SARNEY FEZ EM SUA TV NEGÓCIO QUE HOJE ATACA


A TV Mirante, da família do ex-presidente José Sarney, converteu empréstimos do Banco do Brasil em contratos de publicidade. As permutas ocorreram em 87 e 88, quando Sarney era presidente, informa Elvira Lobato. Em discurso no Senado na quarta, Sarney criticou o "Jornal do Brasil" por propor a troca de anúncios por dívidas com o BB.

Publicado na Folha de S.Paulo, sábado, 20 de novembro de 1993

TV da família Sarney usou artifício condenado por ele

Empresa pagou dívida no BB com anúncios, quando ele era presidente

ELVIRA LOBATO
Da Reportagem Local

A TV Mirante, de São Luis (MA), pertencente à família do senador e ex-presidente José Sarney, converteu empréstimos do Banco do Brasil em contratos de publicidade para veiculação de anúncios na emissora, em 1987 e 88, quando ele ocupava a Presidência da República. Em discurso no Senado, na última quarta-feira, Sarney criticou o "Jornal do Brasil" por propor a utilização de anúncios para quitar dívidas da empresa junto ao mesmo Banco do Brasil, em julho de 89.
Segundo reportagem publicada pela Folha no dia 6 de agosto de 88, a TV Mirante importou equipamentos do Japão, com financiamento do Banco do Brasil (que repassou uma linha de crédito aberta pelo Eximbank japonês) e foi autorizada a converter quatro parcelas do pagamento da dívida com anúncios publicitários do banco. A informação foi prestada, na época, pelo então diretor-geral da TV, José Aniesse.
O então superintendente regional do Banco do Brasil no Maranhão, Érico Furtado, confirmou, na ocasião, a autenticidade de uma autorização de troca de dívida por anúncios, no valor de CZ$ 21.995.000,00 (US$ 483.088,07 pelo dólar oficial), assinada no dia 28 de julho de 87. A autorização foi dada pelo então superintendente-adjunto regional, Antônio Luiz Ewerton Ramos.
Uma segunda autorização, de 9 de março de 88, no valor de Cz$ 13.627.236,00 (US$ 131.715,45 pela cotação oficial do dia), foi assinada pelo ex-chefe-adjunto de Comunicação Social da Presidência do Banco do Brasil, Ney Curvo, e confirmada pela assessoria de imprensa da instituição.
O diretor geral da TV, José Aniesse, afirmava na reportagem que o empréstimo para a compra dos equipamentos foi "de uns US$ 250 mil", mas só as duas parcelas convertidas em anúncios somaram US$ 614.803,09, pela cotação oficial das datas das autorizações.
A TV Mirante é administrada por Fernando Sarney, único dos três filhos do senador que não tem carreira política. Ontem à tarde, ele não se encontrava na empresa, e a Folha foi atendida pelo atual diretor-geral, Sérgio Macedo, que afirmou desconhecer a troca do empréstimo por anúncios.
O deputado José Sarney Filho (PFL-MA) disse à Folha que o recurso utilizado pela emissora de sua família não pode ser comparada à proposta do "Jornal do Brasil", denunciada por seu pai. "Eu desconheço esta operação entre o Banco do Brasil e a TV Mirante, mas se ela ocorreu é porque foi aprovada pelas áreas competentes do BB e teve parecer favorável dos departamentos técnico e jurídico. Meu pai não tomou conhecimento, porque não era assunto para ser levado ao presidente da República", declarou. Para Sarney Filho, a operação revelada pela Folha não deu prejuízo aos cofres públicos e foi "lícita".
Saulo Ramos, advogado do senador José Sarney, ficou constrangido ao tomar conhecimento do fato. Antes de saber do caso, ele afirmou à Folha que a proposta feita pelo "Jornal do Brasil" em 89, de trocar US$ 17 milhões de dívidas por publicidade, era "imoral" e manteve o seguinte diálogo com a reportagem:
Folha: A imoralidade, a seu ver, está no valor da transação? Se ele propusesse trocar US$ 500 mil de dívidas em anúncios o senhor consideraria igualmente imoral?
Saulo Ramos: Não importa o valor, a proposta de trocar dívida por publicidade é que é imoral.
Folha: Estou com cópia de uma reportagem da Folha, de 88, e pelos valores constantes da matéria, a TV Mirante, da família Sarney, pagou mais de US$ 500 mil de dívidas no Banco do Brasil com publicidade. Ela também foi imoral?
Saulo Ramos: Se o fato é verdadeiro, também foi imoral.


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