MDB ALCANÇA UM TERÇO DA CÂMARA E AINDA AVANÇA


Publicado na Folha de S. Paulo, terça-feira, 19 de novembro de 1974


Os novos resultados das apurações em todo o País, divulgados ontem nas capitais de Estados, confirmam a conquista, pelo MDB, de mais de um terço das cadeiras na Câmara dos Deputados e abrem perspectivas de que o partido da Oposição vá além de 40%, o que deixa intranquilo o comando nacional da Arena, em Brasilia.
Em São Paulo, já não há mais dúvidas de que o MDB conquistou mais de metade dos votos e passará a ser maioria na Assembléia Legislativa. Essa inversão de posições foi o tema central nos comentários dos meios politicos paulistas, entendendo muitos representantes de um e de outro partido que terá de haver um entendimento de alto nível entre a Oposição e o novo governo.
O senador Franco Montoro, que é apontado como um dos grandes vitoriosos do pleito do dia 15, no plano nacional, repeliu ontem, embora em termos não muito ásperos, as primeiras propostas que já surgiram em seu partido, de participação no futuro governo de São Paulo.
Ele se referia, sem mencioná-las, a declarações feitas por alguns candidatos emedebistas, entre os quais o sr. Aurélio Campos, segundo as quais a Oposição pode indicar alguns de seus membros para fazer parte da administração Paulo Egidio, se este assim o entender.
Montoro disse que a colaboração, bem como a ação fiscalizadora do MDB, deve exercer-se ao nível do Poder Legislativo, sem participação do governo. Ele desenvolvera a mesma tese durante a campanha.

"Nenhum problema no Rio"

Da Sucursal de Brasilia

O governador designado do Estado do Rio, almirante Faria Lima, disse que não encontrará dificuldades para governar um Estado cuja assembléia seja majoritariamente oposicionista. Não será a primeira vez que isto acontece em um regime democrático, acrescentou.
Faria Lima foi recebido ontem pelo presidente Geisel em audiência que durou cerca de uma hora, para tratar, segundo ele, exclusivamente de assuntos relacionados com a fusão Guanabara-Estado do Rio.
Indagado sobre os problemas que poderá enfrentar a partir do dia 15 de março, diante do quadro politico do novo Estado, o governador disse que não terá dificuldades, pois acha que as medidas que vierem em benefício do povo, não importando que sejam propostas por Arena ou MDB, deverão ser aprovadas.

Evitar que a vitoria do MDB se transforme em derrota

Brasilia (Sucursal) - "O importante é não transformar essa vitoria relativa do MDB - e que, no fundo, não deixa de ser uma vitoria politica do governo - numa derrota futura, de consequencias imprevisiveis."
O comentário, feito ontem por fonte altamente responsável do Sistema, teve o merito de desfazer o clima de boatos que vinha tomando conta dos meios politicos e, ao mesmo tempo, ensejar um importante ponto de reflexão.
Desdobrada a frase, que não foi pronunciada ao acaso, mas em meio a uma serie de considerações sobre o momento brasileiro, sobressai a clara advertencia: o governo acata, em sua plenitude, o resultado da votação de sexta-feira passada, porem não admitirá que a livre manifestação da vontade popular seja desvirtuada par fins de contestação ao regime.

Julgamento

Para o mesmo porta-voz, a votação de 15 de novembro não representou um julgamento da Revolução e muito menos do governo Geisel, pelo que fez nestes primeiros oito meses.
Entre muitos aspectos, acha que pode ser entendida como uma manifestação de descontentamento diante da crise economica que atingiu o Pais - e o mundo - nos ultimos tempos. Tal como aconteceu recentemente nos Estados Unidos, embora neste pais tambem pesasse muito na balança o episodio Watergate.
"Não se diga que o povo votou contra o Ato Institucional, porque isso não é verdade; votou sim, contra o custo de vida, o alto preço dos generos alimenticios e outras consequencias do processo inflacionario" - acrescentou.

As causas

Mas tambem identifica causas de natureza politica para explicar a derrota da Arena, as quais, no seu entender, devem ser imediatamente analisadas pela direção do partido, a fim de evitar a repetição do fato nas eleições de 78.
Entre elas, "a excessiva confiança com que escolheu seus candidatos, sem se preocupar com as bases eleitorais"; a "falta de engajamento de alguns governadores na campanha, o que enfraqueceu a posição dos candidatos", e "as divisões internas do partido, gerando acentuados desgastes politicos".
O porta-voz acha que ainda é muito cedo para se falar em consequencias politicas, mas reconhece como viavel, "em futuro não muito distante", a reformulação das atuais lideranças arenistas, deixando implicito, assim, que na avaliação dos erros cometidos nesta campanha eleitoral, uma parcela de culpa está sendo imputada aos dirigentes do partido.

As surpresas

A mesma fonte admite que o resultado trouxe surpresas para o governo, mas não na dimensão que alguns pretendem dar. Garante que nos dias que precederam a eleição, o governo já estava de posse de relatorios que apontavam como provavel a vitoria oposicionista em São Paulo, Rio Grande do Sul, Pernambuco, Ceará e Minas Gerais, esta ultima previsão reafirmada em relatorio pessoal feito ao presidente Geisel, às vésperas do pleito, pelo governador eleito do estado, sr. Aureliano Chaves.
Segundo o informante, as duas grandes surpresas para o governo, ficaram por conta das urnas do Paraná e do Rio Grande do Norte, onde as pesquisas oficiais apontavam o favoritismo não confirmado, dos candidatos da Arena. Admitiu, no entanto, que embora esperada, a vitoria da oposição chegou a surpreender pela grande diferença de votos, sobretudo em Minas e Pernambuco.

Não muda

Embora reconhecendo que o resultado do pleito poderá provocar mudanças politicas, o porta-voz é taxativo ao dizer que o governo não vai alterar seus programas administrativos por causa da vitoria oposicionista.
"O presidente Geisel está convencido do acerto de suas posições diante dos problemas maiores do pais e não pretende desviar-se das diretrizes definidas em seus planos administrativos. Ninguem melhor do que ele sabe que o INPS ainda não funciona a contento, que o acesso ao credito ainda está dificil e que há muita gente passando fome no Nordeste. Mas a estrategia para enfrentar tais problemas já está definitiva e não será alterada"- acrescentou.
Admite, porem, que as urnas possam vir a indicar a necessidade do aperfeiçoamento de determinadas politicas setoriais. Se isso ocorrer, garante, o governo está disposto a aceitar qualquer contribuição, venha de onde vier, desde que seja para melhor.

Um passo

O porta-voz governamental está convencido, igualmente, de que as eleições de sexta-feira representam "um gigantesco passo" em direção à chamada abertura politica, que diz ser um proposito do governo Geisel.
Por isso, explica, o empenho do presidente para que as eleições transcorressem em clima de segurança absoluta, garantindo-se ampla liberdade de manifestação a todos os candidatos.
Agora, entende, outros passos precisam ser dados com o mesmo objetivo. Entre eles, a conscientização, pelos politicos, de que o ideal pode ser atingido sem excessos, com cautela e sem fustigar o regime.

Silencio

Os ministros politicos do governo não quiseram, ontem, fazer comentarios sobre as eleições, alegando que preferem aguardar o resultado oficial.
O ministro armando Falcão passou a maior parte do tempo em seu gabinete, com a luz vermelha na porta, sinal de que ali não podiam entrar nem mesmo seus assessores diretos. A unica coisa que se soube é que o ministro estava recebendo normalmente informações da Policia Federal sobre a marcha da apuração nos Estados.
O ministro Ney Braga, da Educação, que inclusive participou da campanha no Paraná, passou a manhã em casa, estudando projetos a serem apresentados na proxima reunião do Conselho de Desenvolvimento Economico. Por um assessor, ele forneceu aos jornais apenas um comentario sobre a eleição no seu Estado: "ganhar ou perder é uma decorrencia do processo eleitoral".


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