MAIORIA QUER CONSTITUINTE EM 85


Publicado na Folha de S. Paulo, domingo, 16 de dezembro de 1984


A maioria da população brasileira quer uma Constituinte, já em 1985, para alterar de forma substancial a Constituição. Pesquisa efetuada pela Folha em São Paulo, Rio, Belo Horizonte, Porto Alegre, Salvador e Curitiba indica que 62,2% dos entrevistados favoráveis à Assembléia Nacional Constituinte preferem que ela seja convocada imediatamente após a posse do presidente a ser eleito no Colégio Eleitoral, a 15 de março. Outros 11,1% defendem a convocação para novembro de 86, junto com a eleição de deputados, senadores e governadores. E 10,5% querem votar a Constituinte em novembro de 86, desde que junto com a eleição do presidente da República. Apenas 5,7% não manifestaram opinião. Indagados se a Constituição brasileira deve ser substancialmente modificada, 58,6% dos entrevistados responderam sim e 16,3% disseram não.
"Tecnicamente, em termos de racionalidade política, em termos de ciência política, só em 86 teremos condições de convocar uma Constituinte", disse ontem à Folha o candidato indireto Tancredo Neves, pouco depois de chegar em Aracaju (SE), para o último comício de sua campanha à Presidência.

EDITORIAL - 1985 Posse, Diretas e Constituinte

Tantos têm sido os compromissos e condicionamentos a servir de contraponto para a transição vivida pelo País rumo à democracia, que esta parece ao mesmo tempo cada vez mais ao alcance da mão e nunca se tornar real. Desde que se passou da vigorosa urgência manifestada durante a campanha das diretas-já ao gradualismo, travado de renitências, posterior à rejeição da emenda Dante de Oliveira, o controle do processo político - como se praticamente nada tivesse acontecido - voltou a se fazer restrito às cúpulas partidárias e dependente do acordo para o qual convirjam.
É entretanto desejo dos cidadãos que a democracia no País venha já, sem ressalvas nem hesitações, e que o próximo governo se cubra de uma indispensável e efetiva legitimidade popular. Nisto se baseia a proposta lançada pela Folha em editorial de 15 de novembro, de que o novo Presidente convoque eleições diretas logo após a posse e delas participe.
O problema da democracia brasileira não se esgota, contudo, na eleição presidencial. Para que se instaure não só um governo legítimo, mas uma realidade inequivocamente democrática; para que se origine das urnas não só um governo capaz de enfrentar corajosamente as graves dificuldades existentes no campo social e econômico, mas uma ordenação estável das relações entre os cidadãos, e entre estes e o Estado, impõe-se a convocação de uma Assembléia Nacional Constituinte, pronta a dar forma acabada, clara e permanente a um real impulso da sociedade rumo à democracia. Este se mostra, tantas foram as tergiversações, ainda adstrito ao ritmo incerto das conveniências entre as facções hegemônicas, ainda preso às indecisões da imaturidade, ainda não fortalecido por um texto legal que fosse acatado como coroamento da estrutura institucional do País.
Tem sido posição deste jornal desde janeiro de 1980 a luta pela Constituinte. Mais do que nunca impõe-se convocá-la, no ocaso do regime autoritário. Não se pode manter o povo brasileiro frustrado em sua expectativa de democracia, nem a Nação paralisada como por encanto diante de uma promessa ainda longínqua, a que não se lança de frente para cumprir.
Que o novo Presidente proponha ao Congresso eleições para a Constituinte o mais breve possível, fazendo-as coincidir ainda em 1985 com as eleições presidenciais. Que transcorra, entre a posse e as eleições, apenas o tempo estritamente necessário para as mudanças que a formação de uma Constituinte de fato livre e representativa exige. Referimo-nos à Instituição da mais ampla liberdade de organização partidária; também a legislação eleitoral deverá evitar os abusos do poder econômico, assegurar o livre acesso aos meios de comunicação e reformular os critérios de representação dos diversos Estados, ajustando-a a seu peso populacional. Até que seja promulgada a nova Carta, espera-se do Presidente que não governe fazendo uso dos mecanismos autoritários ainda em vigor no País. Desse modo, o próximo Congresso, eleito em 1986, não precisará sobrepor a sua tarefa legislativa ordinária à elaboração do novo texto constitucional. Que se reúna já no gozo de suas atribuições normais, pronto a exercer o papel que dele se exige nas democracias. Assegurado o direito dos atuais parlamentares a concorrer para a Assembléia Constituinte, sem prejuízo de seu cargo no Congresso (do qual apenas se afastariam provisoriamente, caso eleitos), far-se-á assim completa a transição para a democracia.
Não há razão cabível para que por mais tempo se negue aos brasileiros a plena posse de si mesmos.
Não precisam, não querem e não podem esperar mais.



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