A CENSURA À IMPRENSA

O ministro da Justiça é contra a suppressão da liberdade jornalistica, mas continua a superintender os serviços da Censura...

Publicado na Folha da Manhã, quarta-feira, 07 de fevereiro de 1934

Neste texto foi mantida a grafia original

RIO, 6 - A revolução de 30 foi eminentemente democratica. O seu fim principal, senão unico, era restabelecer as garantias constitucionaes, relegadas a segundo plano pelos ultimos governos da Republica Velha. Em nome da liberdade, sobretudo, da garantia dos direitos dos cidadãos direitos de opinião, direto de voto, direito, enfim, de cidadania, levantou-se a nação em armas, convulsionou-se o paiz de Norte a Sul, desfraldou-se uma bandeira reivindicadora, agitou-se a opinião nacional, sacudiu-se o organismo adormecido da nação. Evidentemente esse movimento, que surgira em razão de uma campanha politica, trazia, senão expresso, pelo menos tacitamente um programma a cumprir. Dentro dessa programação, como formula ampla, o maior postulado, talvez, figura a livre manifestação do pensamento escripto ou falado.
Mas a revolução foi um movimento popular, sobre todos os seus aspectos e para que assim fosse, necessario se tornou o infiltramento em todas as camadas das idéas revolucionarias, da diffusão dos principios que ella esposava, da propaganda do pensamento de seus lideres. Só a imprensa, unicamente a imprensa, foi o vehiculo dessas manifestações, sacrificando tudo, inclusive a liberdade dos seus proprios servidores, para que um dia se realizase o sonho almejado de muitos. E essa imprensa que tudo fez, que tudo deu, que tudo empenhou em beneficio da revolução de outubro, essa mesma imprensa nada teve até hoje da revolução e ao contrario, ha tres annos vive garroteada na sua liberdade, sentinella à vista, tabellando o seu pensamento pela mentalidade tarifaria da censura.
Essa imprensa que servia hontem para endeusar os apostolos da democracia, hoje não serve ou não pode apontar ao paiz os erros que se praticam, fazendo a critica dos homens e das coisas. De forma que neste momento, o problema da censura assume proporções gigantescas de imprensa da capital do paiz.
O interessante é que, enquanto a polícia carioca mantem um apparelhamento perfeito de controle ao noticiario dos jornaes, partem do selo do governo vozes autorizadas condemnando a censura. Ainda hoje, o general Góes Monteiro, ministro da Guerra, declara:
- "A imprensa desempenha um grande papel na vida das collectividades, formando opinião, que é uma formidavel força moral, que sobrepuja 90 por cento das forças materiaes".
Mais adeante:
- "Sou radicalmente contra a censura aos jornaes, e este meu pensamento já é conhecido".
Tambem o general Flores da Cunha declarava ha dias que era francamente pela suppressão immediata da censura.
E o mais interessante é que o ministro da Justiça, o sr. Antunes Maciel, sem se despir das suas antigas roupagens de jornalista, no Rio Grande do Sul, affirma:
- "A minha opinião sobre a censura é conhecida. No caso brasileiro, porém, e nesta altura dos acontecimentos, eu preferiria deixar de todo livre o pensamento".
Mas é o sr. Antunes Maciel, por intermedio do seu ministerio, que superintende o serviço de censura...
E essa censura é tanto mais rigorosa quando ella vae até além das fronteiras permittidas pela lei, porque transpõe os humbraes da Assembléa Constituinte. Quem o affirma é ainda o ministro da Justiça, quando diz que determinou à Directoria de Publicidade que a acção dos censores se abstenha de multilações nos discursos pronunciados na Assembléa, coisa de que o governo jamais cogitou.
Diremos nós que nessa altura dos acontecimentos, quando a nação espera ansiosa a volta do regime da lei, e quando no amplo scenario da Constituinte, palpitam e agitam-se os problemas mais graves da nossa nacionalidade, o exercicio da censura à imprensa torna-se uma monstruosidade.
O Brasil inteiro precisa debater, criticar, analysar, o que se está fazendo pelo seu futuro, em salvaguarda do seu passado. Não é com a mordaça que se ouvirão os écos da voz da nação.

© Copyright Empresa Folha da Manhã Ltda. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Empresa Folha da Manhã Ltda.