com a oposição.
4. Em consequencia, a oposição resolveu não mais participar da Mesa da Camara, denunciando o procedimento dos setores governistas.

Resposta do governo

Em resposta ao sr. Vieira de Mello, o sr. Raimundo Padilha, lider do governo, acusou-o de não procurar "para este país e para este parlamento, uma solução nimiamente politica" e quanto ao manifesto, classificou-o como "uma reação espontanea, emocional, de inteligente alcance politico", mas "não representando a veracidade dos episodios que ocorreram entre as lideranças".
Confessou-se surpreso com a atitude do sr. Vieira de Mello e afirmou que "o momento brasileiro exige que o debate se trave dentro da area parlamentar", não podendo ser transformado "em algo semelhante a um cataclisma politico-social".
Frisou que, se houve marchas e contramarchas nos entendimentos, elas foram necessarias porque o lider do governo somente poderia assumir compromisso em perfeita sintonia com as diversas correntes de sua bancada. Justificou até a participação do presidente Castelo Branco, que não pode ver os seus defensores no Congresso - disse - "eventualmente separados em materia não substancial, mas com repercussões dentro e fora do parlamento". Refutou que a ação presidencial seja "ingerencia", pois o chefe do governo "tem a responsabilidade politica de trazer uma palavra - não uma determinação ditatorial, mas um esforço inteligente de coordenação - para mostrar o que está faltando como base dos entendimentos que se deveriam realizar - não a qualquer preço, mas dentro de uma linha de reciproca dignidade".

Os adiamentos

Após o pronunciamento dos dois lideres, o presidente Bilac Pinto quis encerrar os trabalhos (afirmava que não havia os 205 parlamentares no plenario), mas o dep. Nelson Carneiro solicitou nova verificação de presença. Atendido o pedido, verificou-se a presença de 250 deputados; havia numero regimental para o inicio da votação.
Ante a insistencia da oposição, o sr. Bilac Pinto viu-se obrigado a revelar que "até este momento não chegou á Mesa a relação de candidatos aos seus cargos". Assim - acrescentou - "não foi possivel à Mesa providenciar a impressão de cedulas para a realização, tornando impossivel o inicio do pleito". Anunciou, tambem, que os candidatos podiam ser registrados até às 18 horas, devendo as eleições começar na nova sessão marcada para as 22 horas e que durou apenas dois minutos.

A chapa

A chapa oficial - unica que será apresentada ao plenario - ficou constituida ao inicio da noite, quando foi encaminhada à Mesa, que imediatamente determinou a confecção das cedulas.
São os seguintes os candidatos: Presidente: Adauto Cardoso (ex-UDN da Guanabara); 1.o vice: Batista Ramos (ex-PTB de São Paulo); 2.o vice: José Bonifacio (ex-UDN de Minas); 1.o secretario: Nilo Coelho (ex-PSD de Pernambuco); 2.o secretario: Henrique La Rocque (ex-PSP do Maranhão); 3.o secretario: Aniz Brada (ex-PDC de São Paulo); 4.o secretario: Ari Alcantara (ex-PSD do Rio Grande do Sul).
Suplentes: Daso Coimbra (ex-PSD do Estado do Rio), José Menck (ex-PDC de São Paulo), e Adrião Bernardes (ex-PSP de São Paulo).

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