ROSSI CONTA QUE PÁRA TEMPESTADE

Francisco Rossi, candidato ao governo do Estado pelo PDT, diz em entrevista a Cosette Alves que já curou pessoas, pára tempestades e abre trânsito congestionado com a força da mente.

Publicado na Folha de S.Paulo, domingo, 04 de setembro de 1994

OLHO EM DEUS E FÉ NO VOTO

Ex-prefeito de Osasco e candidato ao governo do Estado de São Paulo pelo PDT, Francisco Rossi, 54, é uma espécie de Paulo Coelho do palanque. Diz que já curou pessoas e brecou tempestades. Místico, trocou uma seita oriental pelo discurso evangélico. Nesta eleição, tenta realizar outro milagre: exorcizar a descrença na política

Por Cosette Alves

Francisco de Almeida Rossi, candidato do PDT ao governo do Estado de São Paulo, conta que já lidou com as forças do universo e ousa ir contra o ceticismo. É um homem obstinado e cheio de fé -característica rara nesse fim de século. Hoje predominam a descrença e a falta de esperança, grifes do discurso da moda. Ele tem idéias próprias, com as quais podemos concordar ou não, mas luta contra a descrença e sua bandeira é a esperança.
"Na obra de Dante Alighiere, uma frase diz que o inferno começa quando a esperança acaba. Acho que qualquer um deve lutar para que a esperança não morra no coração de ninguém. Apesar das dificuldades, a gente deve se apegar a Deus. É a grande esperança."
Até me assustei ao ouvir alguém falando com tanta esperança a respeito do Brasil e do ser humano. Será que esta fé tão forte é apenas um refúgio necessário face a incerteza de tantos problemas angustiantes a resolver? Não sei. Só Deus sabe.
O deputado Francisco Rossi é simpático, simples e direto. Conversei durante horas em sua casa, onde tomei um café delicioso. Uma casa bonita, confortável sem ser luxuosa. Usava suéter e camisa esporte. Movimentava-se com agilidade e sem tensão. Voz agradável, olhar direto e tranquilo.
Ele acredita que muita coisa é possível e pode ser feita. Sua fé continuou inabalável mesmo depois de ter passado, na infância, por um episódio traumático. Nasceu em Caçapava. Ali ficou até os 2 anos. Mudou-se para Marília, onde o pai foi abrir uma agência bancária. Numa briga entre o gerente do banco e um cliente, uma bala perdida matou o pai de Rossi -que tinha então 5 anos. "Minutos antes de papai morrer, conversei com ele. Isso me marcou muito. Eu me recordo de ele dizer - 'estou morrendo, estou morrendo'. Ele me pedia 'cuida de sua mãe, de seus irmãos'. Eu não entendia bem o que estava acontecendo."
Depois disso, Rossi sentiu-se para sempre responsável pela mãe e a família. Foi em 1945. Na época, havia mais discriminação contra a mulher. Emprego era difícil. "Comecei a trabalhar muito cedo. Com 10 anos, fazia pequenos serviços. Meu primeiro emprego foi na Cidade de Deus, no Bradesco. Era contínuo e até hoje mantenho boa relação com a direção do banco. Eu os admiro, porque os vi lá embaixo e subiram."
Foi para Osasco aos 13 anos, por ter sido expulso da escola. Em Agudos, onde morava, desentendeu-se com a professora, que o repreendeu e bateu-lhe com uma régua. Rossi reagiu e não quiseram que continuasse lá.
Não tendo se adaptado em Osasco, voltou após seis meses para Agudos, onde foi recebido com alegria. Para sua sorte, a professora malvada havia sido despedida e ele foi readmitido no ginásio. Bom aluno, recebia prêmios. Não gostava muito de estudar, "retinha a matéria na cabeça".
O candidato faz um relato sobre a importância que tem a religião na sua vida. "Eu vivia procurando algo, hoje sou tranquilo, acho que me encontrei." Nascido em lar católico, ia à missa. Foi crismado, fez encontro de casais. Conhece bem a Bíblia. "Mas sempre quis ter certeza da existência de Deus. A Igreja Católica não conseguiu me transmitir Deus."
Veio sozinho para São Paulo, morou com os tios até os 16 anos. Depois, viveu numa pensão de "quinta categoria", no centro. "Convivia com pessoas revoltadas, que vinham para cá em busca de oportunidades e não achavam. Conversávamos e os ateus queriam me provar que Deus não existia. Nunca entrei nessa. Desde moleque, quando disputava o movimento estudantil, tinha uma frase que gostava: Com Deus venceremos."
Em busca e inquieto, Rossi provou muita coisa. Passou por uma seita oriental. Não quis revelar o nome, mas explicou porque chegou a frequentá-la. Tinha sido eleito deputado federal em 1986. Em Brasília, ficou doente. O médico disse que ele deveria vir a São Paulo para se tratar. Rossi resolveu não se afastar de lá, por causa da votação da Constituinte. Tomou medicamentos errados, que causaram efeitos colaterais perversos. Por acaso, soube dessa seita. Curioso e meio desesperado por causa da saúde, agarrou-se a ela. Hoje, acha que foi curado por uma "imposição" feita pela seita. "Aí aprendi a lidar com as forças do universo e sempre achei que os milagres e curas que aconteciam ali não eram coisas de Deus. Fiz uma iniciação e comecei a fazer meus milagres, meus entre aspas." Rossi conta uma experiência. "Um parente de minha esposa estava com operação marcada. Recorreram a mim para fazer uma 'imposição de mãos'. No dia seguinte, ele estava totalmente curado."
Para Francisco Rossi, a fé remove montanhas. É ou não é possível? Só Deus sabe. Mas ele acredita. Sua fé é daquela que só vendo para crer, pois foi ao Japão verificar o que era a seita oriental, nas suas origens. "Eles desconheciam Jesus. Sempre aprendi Jesus como único e suficiente salvador. Quando vi aquilo, questionei: será que estou no lugar certo?" Isso foi em 1987.
"Sempre acreditei no Pai, no Filho e no Espírito Santo. Aprendi a pedir a Deus que dê sabedoria através do Espírito Santo. Eu implorei por sinais e fui recebendo sinais. Tenho amizades no meio evangélico e fui me aprofundando na interpretação evangélica da palavra de Deus. Vivi momentos difíceis como prefeito de Osasco. Na minha função, tive uma experiência pessoal com Cristo. Foi definitivo." Aí, Rossi decidiu deixar a seita. "Aceitei Cristo, mesmo, há um ano e meio."
A mudança, a partir daí, "foi fulminante". Antes, pensava em deixar a política, tão decepcionado estava. "Nem quis saber se a minha religião traria consequências na minha vida política, pois os evangélicos são minoria. Minha vida mudou e me senti encorajado a continuar na política."
Ganhar ou não a eleição não o preocupa. "Uma passagem bíblica diz: 'Uma vida vale mais do que tudo no mundo'."
Rossi diz que as obras são efêmeras. "O que faço hoje, estará superado ou destruído daqui a alguns anos. A maior obra que fiz como político é ter pessoas que acreditam em mim, sem eu ter um curral eleitoral." Ele expõe suas idéias sem demagogia. Não é por estar no PDT que ataca o plano Real e nem faz um discurso de oposição para tentar ganhar o voto.
Ele defende tentativas para melhorar o Brasil, não importa quando e em que data sejam executadas. Vota para presidente em Leonel Brizola. Considera o candidato petista bem-intencionado e inteligente. Mas ressalva: "Um governo Lula é preocupante. Só boa intenção não basta."
Seu plano de governo vai caber em uma folha de papel sulfite. "Não adianta ficar prometendo. Quero ser governador porque vou fazer algo completamente novo na política nacional. Vou atacar a questão moral do Estado. Minha prioridade é atacar a corrupção. Entendo que tudo que fica muito grande é inadministrável. Como administrar um Estado com 900 mil funcionários?", pergunta. Se eleito, municipalizará educação e saúde.
Rossi prega a diminuição do Estado, para deixá-lo mais eficiente. Não descarta a privatização do Banespa: "Não sei se é o caso. Mas se chegar a conclusão que é, por que não?". Para ele, São Paulo deve assumir o processo de modernização do Estado brasileiro. "A lei do mercado deve começar a funcionar mesmo", diz. É a favor da livre negociação salarial. Diz que entrou no PDT porque foi convidado. "Mas eles sabiam como eu pensava. Mesmo o Brizola, mais estatizante, mudou muito."
Quando prefeito, resolveu uma greve na saúde "de maneira drástica". Demitiu 400 médicos, decretou calamidade pública. "Repus os médicos. Privatizei uma parte, fiz uma experiência na saúde." Deu certo na ocasião. Moral da história: "Fiz meu sucessor no primeiro turno. O povo aprecia medidas enérgicas. Vou governar com mão forte o Estado de São Paulo".


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