MANDATO PRESIDENCIAL SERÁ DE 6 ANOS

Definidas ontem as últimas emendas que integrarão as reformas políticas

Publicado na Folha de S.Paulo, domingo, 10 de abril de 1977

Da Sucursal de Brasília

O mandato do próximo presidente da República será ampliado de cinco para seis anos.
Essa foi a última e principal modificação no elenco de reformas políticas, definidas ontem, aqui, durante reunião do presidente Geisel com os ministros Golberi do Couto e Silva, do Gabinete Civil, e Armando Falcão, da Justiça, e os líderes políticos Petrônio Portela, Francelino Pereira e Marco Maciel.
Assim, o mandato do sucessor do presidente Geisel, que tomará posse a 15 de março de 1979, se estenderá até 15 de março de 1985.
O anúncio foi feito ontem à noite por uma fonte política, após o término da reunião na Granja do Riacho Fundo.
A mesma fonte adiantou mais as seguintes emendas constitucionais definidas na reunião de ontem:
- O número de deputados federais será proporcional à população dos Estados (e não mais ao eleitorado) e haverá no máximo 400 cadeiras na Câmara (atualmente há 364 cadeiras);
- Os atuais governadores de Estado não poderão candidatar-se ao Senado nas próximas eleições pela via indireta; poderão, contudo, concorrer ao pleito direto (dois terços das cadeiras do Senado).
A publicação das reformas políticas - soube-se também ontem à noite - não mais será feita amanhã, conforme era esperado, e sim entre terça e quinta-feira. O adiamento se deveria ao encontro, amanhã, de Geisel com o presidente Stroessner, do Paraguai.
Os funcionários da Imprensa Oficial mantêm-se desde ontem de prontidão em Brasília, aguardando a remessa dos textos das emendas para publicação no "Diário Oficial".

Ainda uma dúvida

Entre as mudanças que ainda não estavam ontem completamente definidas figura a que estabelece o quorum de maioria simples para aprovação de emendas à Constituição.
A dúvida é saber se haverá igualdade de tratamento entre propostas de alteração constitucional de iniciativa do Congresso e do Executivo.
Acredita-se que acabará prevalecendo a tese que beneficia apenas com quorum de maioria absoluta (50 por cento mais um) as iniciativas governamentais. As emendas propostas por congressistas continuarão a depender de quorum de dois terços para serem aprovadas.

Termina o exame das reformas

BRASÍLIA (Sucursal) - As modificações a serem introduzidas na Constituição, em consequência dos entendimentos do Governo com os políticos arenistas, são as seguintes:
1 - Artigo 13, parágrafo 2º, no qual se estabelece a eleição direta de governador, pelo voto popular. A alteração, além de fixar a eleição indireta, deverá estabelecer o colégio eleitoral de governadores, com vereadores e deputados estaduais, excluídos os prefeitos.
2 - Artigo 15, que fixa a regra da incoincidência de mandatos de senadores e deputados federais e estaduais com os de prefeitos e vereadores. A modificação restabelecerá a coincidência desses mandatos, nos termos do que havia antes de 1964, na maioria dos Estados. Pela legislação anterior, cabia aos Estados marcar as datas da eleição de seus vereadores e prefeitos. Muitas unidades da Federação preferiam, no entanto, a incoincidência, alegando dificuldades de opção simultânea do eleitorado, obrigado a assinalar diversos nomes de candidatos na rápida passagem pela cabina eleitoral.
3 - Artigo 39, parágrafo 2º, letras "A", "B", "C" e "D", que estabelecem a composição da Câmara de Deputados, com base no número de eleitores de cada Estado. Esse critério foi estabelecido pela Constituição de 1967. Antes, o número de deputados tinha por base a população. Instituiu-se a representação através do eleitorado sob a alegação de que convinha estimular a alfabetização. A idéia, no entanto, repercutiu mal nos Estados nordestinos e nortistas, onde o analfabetismo é mais acentuado. Agora, será estabelecido, também, o número máximo de representantes, como nos Estados Unidos, para se evitar que a representação popular cresça indefinidamente. O teto de deputados federais, cujo número, hoje, é de 364 representantes, será atualizado, com base no último recenseamento, e não modificará mais, variando porém a representação de cada Estado, de uma eleição para a outra, em função do crescimento ou decréscimo populacional.
4 - Artigo 41 e o seu parágrafo 1º, que estabelece a regra de eleições diretas de senadores. A modificação aprovada manda que um terço do Senado se eleja indiretamente, pelo mesmo colégio eleitoral que escolhe o governador.
No Brasil, já houve eleições indiretas de governadores, no passado, bem como de senadores. Provisoriamente, enquanto se suspendia o pleito direto de governadores, nas eleições de 1970 e 1974, criou-se o colégio eleitoral especial, constituido apenas de deputados estaduais. No antigo Estado da Guanabara, que elegeria, por esse critério, o atual governador, houve fusão com o Estado do Rio, e a indicação do chefe de Executivo estadual coube ao presidente da República.
5 - Artigo 48, pelo qual se estabelece que a Constituição só pode ser emendada, no Congresso, pelo voto de dois terços dos congressistas. A mudança a ser introduzida estabelece a emenda através da maioria absoluta.
6 - Todo o capítulo VIII da Constituição, artigos 112 e 144, referentes ao Poder Judiciário. Será aprovada a reforma judiciária nos termos de substitutivo do senador Eurico Resende, líder da maioria no Senado, que não obteve o apoio indispensável de dois terços dos congressistas.
No texto final, contudo, acredita-se que serão introduzidas ligeiras modificações. Paralelamente, pensa-se na modificação do artigo 94 a 96 da Constituição, reformulando também o Ministério Publico. Estas emendas - ao que se diz - não teriam sido suficientemente examinadas e podem ficar para outra ocasião.

Complementares

Entre as medidas que serão baixadas através de leis complementares figuram as seguintes:
1 - Nova Lei de Imprensa, atendendo, segundo se diz, aos termos do art. 174, parágrafo 2º da Constituição, pelo qual "sem prejuízo da liberdade de pensamento e de informação, a lei poderá estabelecer outras condições para a organização e o funcionamento das empresas jornalísticas ou de televisão e de radiodifusão, no interesse do regime democrático e do combate à subversão e à corrupção". As mudanças agravarão as sanções aos infratores. O exame desta lei foi feito exclusivamente pelo Governo, sem concurso dos líderes políticos.
2 - Nova Lei de Segurança Nacional (também sem concurso dos políticos).
3 - Extensão da chamada Lei Falcão aos pleitos gerais do País. Antes mesmo do estabelecimento da coincidência de todas as eleições, previstas para 1982. Com vistas à coincidência, serão eleitos prefeitos e vereadores em 1980, para um mandato-tampão de dois anos. Numerosos arenistas esperavam que houve prorrogação de mandatos dos atuais detentores de cargos municipais. Pela Lei Falcão, os candidatos ao Senado, Câmara Federal e Assembléias Legislativas não poderão debater questões políticas nos meios de comunicação de massa.
4 - Vinculação do voto, em todos os níveis. O eleitor será obrigado a votar, nas eleições, de vereador a senador, em candidatos pertencentes ao mesmo partido, sob pena de nulidade de voto. A exigência vigora, hoje, quanto a deputados federais e estaduais. Segundo estatísticas dos tribunais eleitorais, essa obrigação de vincular o voto constitui, percentualmente, o maior fator de anulação de sufrágios.
5 - Sublegenda para o Senado. Já vigorou a idéia logo após a extinção dos antigos partidos. Em alguns Estados, como no Rio Grande do Sul, em face disso, venceram candidatos menos votados, mas que se beneficiaram da soma de votos de seus companheiros. Poderão candidatar-se a cada vaga, de eleição direta, até três candidatos, embora se deseje limitar o número de sublegendas a duas apenas, para cada cadeira.
Dentre as modificações pleiteadas, mas que não obtiveram consenso, figuram a supressão da fidelidade partidária (defendida inclusive pelo líder da maioria na Câmara, dep. José Bonifácio) e o voto distrital misto (defendido pelo sen. Gustavo Capanema). As alterações acertadas pelo Governo com seus líderes não se compatibilizavam com a supressão da fidelidade, pois tornariam as maiorias extremamente movediças. Quanto ao distrital misto (já permitido em face da redação do dispositivo constitucional), teria de ser feita uma redivisão extremamente complexa das regiões eleitorais do País.

Adiadas

Não chegaram a ser apreciadas, nas conversações com os líderes, entre outras medidas, por falta de tempo e a fim de não se prolongar o recesso do Congresso, a reforma da Constituição para atender a uma reivindicação do ex-presidente da República, mal. Castelo Branco (art. 147, parágrafo 3º), que concedia o direito de voto aos analfabetos, mas não obteve, para isso, apoio do Poder Legislativo.
Embora se reduza o quorum de reforma constitucional, não sofrerá modificação alguma o artigo 4º da Constituição, segundo o qual, entre as competências privativas da Câmara dos Deputados, figura a de declarar, pelo voto de dois terços, a procedência de acusação contra o presidente da República e os ministros de Estado.
Também não sairá, na presente reformulação, a lei complementar que, pelo artigo 149, parágrafo 3º, deveria estabelecer as condições de perda e de reaquisição dos direitos políticos no Brasil.
Ficou para outra oportunidade, igualmente, a decretação da lei complementar que atende ao estabelecido no artigo 77, parágrafo 2º ("o vice-presidente da República, além de outras atribuições que lhe forem conferidas por lei complementar, auxiliará o presidente sempre que por ele convocado para missões especiais").
Nas conversações entre os dirigentes políticos e o presidente da República, não se considerou necessário suprimir o parágrafo terceiro do artigo 155 da Constituição, segundo o qual, "a fim de preservar a integridade e a independência do País, o livre funcionamento dos Poderes e a prática das instituições, quando gravemente ameaçados por fatores de subversão ou corrupção, o presidente da República, ouvido o Conselho de Segurança Nacional, pode tomar outras medidas estabelecidas na lei."
Esse princípio é considerado pelos constitucionalistas uma restrição ao exercício da presidência, para o cumprimento de leis em vigor.
Não se cogitou - finalizam os informantes - do problema da criação de um Conselho de Estado, como sucedâneo do artigo 182 da Constituição (que assegura a vigência do AI-5), nem da implantação de algo parecido com o princípio da Constituição francesa, que permite a decretação do Estado de Emergência. Ainda assim, algumas partes do art. 155 da atual Carta (sobre Estado de Sítio) foram apreciadas, chegando-se a pensar em redefinição dessa medida.
A revisão final das emendas e o exame das leis complementares esboçadas foram feitos ontem, na Granja do Riacho Fundo, pelo presidente Geisel.

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