SOLIDÁRIA COM LULA A CENTRAL NORTE-AMERICANA


Publicado na Folha de S.Paulo, quinta-feira, 12 de fevereiro de 1981

A central norte-americana AFL-CIO manifestou ontem, em Washington, "completa solidariedade" a Luiz Inácio da Silva, Lula, e aos outros doze líderes sindicais do ABC. Dirigentes da AFL-CIO estudam a possibilidade de enviar uma delegação a São Paulo para acompanhar o julgamento.
Lula chegou ontem a Washington procedente de Nova York. Além de reunir-se com os dirigentes sindicais norte-americanos - dos quais ouviu que seu julgamento "colocará à prova a abertura do presidente Figueiredo" - foi recebido por um grupo de deputados no Congresso.

Lucros e perdas

A data previamente divulgada para o julgamento dos treze líderes sindicais do ABC não foi confirmada pelo juiz auditor, que não tem previsão sobre o prazo que empregará no exame do processo. O fato é indicador a mais da intensa politização de um conflito sindical, decorrente da utilização política, pelo governo, do arsenal de leis de exceção a seu dispor.
De fato, a data de 16 de fevereiro, amplamente divulgada no exterior por ocasião da viagem do principal líder sindical enquadrado na Lei de Segurança Nacional. O sr. Luiz Inácio da Silva, tornara-se a senha para um encontro, no Brasil, de personalidades e líderes trabalhistas de diversos países. Advertidas das alegações do processo - que se resumem à incitação à greve - e surpresas com uma legislação que considera propaganda subversiva a ação sindical, essas organizações trabalhistas e outras associações de cunho humanitário resolveram assistir ao julgamento como meio de pressão moral da opinião internacional. A não confirmação da data de 16 de fevereiro, se não tem a intenção, ao menos tem o efeito de dificultar a articulação dessa forma de manifestação internacional.
Por outro lado, também tem sido intensa a politização do enquadramento dos 13 do ABC por parte do Partido dos Trabalhadores, cujo presidente nacional encabeça a lista dos réus nesse processo. De tal modo que não apenas se multiplicam as manifestações de protesto, como também a denúncia de LSN e a luta por sua extinção tornaram-se o ponto central do programa daquele partido.
Tudo isso não ocorreria, entretanto, não tivesse o governo decidido explorar politicamente a derrota dos metalúrgicos do ABC em sua última greve. De fato, após a aceitação da última proposta patronal, não se contentou em manter a intervenção nos sindicatos da região, afastando definitivamente suas lideranças. Além de empregar essa medida de força, cuja legitimidade é amplamente contestável, por ferir a autonomia das organizações sindicais, o Executivo pediu o enquadramento de treze de seus líderes mais importantes na Lei de Segurança Nacional.
Os dividendos políticos dessa atitude são claros: por um lado, ocupa-se um partido de oposição - o PT - com a permanente e ingrata tarefa de salvaguardar a sobrevivência política de suas principais lideranças e de comprovar sua própria legitimidade dentro do sistema partidário. E, por outro lado, mediante adiamentos, atrasos e outras delongas processuais, pode-se manter "sub judice" o sr. Luiz Inácio da Silva, tornando-o inelegível e legalmente incapaz de participar de uma direção partidária.
Se são claros os dividendos políticos, são claros também os custos: a suspeição que artimanhas desse tipo levantam sobre a legitimidade das leis e a independência da justiça. Como se vê, nem sempre o lucro fácil e rápido compensa os custos a longo prazo e o bom nome na praça.

Nos EUA, Lula tem apoio da AFL-CIO e de parlamentares

WASHINGTON - A central sindical norte-americana AFL-CIO manifestou ontem sua "completa solidariedade" ao líder sindical e presidente do PT, Luís Inácio da Silva, Lula, tendo em vista o julgamento que deverá enfrentar juntamente com outros 12 sindicalistas do ABC incursos na Lei de Segurança Nacional. Os dirigentes da AFL-CIO prometeram também estudar a possibilidade de enviar ao Brasil uma representação para acompanhar o julgamento de Lula e "testemunhar seu apoio".
Lula chegou ontem a Washington procedente de Nova York, para cumprir a última etapa de uma viagem iniciada em janeiro por oito países da Europa, nos quais também obteve apoio e solidariedade. Seu programa em Washington iniciou-se com uma reunião com a diretoria da AFL-CIO.
Durante a reunião, o presidente do Instituto para o Desenvolvimento do Sindicalismo Livre, William Doherty, observou que o processo militar aberto contra Lula e outros 12 líderes sindicais "pode converter-se no julgamento político do governo brasileiro" e "colocar à prova a proclamada abertura política do presidente Figueiredo".

No Congresso

Lula reuniu-se em seguida com uma delegação do Congresso norte-americano, liderada pelos deputados democratas Walter Fautroy e John Seiberling. Líder do bloco negro no Congresso, Fauntroy ofereceu seu apoio a qualquer iniciativa em favor dos sindicalistas brasileiros, afirmando que "não deixaremos passar esta oportunidade para fazer ver que o povo norte-americano continua preocupado com o respeito aos direitos humanos".
Maurice Papper, presidente da entidade privada Fundo para Novas Prioridades, participou da reunião e sugeriu que uma representação do Congresso norte-americano seja enviada ao Brasil para manifestar ao governo sua "preocupação tanto pelo julgamento em si como pela falta de liberdade sindical em geral".
Para Lula, "a solidariedade do povo dos Estados Unidos é mais importante que a do governo do presidente Ronald Reagan. O povo norte-americano - acrescentou - deve demonstrar-lhe que ele (Reagan) não é o presidente do mundo e que algumas de suas primeiras medidas fizeram com que muitos começassem a se arrepender de ter votado nele".
Lula disse que a política de direitos humanos do ex-presidente Jimmy Carter "melhorou muito a situação destes direitos em vários países da América Latina".
Segundo Lula, há muita semelhança entre as lutas dos operários poloneses e brasileiros. "Nossas condições e reivindicações são, e muitos casos, idênticas: lutamos pela liberdade sindical, redução da jornada de trabalho, garantia de emprego e, por fim, melhores condições de vida". A diferença a seu ver, "está na relação dos regimes: enquanto que na Polônia o governo preferiu ceder, no Brasil o governo decidiu massacrar os trabalhadores".
Lula e seus companheiros - Jacó Bittar, secretário-geral do PT e presidente do Sindicato dos Petroleiros de Campinas e Paulínia; Francisco Weffort, membro suplente da Executiva Nacional do PT e José Alvaro Moisés, da Secretaria de Relações Internacionais do partido - viajaram ainda ontem à noite para Detroit, onde haveria um encontro com o presidente do sindicato dos trabalhadores na industria automobilística norte-americana, Douglas Fraser, bem como com dirigentes sindicais canadenses. Hoje Lula inicia sua viagem de retorno ao Brasil devendo chegar amanhã em São Paulo.

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