UNE DIZ QUE ENCERROU CONGRESSO
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Publicado
na Folha da S.Paulo, sexta-feira, 11 de agosto de 1967
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Neste texto foi mantida a grafia original
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O DOPS e a Policia federal resolveram reforçar ontem o dispositivo
de segurança que montaram para reprimir manifestações
estudantis, aumentando os efetivos e redobrando a prontidão
- mas o estudante Luís Travassos, presidente da União
Estadual dos Estudantes, anunciava à noite que o 29º Congresso
da entidade, proibido pelo governo, fora encerrado.
A UNE considerou encerrado o Congresso com o pequeno comicio-relampago
que conseguiu realizar ontem a tarde, na praça da Sé,
longe da atenção da Polícia, e no qual o presidente
Luís Travassos falou alguns minutos.
Todos os "carros de assalto" - 3 "tatus" e 2 "brucutus"
- foram colocados defronte do edificio do DOPS, no largo Gen. Osorio,
preparados para saida de emergencia, e 100 investigadores do Departamento
de Investigações foram requisitados para participar
do esquema de alerta. Nos quartéis da Força Publica,
tropas de choque e dezenas de viaturas permanecem em expectativa,
o mesmo ocorrendo nos setores da Guarda Civil, Radio Patrulha e Policia
Civil.
Às 19h30, agentes do DOPS invadiram a sede do Centro Academico
Pereira Barreto, da Faculdade Paulista de Medicina, prenderam 6 estudantes
e levaram um mimeografo e manifestos da UNE. Os universitarios detidos
foram liberados às 22h, depois de interrogatorio na Delegacia
de Ordem Política.
As faculdades de Filosofia da Universidade de São Paulo, Sociologia
e Política e Filosofia de São Bento, da PUC, permanecem
em greve, por motivos diferentes e especificos.
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UNE
diz que sua reunião proibida terminou ontem |
A União Nacional dos Estudantes realizou uma manifestação
na praça da Sé, no fim da tarde de ontem, e diz que
com ela encerrou seu congresso. Junto à estatua de Anchieta,
cerca de 200 estudantes agruparam-se por quinze minutos para ouvir
alguns líderes estudantis, entre os quais o presidente da UNE,
Luís Travassos, que é procurado pela Polícia.
O Congresso da UNE, entidade extinta pelo governo, fora declarado
ilegal, e foi realizado em duas etapas, a primeira das quais clandestinamente,
num convento de Vinhedo, no fim de julho, e a segunda, semi-clandestinamente,
em reuniões nas escolas e residencias particulares.
Por duas vezes a Polícia relaxou a prontidão, pois esperava
o encerramento publico - divulgado antecipadamente pela UNE - para
os dias 2, 3 e 4, o que só aconteceu ontem, na praça
da Sé. Nos ultimos dias a Polícia voltou ao regime e
de prontidão.
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Comício
relampago |
Em quinze minutos de manifestação, falaram três
oradores. Diversos cartazes coloridos, tinham dizeres contra o governo
"a ditadura" e "o imperialismo". Durante todo
o tempo os estudantes fritavam em coro frases como "o povo organizado
derruba a ditadura", "fora ianques" e "abaixo
a ditadura".
Às seis e meia, o presidente da UNE, Luis Travassos, subiu
num banco de pedra da praça e falou durante cinco minutos.
Disse que o 29º Congresso da UNE se realizou com inteiro sucesso,
que a UNE é contra "a ditadura imperialista" que
o "imperialismo não está lá fora, está
aqui dentro mesmo, representado pela ditadura militar". Travassos
acabou por firmar que o povo deve se organizar "para que em conjunto
possamos deflagar uma ação que derrube a ditadura".
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A
manifestação |
Às seis horas da tarde de ontem a metade superior da praça
da Sé, em frente à Catedral, foi tomada por grupos de
rapazes e moças estudantes, muito característicos com
suas calças e camisa esporte e suas bolsas a tiracolo. Casais
de namorados e grupos de três circulavam abaixo e acima da praça,
esperando a ordem que seria dada por algum contatos. Em quinze minutos,
a area que circunda o marco zero da praça, habitualmente vazia
- pois os populares somente a atravessam, num sentido ou outro - ficou
cheia de jovens. Não havia ali policiamento especial, apenas
alguns guardas-civis.
Às seis e quinze os jovens começaram a descer para a
metade inferior da praça, que circunda a estatua de Anchieta.
Em seu caminho, avisavam muitos estudantes que estavam postados nos
pontos de onibus que a manifestação se realizará
em seguida.
Às 18h20, um grupo de trinta estudantes, mais ou menos, reuniu-se
junto aos bancos das beiradas da praça, e com um grupo de "Abaixo
a Ditadura", iniciou a manifestação. Logo, todos
os estudantes que estavam nas proximidades rodearam o pequeno grupo
inicial. Cartazes foram levantados acima das cabeças, e panfletos
foram jogados para o ar.
O povo em volta, olhava com indiferença e com a mesma indiferença
ouvia os discursos.
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Dispersão |
Às 18h35 os estudantes calaram-se. Os grupos dispersaram-se,
alguns passantes pararam para olhar os cartazes que ficaram abandonados
no chão e os folhetos espalhados. Meninos baixavam-se, apanhavam
os cartazes, alguns pisados e rasgados, e faziam posse para os fotografos
que acionavam suas maquinas sem parar.
Somente meia hora mais tarde é que apareceu uma tropa de choque
da Força Publica no local.
Enquanto isso os estudantes dirigiam-se para a praça Patriarca
onde haveria nova manifestação. Lá, os moços
agruparam-se em redor de uma pregadora religiosa, perplexa diante
do subito aumento da assistencia. Constava que todas as Faculdades
iriam se reunir naquele local, para fazer uma grande manifestação,
ultima do encerramento do Congresso Pouco depois entretanto a praça
esvaziou-se de estudantes que foram para o largo Paissandu.
Pouca vigilancia policial foi notada, nenhuma viatura, somente um
jipe do comando da Força Publica passava pela praça
do Patriarca às sete horas, e transmitia à sua sede
que as ruas estavam tranquilas.
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Nota
da UNE |
À noite, o presidente da UNE, Luis Travassos, divulgou uma
nota afirmando entre outras coisas que "foi encerrado hoje, dia
10 de agosto de 1967, em praça publica o XXIX Congresso da
União Nacional dos Estudantes. A nota diz que " os 4 mil
homens mobilizados durante três semanas não conseguiram
impedir a livre manifestação dos estudantes e acusa
a policia de ter prendido "inocentes, que procuram caracterizar
como perigosos subversivos".
Termina dizendo que a UNE "realizou completamente o seu programa,
elegeu sua diretoria, discutiu com os universitarios do Brasil a sua
Carta Politica e realizou o ato publico de encerramento do Congresso".
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Bomba
na Cidade Universitaria |
Uma bomba de fabricação caseira, que o engenheiro José
Elias, do IPT, qualificou de "bombinha de São João",
explodiu à 0h30 de ontem na porta do PBX da Cidade Universitaria.
O petardo foi colocado defronte a um abrigo de onibus em uma das avenidas
circulares que dão acesso à Reitoria.
A bomba estilhou um vidro, e explodiu 30 minutos após a retirada
do policiamento, após uma vigilia de 24 horas.
Às 9h30 o delegado Rui de Ulhoa Canto, adjunto da Ordem Politica,
foi ao local e se entrevistou com o professor Fabio da Silva Prado,
assistente do Reitor, que solicitou um reforço no policiamento
noturno.
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DOPS:
martir encerraria o congresso |
O novo diretor do DOPS, delegado Francisco Eduardo Sertorio Canto,
disse ontem aos jornalistas credenciados naquela repartição
que, em relação ao encerramento do Congresso da UNE,
proibido pelo governo, chegou aos ouvidos do delegado Sidney de Mori,
chefe do Serviço Secreto, oriunda de quatro fontes diferentes,
a seguinte informação:
Os estudantes pretendem locomover-se em caminhões, de alguns
pontos para um local de encontro, que pode ser o Conjunto Residencial
da Cidade Universitária; quando forem surpreendidos pela Policia,
disse o delegado, deverão atirar num colega estudante, assim
"fabricando um martir".
Dessa forma, no dia do enterro do estudante morto, os estudantes poderiam
reunir-se no cemitério, e ali encerrar tranquilamente o 29º
Congresso da UNE, sem interferência da Policia.
O delegado acrescentou que essa intenção foi demonstrada
pelos lideres do movimento, e chegaram aos ouvidos da Policia.
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