O SR. MELLO FRANCO E O PREMIO NOBEL DA PAZ


Publicado na Folha da Manhã, sábado, 2 de junho de 1934

Neste texto foi mantida a grafia original

Rio, 1 - O appello da Associação Brasileira da imprensa dirigido no "Comité do Premio Nobel da Paz", está feito nos seguintes termos:
"A Associação Brasileira de Imprensa, instituição que reune os profissionaes do jornalismo, das 21 unidades confederadas, que formam o Brasil, pede venia para advogar perante esse illustrado comité a candidatura ao "Premio Nobel da Paz" dos eminentes juristas americanos. Ss. Exas. Saavedra Lamas, chanceller da Republica Argentina e Afranio de Mello Franco, ex-chanceller da Republica dos Estados Unidos do Brasil. O chanceller Saavedra Lamas é figura gloriosa da diplomacia sul-americana que acaba de conquistar definitiva projecção internacional com a idéa superiormente victoriosa do pacto antibellico que lhe conserva o nome e que assignado no Rio de Janeiro em 1933, entre a Argentina e o Brasil, recebeu successivamente a adhesão das mais cultas e poderosas nações do mundo, entre as quaes as grandes potencias européas.
O pacto Saavedra Lamas representa um dos passos mais decisivos e gigantescos dados nos ultimos annos a caminho desse grande e supremo ideal dos povos de todos os tempos e de todas as raças: a paz. Elle marca, verdadeiramente, uma etapa na conquista dessa aspiração inconfundivel do coração universal. Reconheceram-no promptamente as chancellarias da Europa o da America e hoje esse pacto está firmado pela maioria dos que têm nas suas mãos os destinos da civilização e da humanidade.
Quanto a Afranio de Mello Franco, além da valiosa collaboração assegurada como chanceller do Brasil à victoria mundial do Pacto Saavedra Lamas, além de quasi quatro annos do magnifico trabalho de approximação inter-continental à frente da chancellaria do Brasil, foi o presidente da Conferencia Peruvio-Columbiana que acaba de levar a bom termo as negociações para solução pacífica do chamado conflicto de Leticia. Bastaria sua actuação à frente dos que evitaram que o sangue generoso de dois povos ensopasse a terra magnifica do novo mundo para lhe assegurar amplos e decisivos direitos àquele premio com que a Fundação Nobel estimula os sentimentos de confraternidade entre os povos.
A A.B.I., que, no dizer de Victor Maurtua, de Mello Franco e de tantas outras autoridades em assumptos diplomaticos americanos, tem sido uma fiel collabora das chancellarias na obra de consolidação da paz entre as nações americanas, julga que lhe assistem direitos nitidos à defesa daquellas candidaturas, uma e outra amparadas pelo bom senso unanime dos povos continentaes no que elles têm de mais culto e expressivo. Por isso a A.B.I. dirige-se a esse egregio tribunal em nome dos jornalistas do Brasil e do pensamento que julga interpretar de todas as demais entidades de imprensa, nesta parte da America, aonde a obra humanitaria de Saavedra Lamas e Afranio de Mello Franco tem sido celebrada com louvores enthusiasticos e aplausos justissimos para que seja conferido aos dois grandes campeões americanos da paz o titulo a que fizeram jus. (a) Herbert Moses, presidente da A.B.I.).

O sr. Getulio Vargas um enthusiasta da candidatura Mello Franco

Rio, 1 - O sr. Getulio Vargas manifestou-se plenamente favoravel à candidatura do sr. Afranio de Mello Franco ao "Premio Nobel da Paz". Em palestra com um redactor do "O Globo" o chefe do governo externou o seu pensamento nestes termos:
"Collaboraram para a necessidade e a justiça da victoria dessa candidatura varios movimentos. Em primeiro lugar o Tratado de Leticia foi o maior e mais importante acontecimento pacifista do anno. Essa guerra, imminente entre dois povos irmãos, foi transformada num compromisso solenne de reciproca amizade. Essa notavel conquista que se enquadra perfeitamente no espirito fraternal dos povos americanos, foi lograda de maneira preponderante pela dedicação com que o sr. Mello Franco occupou a presidencia da commissão que resolveu, diplomaticamente, o incidente peruvio-colombiano".
O sr. Getulio Vargas accentuou ainda:
"Ha a considerar tambem a justiça que isso representa para o Brasil. Paiz de uma nobre e reconhecida tradição pacifista, o Brasil tem direito a pleitear o "Premio Nobel da Paz", para um dos seus filhos, que melhor encarna, na hora presente, esta tendencia nacional, pela solução diplomatica dos conflictos internacionaes. É um facto de elementar justiça para o Brasil e as qualidades do sr. Mello Franco o tornam sem sombra de dúvidas, merecedor desta distincção."

O embaixador mexicano e a victoria do pacificador de Leticia

Rio, 1 - O embaixador do Mexico, sr. Alfonso Reyes, manifestou-se, com enthusiasmo, sobre a candidatura do sr. Afranio de Mello Franco ao "Premio Nobel da Paz".
Disse a respeito o embaixador Reyes em entrevista que o "O Globo" publica:
"A obra do sr. Afranio de Mello Franco em busca da paz na America torna-o seguramente merecedor do "Premio Nobel da Paz". E não me refiro apenas ao ultimo o assignalado triumpho de Leticia, que com tanto jubilo festejamos. Muitos são os titulos que o illustre cidadão do mundo póde allegar em abono da sua candidatura e o agradecimento dos povos lhe chega de todas as direcções. No Mexico, por exemplo, não esquecemos o que devemos à sua intervenção acertada e cordial na solução daquella inutil questão com a Venezuela, que se alargava e se ia tornando cada vez mais séria, sem proveito para ninguem ou em detrimento das relações entre dois povos a quem todas as vozes da natureza incitaram a amizade.
O Tratado de Leticia - de que a nossa America está orgulhosa, não resolve apenas o conflicto immediato na zona discutida. O titulo 2º do acto addicional contém preceitos de direito social que honram aos seus autores e que transcendendo da questão, pódem servir de exemplo e norma a futuras convenções americanas.
Por isso dizia, com razão, o dr. Maurtua, que este tratado não era uma formula deshumana e secca, mas que continha um "succo vital".
Para que a figura do chanceller Mello Franco se destaque em toda a sua calorosa cordialidade, a sorte quiz que as corôas do triumpho publico se amontoassem dolorosamente junto às corôas do seu luto privado. O nobre cavalheiro da paz soube levar adiante o seu destino com uma galhardia pathetica: "avante sobre os sepulcros, avante?"
Já nos gritava da sua dôr fecunda o grande mestre Goethe".

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