MINAS JÁ ABANDONOU O RIO GRANDE DO SUL

O rebento andradino deu a entender, pelos seus jornaes, que não se sente mais disposto a supportar o peso dos gauchos

Publicado na Folha da Manhã, terça-feira, 11 de março de 1930

Neste texto foi mantida a grafia original

Não ha quem ignore que os alto-falantes do sr. Antonio Carlos, em terra paulista, são, entre outros, os orgãos do "consorcio". É através das suas columnas que o desastrado presidente de Minas se manifesta, é pelas columnas dessas folhas que ataca São Paulo e manda recados aos alliados, quando receia que o radio possa deturpar as suas communicações cifradas que para a "Noite" já não têm segredos...
Foi, pois, de um dos jornaes do "consorcio" que se serviu, hontem, para annunciar ao Brasil a sua attitude futura relativamente à successão presidencial, definitivamente liquidada pelas urnas, a 1ª do corrente. Ainda com as costas quentes e o espirito conturbado pela derrota soffrida e ansioso por não querer mais ouvir falar no liberalismo inventado pelo seu despeito, o frouxo rebento andradino deu a entender, claramente, que não se sente mais disposto a supportar o peso do Rio Grande. Está farto de sacrificios e de gymnastica. Minas governamental fizéra o que poucos paes fazem em pról dos filhos: déra ao sr. Getulio Vargas um instante de notoriedade, promptificando-se a indical-o à presidência da Republica. O sr. Getulio e o Rio Grande acceitaram o offerecimento, comparecendo às urnas ao lado de Minas. Os dois Estados, pois, cumpriram o seu dever. O compromisso assumido por Minas, porém, accentua o sr. Antonio Carlos, deve ser considerado extincto a 1º de Março. Terminou a sua actuação. Não mais lhe cabe tomar iniciativas. Por um excesso de generosidade, porém, não se desligará do alliado até que este que é o "dono da chapa da "Alliança Liberal" ensarilhe as armas na contenda que se abriu em agosto do anno findo". O Rio Grande é que "compete dizer em que terreno deseja a contribuição de Minas e da Parahyba". Minas, prosegue o sr. Antonio Carlos, "receberá a palavra de ordem dos gauchos, tomando o sector que os seus alliados riograndenses lhe indicarem", pois o "P.R.M. não deseja ter a iniciativa da nova forma que deverá tomar a lucta em torno da presidencia da Republica. Para elle, o sr. Getulio está eleito, competindo ao Rio Grande do Sul dizer aos seus alliados como deseja affirmar essa victoria".
Como se vê, o sr. Antonio Carlos declara, sem preambulos, terem cessado os seus compromissos, accrescentando, displicentemente, que poderá pagear ainda o sr. Getulio, com a declaração formal, porém, de que não deseja assumir responsabilidades. Minas não quer ter nada de commum com as loucuras que a bellicosidade do sr. Neves da Fontoura ou do sr. Oswaldo Aranha possa praticar. Para as montanhas, a missão está cumprida. Nestes longos sete mezes de agitação, o liberalismo carlista procurou desmoralizar o Brasil, lançando mão de todos os recursos ao seu alcance: arruinou as finanças mineiras com a compra de jornaes, de jornalistas, de partidos e de consciencias; atacou São Paulo; estimulou e praticou todas as fraudes; isolou o grande Estado do resto do Brasil; desmandou-se; chacinou adversarios; attentou contra a vida do vice-presidente da Republica; fez, em fim, tudo quanto era possivel fazer para desarticular a vida do Paiz. Agora bastava. A aventura custará caro de mais. O Rio Grande do Sul que se aguentasse sosinho e contente ficasse com o quarto de hora de notoriedade que à custa de Minas o sr. Getulio Vargas lograra conseguir, transformando-se, do dia para a noite, de bisonho administrador provinciano em pretendente a suprema magistratura da Republica.
É o que diz o sr. Antonio Carlos, pelas columnas noctivagas do "consorcio"... Mas, por não confessar publicamente a ruidosa derrota, o chefe da defunta "Alliança" declara que para o P.R.M., não para elle, o sr. Getulio está eleito, quando os resultados publicados pelos seus proprios orgãos attestam exactamente o contrario. Está eleito o sr. Getulio, mas deseja saber o presidente de Minas como o Rio Grande do Sul deseja "affirmar essa victoria". A saida, havemos de convir, é de um comico irresistivel. No Brasil, como em toda parte, um cidadão eleito é reconhecido e, depois, empossado. O sr. Antonio Carlos, entretanto, não pensa assim. Acha que o victorioso poderá limitar-se a affirmar a victoria com um sarau familiar, acompanhado de declamações e de numeros de canto. Mas o perfido politico não explicou bem a que victoria se quiz alludir. Deve ser, por certo, à victoria a que se apegam todos os derrotados: à victoria moral... E essa, não ha duvida, poderá ser affirmada com um jantar intimo, seguido de baile...
O ponto de vista, pois, do sr. Antonio Carlos deve ter deixado o sr. Getulio Vargas frio. Aliás, a victima da perfidia carlista já esperava por isso. O seu radio ao sr. Oswaldo Aranha bem revelou qual o seu estado de espirito. Desilludido pela votação de Minas, frisou o presidente gaucho: "se Minas não me tivesse falado nos seus quinhentos mil votos, não teria acceito a candidatura e estaria administrando tranquillamente o Rio Grande do Sul".
Agora, depois de tão duramente maltratado em terra mineira, vem o sr. Antonio Carlos avisal-o de que: os compromissos de Minas deixaram de existir a 1º de Março.
Esperemos pela resposta que a "Federação" dará à palavra carlista. O orgão official do situacionismo gaucho, interpretando o pensamento do sr. Getulio Vargas, dirá, por sua vez, que as ligações do Rio Grande do Sul com Minas tambem cessaram, submettendo-se os pampas à vontade das urnas que, para o bem do Brasil, se pronunciou pelo sr. Julio Prestes.

A situação politica de Minas
Como se votou no Estado do sr. Antonio Carlos
O descontentamento no seio do P.R.M
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BELO HORIZONTE, 10 - A Concentração Conservadora recebeu os seguintes telegrammas:
"Lavras - A policia estadoal, não satisfeita com a compressão desenfreada a insolente, antes e durante as eleições de 1º de Março, continua a praticar violencias neste municipio, naturalmente para afastar o eleitorado das urnas na lucta para a presidencia do Estado.
Diariamente são chamados à delegacia e desfeiteados os nossos correligionarios, que nenhum crime praticaram.
São falsas as informações do presidente do Estado de que as eleições correram livres, pois, após as mesmas, torna-se impossivel ao cidadão livre respirar.
No Estado de Minas campeia a mais insolita compressão, estando os nossos direitos e a nossa vida à mercê do odio da policia estadoal.
Pedimos a v. excia. providencias para que cessem essas violencias, que degradam a nossa civilisação. Respeitosas saudações. - (a.) Dr. Humberto Gusmão."
"Uberaba - Foi assassinado, no districto do Garimpó, o nosso correligionario Tobias Rodrigues de Souza, proprietario de pequeno sitio alli e exemplar chefe de familia, deixando na orphandade cinco filhos.
Tobias esteve presente, no districto do Garimpó, no dia da eleição, não podendo votar, porque fôra ameaçado de morte. A policia nenhuma providencia tomou a respeito. - (a.) João Henrique, José Corrêa e Aurelio Luiz da Costa."
"Itabira - Communico ao prezado amigo que as eleições em S. José da Lagôa, districto desta cidade, realisaram-se sob visivel pressão dos chefes locaes, que usaram de varios expedientes afim de amedrontarem os eleitores nossos correligionarios. Os recintos das secções foram invadidos pelos eleitores, que desrespeitaram as observações dos mesarios neste sentido.
Protesto energicamente contra as irregularidades naquelle districto. Em Cocaes e Conceição, municipios de Santa Barbara, as actas foram postas no correio cinco dias após o prazo legal. Em Itambé, municipio de Conceição, houve tiros e ameaças dentro do recinto onde se realisavam eleições. O meu fiscal alli, Milton Simões Vieira, escreveu-me que iriam votar alli alguns eleitores de Santa Maria, districto de Itabira, alistados tambem em Conceição.
Esses eleitores são: João Martins Vieira, Oscar Ferreira e Sebastião Coelho.
Protestando tambem contra essas irregularidades, peço ao prezado amigo tomar as providencias precisas. - (a.) Crisolie."

Um accordo entre o P.R.M. e a Concentração Conservadora?

RIO, 10 - "A Vanguarda" publica em sua primeira edição as seguintes considerações sobre a situação politica de Minas:
"Esperam-se serios acontecimentos no P.R.M. É, aliaz, uma consequencia logica do desenrolar da campanha politica. Nós, ha muito, dissemos que a situação estadoal tendia a complicar-se e o lançamento da candidatura Maciel servia apenas para desobstruir o caminho. Ella viveria o tempo necessario do preparo de outra; tanto assim, que chamamol-a a "emergencia". Não se póde mais occultar a crise latente nas hostes do P.R.M. Todos os proceres trabalham activamente pela recomposição do partido, trazendo à communhão as ovelhas desgarradas. Sentem a força politica da Concentração e não desejam manter a lucta. Cremos que nesse numero se acham os srs. Arthur Bernardes e Affonso Penna. Outro ponto, tambem importante, é que os mesmos não apoiam ideas revolucionarias. O sr. Antonio Carlos, porém, parece ainda resistir, dando causa à viagem do sr. Bernardes a Viçosa, como um aviso de que lhe retirará a solidariedade.
Mas, voltando ao accordo propalado, sabe-se que se baseia mais ou menos na seguinte forma: recomposição da executiva do P.R.M., com a volta dos elementos desistentes; divisão da bancada federal, fasendo a Concentração 18 deputados; retirada das candidaturas Maciel e Mello Vianna. Para presidente do Estado, será escolhido nome sympathico a ambos os grupos, tirado dos "jovens turcos". As negociações continuam activamente, muito embora à revelia do sr. Antonio Carlos, que terá de conformar-se com as deliberações."

A concentração conservadora apresentou um protesto ao juizo federal

BELO HORIZONTE, 10 - A Concentração Conservadora dará publicidade amanhã do protesto que apresentou ao juizo federal, contra as violencias praticadas nas proprias secções eleitoraes, contra os eleitores prestistas.
Como esse documento, a Concentração não visa apenas annunciar e chamar à responsabilidade criminal o presidente Antonio Carlos, mas deseja, principalmente, attrahir para o ambiente da politica official do Estado a attenção mais demorada dos brasileiros honestos, alem de permitir aos seus correligionarios a reparação que a sua dignidade e seu civismo merecem.

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