TAYLOR PEDE TROPAS DO BRASIL PARA O VIETNÃ


Publicado na Folha de S.Paulo, sexta-feira, 12 de março de 1965

Neste texto foi mantida a grafia original

RIO, 11 - O embaixador norte-americano no Vietnã do Sul, general Maxwell Taylor, através do ex-embaixador em Bangcoc (Tailandia), sr. Antonio Roberto de Arruda Botelho, encaminhou ao Itamarati um pedido formal para o envio de tropas brasileiras ao sudeste asiatico, segundo informou hoje alta fonte do Ministerio do Exterior.
O atual embaixador na Tailandia, sr. Nelson Tabajara de Oliveira, cuja jurisdição abrange o Vietnã, afirmou que "é uma honra para qualquer pais entrar na luta do Vietnã, unindo-se aos Estados Unidos contra o comunismo internacional" e acrescentou que, se o governo aprovar o embarque das tropas - "talvez contingentes de fuzileiros navais" - pedirá ao Itamarati para mudar a embaixada brasileira de Bangcoc para Saigon, no Vietnã do Sul.
O embaixador Nelson Tabajara de Oliveira manifestou a "certeza de que as forças brasileiras influirão decisavamente no resultado da luta contra os guerrilheiros vietcongs, pois, nos 4 anos que serviu em Israel, sempre ouviu elogios às tropas nacionais, feitos por oficiais da brigada militar judaica, a cujo lado combatemos".
Acrescentou que a participação dessas forças na faixa de Gaza foi decisiva para debelar a crise na fronteira Egito-Israel. E "no Congo, os aviadores brasileiros prestaram serviço inestimavel à democracia" - disse ainda.
Observa-se, a proposito, que as tropas brasileiras que permaneceram em Gaza faziam parte de um contingente das Nações Unidas que interveio no conflito arabe-israelense, como tambem constituiram contingente da ONU os aviadores brasileiros que serviram no Congo, recentemente. No caso do Vietnã não existe intervenção das Nações Unidas.
O contra-almirante Heitor Lopes de Sousa, comandante do Corpo de Fuzileiros Navais, disse hoje à reportagem que desconhece entendimentos no sentido de serem enviadas tropas sob seu comando para o Vietnã do Sul. Afirmou porem, que os fuzileiros navais estão prontos para entrar em ação a qualquer momento e em condições de embarcar para qualquer parte do mundo num prazo de 24 horas.

Vietnã: Costa e Silva é o maior adversario do envio de tropas

RIO - O principal adversario do envio de tropas brasileiras para o conflito no Vietnã é - dentro do governo - o proprio ministro da Guerra, general Artur da Costa e Silva. O ministro da Guerra comunicou à imprensa que, na sua proxima viagem aos Estados Unidos, não cuidará desse problema. E foi mais longe ao deixar claro que tropas brasileiras não participarão desse conflito no sudeste da Asia.
Sabe-se nos meios politicos, que o ministro da Guerra, ao fazer tais declarações, visa evitar que as autoridades militares norte-americanas procurem discutir o problema com ele, em Washington. Nos meios militares, admite-se que o convite ao general Costa e Silva, feito pelas autoridades norte-americanas, tem como um dos objetivos conseguir a anuencia do ministro da Guerra brasileiro para que forças brasileiras sejam utilizadas no Vietnã.
Há mais de tres meses que, prevendo a hipotese de um agravamento da situação no Vietnã, as autoridades diplomaticas norte-americanas iniciaram sondagens, junto as chancelarias dos paises da America Latina, no sentido de obter uma clara manifestação de solidariedade para com os Estados Unidos. Apesar dos desmentidos oficiais, tanto do Departamento de Estado quanto de varias chancelarias - inclusive da brasileira - as sondagens foram feitas, sem muito exito.

Sondagens

Os meios diplomaticos argentinos foram os primeiros a admitir que tais sondagens foram iniciadas. O mesmo aconteceu na Venezuela. Mas a chancelaria brasileira, depois de comunicar o assunto ao presidente Castelo Branco, ficou à espera de uma opinião do Estado-Maior das Forças Armadas. O presidente consultou o EMFA, então chefiado pelo general Peri Bevilaqua. E o general Peri consultou os ministros militares. Para surpresa geral, o ministro da Guerra deu parecer contrario a essa remessa de tropas.
As sondagens iniciais junto às autoridades brasileiras, foram feitas pelas autoridades norte-americanas em nome do governo do Vietnã do Sul. Vale a pena esclarecer que os militares norte-americanos, que vieram no Vietnã, agem como assessores ou instrutores das forças vietnamitas. Qualquer contingente brasileiro teria o mesmo "status" das forças norte-americanas. Esse fato foi o que mais dificultou qualquer negociação positiva, uma vez que o Brasil não está em guerra com qualquer país. Por outro lado, não há nenhum instrumento juridico interamericano que obrigue o Brasil ou qualquer outra nação do continente a enviar força em apoio dos assessores norte-americanos no Vietnã. E - como se tudo isso não bastasse - as tropas norte-americanas que operam naquele país do Sudeste da Asia não têm mandato nas Nações Unidas. Muito pelo contrario, a secretaria-geral das Nações Unidas, através do embaixador U Thant, deixou claro que as possibilidades de uma intervenção da ONU no Sudeste da Asia são remotas.

Martini apoiou

As solicitações norte-americanas foram no sentido de que o Brasil enviasse um pequeno contingente de paraquedistas do Exercito. É interessante notar que o ministro da Guerra se opôs a essa providencia, mas que o ministro da Marinha, almirante Paulo Bosisio, teve ponto de vista discordante. Na Marinha, atualmente, existe uma forte corrente de oficiais superiores, chefiada pelo almirante Levi Pena Aarão Reis, que é favoravel ao envio de unidades da esquadra ou de contingente de fuzileiros navais - os unicos soldados profissionais que há no Brasil. Mas as autoridades norte-americanas não pediram fuzileiros navais ao Brasil.
No entanto, o almirante Luís Martini, ao assumir a chefia do EMFA, fez um discurso que todos os meios politicos consideraram favoravel ao envio de tropas brasileiras para o Vietnã. E como o almirante Martini, ex-diretor da Escola Superior de Guerra, é considerado como sendo o unico oficial-general da Armada que tem vinculações estreitas com o grupo militar chefiado pelo presidente Castelo Branco - o chamado grupo da Sorbonne - admitiu-se que o seu discurso representasse o pensamento do proprio chefe do governo.
Mas o general Costa e Silva, com a divulgação do seu ponto de vista contrario ao envio de tropas, colocou-se em divergencia com o almirante Martini. Acredita-se, no entanto, que a sua opinião seja a que prevalece no Exercito, sobretudo no Alto Comando, até mesmo porque muitos chefes militares consideram que qualquer providencia nesse sentido só trata impopularidade ao governo.

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