EDITORIAL —
PÉSSIMO


Publicado na Folha de S.Paulo, domingo, 12 de agosto de 1984



O presidente Figueiredo colheu ontem os resultados da atitude errática que vem adotando ao longo do processo que conduzirá à sua sucessão em março do ano que vem. Abandonado ao jogo de suas forças internas e afastado da opinião pública com a qual rompeu desde a campanha popular pelas diretas-já, o PDS acaba de assistir à vitória da facção que reúne hoje os atributos que faltavam ao partido como um todo: coesão, determinação e energia. Onde se lia PDS ou "partido do João", leia-se partido do sr. Paulo Maluf. Nas próximas semanas a opinião pública saberá em que medida o agora candidato oficial conseguirá reter parte das forças que desertam o barco da agremiação. As evidências indicam que essa tarefa será onerosa e de sucesso restrito. Partidários do postulante derrotado Mário Andreazza se mostram reticentes quanto a eventuais acordos com o vitorioso de ontem e os chamados liberais do partido já têm compromissos selados e em andamento com o candidato oposicionista Tancredo Neves, cujo nome deverá ser homologado hoje na convenção do PMBD. As consequências são desastrosas. O PDS apresentará no desmoralizado Colégio Eleitoral uma candidatura sem respaldo na opinião pública e com sustentação estreita na própria base de apoio do governo. Uma candidatura estigmatizada pela utilização de métodos que oscilam entre a intimidação truculenta e o comércio desabrido de favores, prerrogativas, cargos. Um candidato sobre o qual paira uma nuvem de suspeita e receio. Desaparece na prática a estrutura partidária artificialmente criada pelo processo de abertura "lenta, gradual e segura", para surgir em seu lugar um campo de batalha em que as mais diferentes nuançes do especto político passam a se agrupar em torno de dois blocos inconciliáveis, numa disputa indereta a ser regida pelo vale-tudo de lado a lado. O presidente Figueiredo sustenta que sua posição permitiu que o partido escolhesse livremente. Uma coisa é assegurar a autonomia partidária; outra é ser conivente com a desorientação e a apatia que axiliam a ascenção dos mais ousados. Foi o que ocorreu. Um péssimo desenlace que inspira perspectivas péssimas.


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