LÍDER DA OPOSIÇÃO CASSADO
A
punição de Alencar Furtado ocorre três dias
após seu discurso na TV. O procurador da República
vai processar no Supremo o presidente Ulisses Guimarães.
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Publicado
na Folha de S.Paulo, sexta-feira, 01 de julho de 1977
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O presidente da República acionou novamente ontem o Ato Institucional
n° 5 para cassar o mandato e suspender por 10 anos os direitos
políticos do líder da Oposição na Câmara,
deputado Alencar Furtado, do Paraná. A informação
foi divulgada através de nota oficial de 5 linhas, distribuída
pelo Ministério da Justiça, e que não aponta
o motivo da decisão.
É a segunda vez que o AI-5 é utilizado para cassar o
mandato de um líder da Oposição. A punição
anterior atingiu o deputado Mário Covas de São Paulo,
nas punições provocadas pela crise de 1968, sob a acusação
de ser um dos articuladores da Frente Ampla.
Os primeiros rumores sobre a cassação surgiram ontem
no Congresso com o inesperado cancelamento da presença do ministro
da Justiça, Armando Falcão que todas as quintas-feiras
concede audiências a parlamentares. O ministro foi convocado
para uma reunião fora de agenda com o presidente da República,
durante a tarde.
Decidida a cassação de Alencar Furtado, o ministro telefonou
inicialmente para o presidente do Congresso, senador Petrônio
Portela, e depois para o presidente da Câmara e para os líderes
arenistas nas duas Casas, no final da última sessão
antes do recesso de julho. A surpresa foi geral. Visivelmente nervoso,
o deputado José Bonifácio declarou:
"Toda vez que o Governo quer fazer a distenção,
vem o MDB e atrapalha. É a minha velha tese: o MDB não
quer a distensão".
O deputado Alencar Furtado recebeu a notícia na residência
de um amigo em Londrina, o economista Hélio Duque, no início
da noite de ontem, depois de passar a tarde em contato com corrreligionários
de uma cidade próxima, Arapongas. No dia anterior, em entrevista
coletiva, ele havia afirmado acreditar que o presidente Ernesto Geisel
reconduzirá o País à normalidade democrática.
Ontem no hotel onde se hospedou à noite de Londrina, ele evitou
falar aos repórteres que o assediavam pessoalmente ou pelo
telefone, respondendo com frases esparsas à saraivada de perguntas:
"É isso mesmo. A luta continua e não podemos ficar
no meio do caminho", disse o líder cassado ao deputado
Freitas Nobre, por telefone. "Muitos companheiros já passaram
por isso", disse resignado a um amigo.
"Saio tangido da vida pública - afirmou aos jornalistas
- com a consciência tranquila, porém, lamento não
poder continuar, pois existe ainda muita coisa a ser feita..."
Alencar Furtado, cearense de 51 anos, acha que foi cassado porque
"eles devem ter sentido muito profundamente o programam do MDB
na TV".
"Trata-se de uma cassação profunda injusta. Ele
foi punido sem ser ouvido, sem ser julgado publicamente", disse
o presidente nacional do MDB, deputado Ulisses Guimarães, que
ontem à noite convocou reunião da Executiva Nacional
do partido para as 10 horas de hoje, quando deverá ser preparada
uma nota oficial.
A tese de autodissolução do MDB voltou a circular ontem,
sendo admitida inclusive pelo líder da Oposição
no Senado, Franco Montoro.
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Processo |
Além da cassação, o Governo orientou ontem o
procurador-geral da República, Henrique Fonseca de Araújo,
para que processe o deputado Ulisses Guimarães, como responsável
pelo programa do MDB apresentado numa cadeia de rádio e televisão
na segunda-feira. O primeiro passo, requisitado das fitas gravadas
pela TV para instrução do inquérito, foi dado
ontem mesmo.
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Editorial |
Oposição Cassada
O presidente
da República, no exercício de suas funções
de chefe revolucionário, cassou ontem o mandato do deputado
José Alencar Furtado, líder da Oposição
na Câmara dos Deputados. Não cassou apenas mais um
deputado: cassou, perante o mundo e o País, a Oposição
no Brasil.
Não é costume um chefe revolucionário dar satisfações
ao País ao aplicar o Ato Institucional n° 5. Segundo
os oráculos do regime, a Revolução é.
Quer dizer, ela paira acima do transitório e do que precisa
ser explicado.
Realmente no caso em tela, qualquer explicação terá
valor nulo. É automática a relação de
efeito e causa entre o ato de cassação e o recente
programa de televisão realizado à sombra do Poder
Judiciário, do qual participou o parlamentar ontem cassado.
O deputado terá sido cassado pelo que disse no programa autorizado
pela Justiça. Em seu pronunciamento, porém, não
se encontrará qualquer violação das lei ordinárias
do País. Se violação houve, terá sido
a do arranhão feito ao prestígio e à autoridade
do regime revolucionário.
Agora não se pune apenas por crime de opinião na tribuna,
mas por crime de opinião em programa da Justiça Eleitoral.
Os Poderes da República são descartados, quando se
trata de proscrever da vida política os adversários
do regime. São descartados por medida de exceção.
Não porque os pronunciamentos incriminados tenham determinado
qualquer perturbação da ordem pública, ou porque
tenham abalado a segurança nacional. O País, embora
surpreendido, está calmo. A punição bate porque
é preciso preservar o prestígio do Governo. Estamos
presenciando uma situação em que prevalecem as motivações
de prestígio sobre as razões da sabedoria política.
De que valerá facultar, segundo a lei, a televisão
aos adversários do Governo? Estes já sabem agora que
o regime pode puni-los por crime de opinião, mesmo que esta
seja proferida sob o manto da Lei Eleitoral. Ao cassar o direito
oposição no Brasil, o Governo Geisel selou e lacrou
o seu destino. Subiu na escalada que nos afasta da esperança
democrática, e nos devolve ao ambiente de dureza e de incerteza.
Até que essas durezas e essas incertezas terminem nas mãos
de quem Deus não quis perder.
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