JK RECUSA-SE A FALAR E PODE SER CONFINADO
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Publicado
na Folha de S.Paulo, terça-feira, 12 de setembro de
1967
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Neste texto foi mantida a grafia original
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As ultimas horas de ontem já se esperava em Brasilia uma medida
oficial condenando ao confinamento o sr. Juscelino Kubitschek.
O ex-presidente,
chamado a depor ontem de manhã, perante o Departamento de
Polícia Federal, na Guanabara, recusou-se a responder às
perguntas sobre sua participação nas negociações
para a constituição da Frente Ampla e sobre a sua
presença na reunião, realizada na residencia do deputado
Renato Archer, limitando-se a entregar ima declaração
escrita.
A ordem
para que o sr. Kubitschek fosse ouvido partiu do proprio presidente
Costa e Silva, e não do ministro da Justiça, como
se divulgara anteriormente.
Nos
meios informados de Brasilia, acreditava-se ontem à noite
que a medida de confinamento poderia ser dada ainda hoje, data do
aniversario do ex-presidente e vespera de seu embarque para os Estados
Unidos.
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Juscelino
não fala na Polícia: meu silencio é arma de protesto |
RIO, 11 (FOLHA) - Só as 10 horas da manhã de hoje
o presidente da Republica resolveu autorizar o ministro da Justiça
a intimar o sr. Juscelino Kubitschek a depor na Polícia Federal
carioca, para confirmar ou negar sua participação na
reunião realizada na residencia do deputado Renato Archer,
na qual foi lançada a Frente Ampla. Assim mesmo, segundo informações
de senadores da ARENA, o marechal Costa e Silva relutou muito antes
de tomar a decisão, e só fez depois de ouvir diversos
assessores.
A ordem
para intimar o ex-presidente chegou ao conhecimento do delegado
regional do Departamento de Policia Federal na Guanabara, general
Luís Carlos Freitas, às 17° horas de sabado, em
forma de oficio do coronel Florimar Campelo, diretor do DPF em Brasilia.
Antes que a decisão fosse dada a conhecer ao ex-presidente,
uma pessoa do governo, ligada ao sr. Renato Archer, com ele se reuniu
para propor que o sr. Kubitschek concordasse em prestar o depoimento
em sua propria residencia, reservada e comodamente, sem a presença
de jornalistas. O sr. Juscelino Kubitschek, consultado, repeliu
a proposta, dizendo que o assunto não poderia ser tratado
na clandestinidade, e dispunha-se a comparecer à sede da
Policia Federal atendendo à intimação.
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O
interrogatorio |
Ainda no domingo, o sr. Kubitschek comunicava ao seu advogado, sr.
Sobral Pinto, que não responderia a nenhuma das indagações
feitas no questionario, do qual tivera conhecimento antecipado. Iria
limitar-se a entregar ao delegado da Policia Federal uma declaração
por escrito o que fez às 10 horas de hoje.
O general
Luis Carlos Freitas, no entanto, insistiu para que o ex-presidente
respondesse "sim" ou "não" às
indagações. A primeira referia-se à sua presença
na reunião realizada em casa do sr. Renato Archer e a segunda
sobre sua participação ou não na Frente Ampla.
O sr. Kubitschek reafirmou que nada tinha a responder alem do que
constava na declaração escrita.
Sempre
com tom cordial, o general ofereceu um cafezinho, que o ex-presidente
aceitou. Depois voltou a insistir com o sr. Kubitschek, mostrando-lhe
uma serie de artigos de jornais e indagando se o ex-presidente havia
tomado conhecimento deles. O sr. Kubitschek disse que sua resposta
estava contida no documento, que já havia sido tomado a termo,
e retirou-se sem qualquer constrangimento.
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A
declaração |
"A Nação é testemunha do meu comportamento
em face da atual situação brasileira.
"Há
cerca de três anos venho sendo vitima de violencias e perseguições
armadas com o proposito de tentar justificar perante o povo a cassação
dos meus direitos politicos.
"Fiel
a uma tradição de equilibrio e tolerancia que sempre
pautou meus atos, suportei com grande sacrificio humilhações
incompativeis, pelo menos com o respeito que deve merecer um ex-chefe
de Estado.
"Enquanto
vivi no exilio, razões não me faltavam para comentar
a situação politica do meu país. Não
obstante fiel a uma diretriz que a mim mesmo impus, soube dominar
naturais ressentimentos, só mostrando os aspectos positivos
do Brasil nas centenas de conferencias que pronunciei nas universidades
dos Estados Unidos e Europa.
"Entendi
que somente assim contribuiria para evitar pretextos de maiores
provações para o povo brasileiro.
"Só
por isso compareci a todos os orgãos criados para investigar
os atos do meu governo, da minha vida publica e até das minhas
atividades particulares.
"Com
o advento do atual governo resurgiu em nosso país a esperança
do completo restabelecimento da ordem politica e juridica, tendo
em vista, sobretudo, os pronunciamentos que a esse respeito foram
feitos pelo presidente da Republica, reconhecendo a imperiosa necessidade
do congraçamento da familia brasileira.
"Com
o evidente e unico objetivo de cooperar para esse esforço
e sempre infenso a qualquer ressentimento, fiz declarações
no Exterior apelando invariavelmente para a pacificação
nacional.
"E
aqui no Brasil, após o meu regresso, sempre inspirado pelo
desejo de contribuir para a paz, mantive-me em completo silencio.
"Tenho,
pois, a consciencia de que, hoje, como no passado, nunca faltei
ao imperativo de promover o entendimento do povo brasileiro.
"Não
vejo razão assim, para que novamente desencadeiem contra
mim medidas vexatorias que a minha posição de ex-chefe
de Estado por si só repele.
"E
desde que não querem respeitar essa condição
que pertence mais ao Brasil que a mim mesmo, resolvi aqui comparecer
por deferencia às autoridades.
"Mas,
segundo me faculta a lei, decidi não responder às
indagações que me fossem feitas.
"O
silencio é a unica arma de protesto de que disponho no momento".
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Frente
não se intimida |
O sr. Carlos Lacerda que permaneceu fora do predio da Policia Federal,
na rua da Assembléia, ao lado do deputado Renato Archer, enquanto
o ex-presidente lá estava, declarou que nada conseguiria intimidar
os dirigentes da Frente Ampla, movimento destinado a forçar
a redemocratização do pais, "não por meios
subversivos, mas pelo esclarecimento constante do povo, pela mobilização
popular".
Disse
ainda que "a condição de cidadão brasileiro
não pode ser abolida por simples decretos"; que ainda
não fôra chamado a depor e "estava ali somente
para saber noticias de Juscelino"; que a Frente Ampla já
estava nas ruas, o que provava a presença dos jornalistas
ali.
Afirmou,
também, que o ato mais positivo de Juscelino em seu governo
"foi enfrentar o Fundo Monetario Internacional que hoje, quando
mais não seja, está servindo de motivação
para uma limpeza em regra da Guanabara, em virtude de sua proxima
reunião, no Rio, o que é bom".
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Opinião
de Josafá |
O senador Josafá Marinho, por seu turno, classificou a intimação
do ex-presidente de violencia contra a propria Constituição.
Sustentou a tese de que os Atos Institucionais já não
estão em vigor, e por isso os cassados ficam sujeitos apenas
à Lei Organica dos Partidos, que lhes impede votar e ser votados,
e à Constituição, que lhes garante o direito
de ir e vir e apenas admite o confinamento em caso de estado de sitio.
Segundo o constitucionalista do MDB - um dos dirigentes da Frente
Ampla - o governo não tem condições legais para
impedir que o sr. Kubitschek, como cidadão, visite a residencia
do sr. Renato Archer ou a de qualquer um de seus amigos.
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