APROVADA A ALTERNATIVA DA ESTABILIDADE

Publicado na Folha de S.Paulo, quarta-feira, 24 de fevereiro de 1988

O plenário do Congresso constituinte aprovou ontem, por 373 votos a 151 e quatro abstenções, o texto sobre a estabilidade no emprego que resultou de um acordo entre a liderança do PMDB e o grupo suprapartidário Centrão. Os partidos de esquerda, o PTB e o Movimento de Unidade Progressista (MUP), do PMDB, votaram contra o acordo, sob a alegação de que o texto apresentado, em vez de ajudar, prejudicaria os trabalhadores. Agora, a relação de emprego será protegida "contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos". Ainda como parte do acordo entre PMDB e Centrão, deverá ser inserido no Ato das "Disposições Transitórias" da nova Constituição o estabelecimento de indenização equivalente a 40% do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), a ser paga enquanto o dispositivo constitucional sobre a estabilidade não for regulamentado. A legislação complementar fixará em definitivo o valor da indenização e outros direitos dos trabalhadores, que poderão dificultar (não impedir) as demissões imotivadas.
Os parlamentares de esquerda defendiam uma fusão de emendas elaborada de comum acordo com as centrais sindicais, prevendo a nulidade das demissões imotivadas. "Vamos colocar a foto do senador Mário Covas (líder do PMDB na Constituinte) nos cartazes que denunciam os traidores da classe trabalhadora", disse o presidente da CUT, Jair Meneguelli. Ele fez duras criticas ao acordo, classificando o texto aprovado como "um inferno". "Dos males, o menor", disse o presidente da CGT Joaquim dos Santos Andrade, acrescentando que "às vezes, somos obrigados a aceitar certas coisas para evitar o mal maior".

Plenário troca estabilidade por indenização a demitidos

Da Sucursal de Brasília

O texto resultante do acordo entre a liderança do PMDB e o Centrão, sobre a estabilidade no emprego, foi aprovado às 18h de ontem pelo plenário do Congresso constituinte, na maior votação realizada até agora (528 votantes, de um total de 559 parlamentares). A proposta obteve 373 votos a favor, 151 contra e 4 abstenções. Até ontem, a maior votação tinha sido a do terrorismo, que reuniu 526 parlamentares. Os parlamentares dos partidos de esquerda, do PTB e do Movimento de Unidade Progressista (MUP) do PMDB, votaram contra o acordo, alegando que ele eliminou a estabilidade no emprego.
Conforme o texto aprovado, a relação de emprego será protegida "contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos". Isto significa que a Constituição não garante a estabilidade no emprego. O empregador poderá demitir seus funcionários sem qualquer restrição. Será obrigado, porém, a pagar uma indenização em dinheiro ou outros direitos que venham a ser estabelecidos pelo Congresso regular.
O acordo estabelece uma regra provisória para o pagamento da indenização, que entrará em vigor imediatamente após a aprovação da nova Carta. Esta parte do acordo será votada nas "Disposições Transitórias". O artigo prevê que o assalariado demitido sem justa causa receberá seu Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) mais 40% do total de depósitos do Fundo (em vez dos 10% atuais). Quando o Congresso aprovar a lei complementar, este artigo deixará de ter valor legal. Será substituído por uma lei que fixará em definitivo o valor da indenização e outros direitos dos trabalhadores, que poderão dificultar (não impedir) as demissões imotivadas (sem outro motivo que a decisão do empregador). A votação da lei complementar pode demorar anos ou nunca vir a acontecer. Neste caso, as "Disposições Transitórias" mantém sua validade.

Protestos

A aprovação do texto do acordo foi precedida por uma série de protestos dos partidos de esquerda e dos "progressistas" do PMDB. O coro foi engrossado pelo líder do PTB na Câmara, Gastone Righi (SP), do Centrão, que considerou o acordo "um embuste". A esquerda defendia uma fusão de emendas elaborada de comum acordo com as centrais sindicais, que previa a nulidade das demissões imotivadas. Esta proposta não chegou a ser votada, devido à aprovação do texto do acordo.
Gastone Righi, o primeiro a discursar contra o acordo, disse que o PTB não concordava em "transacionar de maneira absolutamente insensata, irresponsável e espúria". Segundo ele, "esta proposta não garante a estabilidade nem coisa alguma". Manifestou também seu repúdio aos "enganadores da opinião pública e aos traidores da classe trabalhadora".
O líder do PT, Luís Inácio Lula da Silva (SP), disse que "a esquerda fez das tripas coração para que houvesse acordo, mas muitas vezes sequer foi ouvida". Ele disse que o acordo sobre a estabilidade era "espúrio" e representava a negação de todas as promessas feitas pelos constituintes nos palanques.
O líder do PFL, José Lourenço (BA), falando em nome do Centrão, disse que o acordo havia surpreendido os que não acreditam no diálogo. "Prevaleceu o bom senso, através de um compromisso a que chegaram os homens de bem, para que o texto constitucional seja a expressão da vontade da maioria", afirmou.
O discurso mais esperado era o do líder do PMDB no Congresso constituinte, Mário Covas (SP), acusado de ter possibilitado o fim da estabilidade, ao fechar o acordo. Durante cerca de 20 minutos, -o tempo regimental é de cinco minutos-, um plenário atento ouviu Covas dizer que estava respeitando a vontade da maioria dos integrantes de sua bancada. O senador disse que, dos mais de 300 peemedebistas, havia conseguido ouvir 165, dos quais 148 se posicionaram favoravelmente ao acordo. "Nem sempre se pode ter o que se quer", afirmou.

Destaque

Antes que o texto do acordo fosse votado, o deputado José Genoino (PT-SP) solicitou à Mesa que colocasse em votação um destaque de votação em separado (DVS) de sua autoria, pelo qual o texto originalmente proposto pelo Centrão precisaria de 280 votos para ser mantido. Pelo regimento, argumentou Genoino, os DVS têm prioridade de votação.
Depois de mais de meia hora de discussão, o deputado Ulysses Guimarães anunciou que seria votado o texto do acordo, não o DVS de Genoino. O líder do PDT na Câmara, Brandão Monteiro (RJ), que denunciara há dias o voto "fantasma" de Sarney Filho, disse então que, com esta decisão, o "pianista" estava absolvido, pois tinha cometido falha muito menos grave que o presidente do Congresso constituinte.

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