JUSCELINO ASSUME A PRESIDÊNCIA

As cerimônias de posse e de transmissão do cargo, ontem realizadas no Rio de Janeiro

A POSSE DOS NOVOS MINISTROS DE ESTADO

Publicado na Folha da Manhã, terça-feira, 1º de fevereiro de 1956



RIO (FOLHAS) - Num ambiente de entusiasmo, realizou-se ontem no Palácio Tiradentes, perante o Congresso Nacional, a cerimônia de prestação do compromisso de posse dos srs. Juscelino Kubitschek e João Goulart, presidente e vice-presidente da Republica.

O plenário da Câmara havia sido artisticamente decorado com quatro ramalhetes de flores rubras e naturais nas paredes, pouco abaixo das galerias, enquanto a mesa estava coberta de orquídeas e outras flores em belos cestões.

Embora a solenidade estivesse marcada para as 15 horas, já uma hora antes estava à cunha o Palácio Tiradentes, vazias apenas algumas poltronas no plenário. As galerias estavam literalmente tomadas pela banda do Corpo de Bombeiros, as câmeras de televisão e populares.

Nos nichos laterais ao plenário, normalmente reservados à imprensa dos Estados, localizavam-se membros das embaixadas estrangeiras e diplomatas brasileiros; num dos camarotes laterais à mesa , os representantes do rádio, e no outro, à direita, a família do presidente Juscelino Kubitschek. Nas demais dependências, convidados e suas famílias.

Uma fila de poltronas especiais foi colocada à frente da primeira bancada no plenário, sendo ocupada à esquerda pelos chefes das casas Civil e Militar e ministros de Estado, e à direita, pelos representantes diplomáticos estrangeiros, na seguinte ordem: Egito, Países Baixos, Alemanha, China, Índia, Portugal, Turquia e Santa Sé. Nas filas seguintes reservadas aos parlamentares tomaram assento os representantes de Cuba, Alemanha, França, México, Canadá, Nicarágua, Bolívia, El Salvador, Grã-Bretanha, Indonésia, Bélgica, Espanha, Haiti, Equador, Chile, Guatemala, Venezuela, Paraguai, Japão, Honduras, Itália, Argentina, Iugoslávia, Polônia, Islândia, Estado de Israel, Colômbia, União Sul Africana, China, República Dominicana, Austrália, Síria, Tchecoslováquia, Suíça, Luxemburgo, Letônia, Lituânia, Síria, Noruega, Grécia, Paquistão, Irã e Etiópia.

Os membros da mesa trajavam casaca e colete preto como os embaixadores, com as suas condecorações. Havia no entanto um turbante - o do delegado da Índia - bem como outros representantes em primeiro uniforme.

Difícil o trabalho da imprensa


Há no recinto, entre a mesa e o plenário, uma bancada reservada à imprensa no Palácio Tiradentes. Como se constitui de dezenove poltronas apenas, os jornalistas ocupam também os nichos laterais do plenário. Mas ontem estavam reservados para o Itamarati. Não havia como se acomodarem 120 jornalistas credenciados na Câmara, cerca de 60 do Senado e mais de 300 credenciados pelo Itamarati.

Como o espaço entre a bancada da imprensa e a primeira fila de poltronas do plenário fora, desde as primeiras horas, ocupado por pessoas estranhas, credenciadas ou não, o trabalho da reportagem se tornou praticamente impossível. Havia ainda uma determinação do Itamarati proibindo o ingresso de fotógrafos no plenário. Surgiu o primeiro caso com o Comitê de Imprensa da Câmara quando um fotógrafo do “Washington Post” e da Casa Branca foi barrado à entrada do plenário. Graças, no entanto, à compreensão do chefe da Segurança, ficou determinado que os fotógrafos internacionais pudessem ingressar no recinto, onde se encontrava uma dezena de cinegrafistas.

No final de contas, centenas de jornalistas ficaram espalhados pelos corredores, sala do café, tribunas laterais, cobrindo como podiam o seu setor.

O calor era intenso no recinto, apesar do ar condicionado, e ninguém tinha ingresso se não estivesse vestido de roupa escura.

Os primeiros aplausos


Cerca das 14h35 os assistentes notaram num dos camarotes laterais à mesa a presença de da. Sara Kubitschek. Prorromperam aplausos no plenário e a primeira dama do país levantou-se risonha, cumprimentando com um leve e discreto aceno de cabeça os que a aplaudiam.

Funcionavam as câmeras de televisão e os flashes, e os cinegrafistas tomavam posição. A essa altura o plenário estava à cunha, ocupadas todas as cadeiras. Da bancada da oposição compareceram apenas cerca de dez deputados. O arcebispo auxiliar, d. Helder Camara, tomaria assento numa poltrona à esquerda, na primeira fila do plenário, enquanto sua eminência, o cardeal d. Jaime Camara, ficava à mesa.

Lá fora, em torno do Palácio Tiradentes, cerca das 14 horas alinhavam-se as tropas dos Dragões da Independência, estendendo-se até a Esplanada do Castelo para as continências de estilo. O policiamento era feito pela Polícia do Exército, com o auxílio da guarda do trânsito, que exigia para transpor os cordões de isolamento uma credencial da Câmara, do Senado ou do Itamarati.

Ocupavam o topo das escadarias do Palácio Tiradentes várias jovens e senhoras de uniforme branco, empunhando bandeiras nacionais e ostentando uma faixa com os dizeres: "Ala Queremista Feminina".

Precisamente às 15h chegava o carro que conduzia os srs. Juscelino Kubitschek e João Goulart, sob vibrantes aplausos da multidão. Estrugiram foguetes e a Banda dos Dragões da Independência executou o Hino Nacional.

Inicia-se a cerimônia


Cerca das 15h05 o senador Gomes de Oliveira, na presidência, abria os trabalhos. Compunham a mesa, além do presidente, os srs. Flores da Cunha, Luis Gallotti, Rui Carneiro e o cardeal Camara.

O presidente anunciou, sob vibrantes aplausos, que daí a instantes ingressariam no recinto para a cerimônia de posse os srs. Juscelino Kubitschek de Oliveira e João Belchior Marques Goulart, respectivamente presidente e vice-presidente da República, designando para compor a comissão de recepção os senadores Apolônio Sales, Assis Chateaubriand, Georgino Avelino e Atílio Vivaqua, e os deputados Pereira da Silva, Arnaldo Cerdeira, Yukishigue Tamura e Ivete Vargas.

Quando, cerca das 15 h 10, ingressaram no recinto o presidente e o vice-presidente da República, todo o recinto vibrou num aplauso uníssono e demorado. Era indescritível o entusiasmo, principalmente nas galerias, onde ecoava os gritos: "Jango! Jango! Jango!"

A posse


Iniciou-se a cerimônia culminante: o compromisso de posse, anunciado pelo sr. Gomes de Oliveira nos termos do art. 83, parágrafo único da Constituição. Com voz clara e vibrante, sem trair qualquer emoção, proferiu o sr. Kubitschek o seguinte juramento:

"Prometo manter, defender e cumprir a Constituição da República, observar as suas leis, promover o bem geral do Brasil, sustentar-lhe a União, a integridade e a independência;".

Palmas entusiásticas cobriram-lhe as palavras.

Em seguida, de acordo com o art. 13, parágrafo 3.o do Regimento Comum do Congresso, prestou o sr. João Goulart o seu compromisso.

Continuaram os aplausos com a assinatura do termo de posse, depois do que foi executado o Hino Nacional.

O presidente da mesa convidou a comissão de deputados e senadores a acompanhar à saída o presidente e o vice-presidente da República. Nova onda de aplausos demorados e vibrantes no plenário, nas tribunas e galerias, que se manifestaram com redobrado entusiasmo ao ser anunciado o nome do sr. João Goulart.

Cerca das 16 horas o sr. Gomes de Oliveira, agradecendo a presença de autoridades civis, eclesiásticas e militares, encerrava a sessão.

O termo da posse


Na forma do estabelecido no regimento comum o primeiro secretário procedeu à leitura do termo de posse, cuja íntegra é a seguinte:

"Termo de posse dos exmos. srs. drs. Juscelino Kubitschek de Oliveira e João Belchior Marques Goulart nos cargos de presidente e vice-presidente da República, respectivamente:

"Às 15 horas do dia 31 de janeiro do ano de 1956, perante o Congresso Nacional reunido em sessão conjunta de suas duas casas no Palácio da Câmara dos Deputados, na cidade do Rio de Janeiro, capital da República, sob a direção da mesa do Senado Federal, constituída dos senadores Carlos Gomes de Oliveira, presidente em exercício, Francisco Benjamin Gallotti e Raul Carneiro, servindo respectivamente como 1.o e 2.o secretários, compareceram os srs. drs. Juscelino Kubitschek de Oliveira e João Belchior Marques Goulart e, nos termos do art. 83 da Constituição Federal, foram solenemente empossados nos cargos respectivamente de presidente e vice-presidente da República para os quais foram eleitos no dia 3 de outubro do ano anterior e diplomados pelo Tribunal Superior Eleitoral a 27 de janeiro do ano em curso, para o período de 31 de janeiro de 1956 a igual data do ano de 1961. O primeiro proferiu na forma do parágrafo único do citado artigo da Constituição o seguinte compromisso: "Prometo manter, defender e cumprir a Constituição da República, observar as suas leis, promover o bem geral do Brasil, sustentar-lhe a união, a integridade e a independência"; o segundo prestou o constante do parágrafo 3.o do artigo 13 do Regimento Comum do Congresso Nacional, verbis: "Prometo exercer o cargo de vice-presidente da República com dedicação e lealdade, cumprir as leis do Brasil e tudo fazer pelas suas instituições e pelo seu progresso". E, de conformidade com o disposto no ar. 14 do mesmo Regimento Comum, lavrou-se o presente termo que é assinado pelos empossados e pela mesa que dirigiu os trabalhos da sessão.

Assinaram o termo o presidente e o vice-presidente da República e os membros da mesa.

Depois da posse


Terminado o ato de posse, no Palácio Tiradentes, o sr. Kubitschek, em carro aberto, tendo ao seu lado os srs. João Goulart, Álvaro Lins e o general Nelson de Melo, dirigiu-se para o Palácio do Catete.

Durante o trajeto o carro presidencial, que era seguido por um piquete de cavalaria dos Dragões da Independência, passou entre a formatura de grupamentos do Exército, da Marinha e da Aeronáutica que lhe prestaram as honras militares de estilo.

Das calçadas e alamedas o povo saudava com entusiasmo os novos presidente e vice-presidente da República.

Chegada ao Catete


Eram mais ou menos 15h30, quando chegava o carro presidencial ao largo fronteiriço ao Palácio do Catete, onde se encontravam formadas tropas do Batalhão de Guardas e da Polícia Militar. Uma banda de música executou o Hino Nacional, que foi ouvido em silêncio pela multidão que se aglomerava nas adjacências. Terminado o hino, o povo prorrompeu em aclamações aos srs. Juscelino Kubitschek e João Goulart.

Ao descerem do automóvel, os novos governantes foram recebidos à porta do palácio pelo sr. Nereu Ramos, que se achava acompanhado de todo o seu ministério e membros dos gabinetes Militar e Civil.

Transmissão do poder


Às 15h40, no Palácio do Catete, o sr. Juscelino Kubitschek recebeu do sr. Nereu Ramos a suprema magistratura do país investindo-se nas funções de presidente da República, para o desempenho do mandato que o sufrágio popular lhe conferiu.

No salão Nobre, perante as mais altas autoridades do país, teve lugar o ato solene de transmissão do poder. Nessa ocasião, o sr. Nereu Ramos proferiu o seguinte discurso:

"Com a realização deste ato encerra-se um dos mais significativos episódios da vida política nacional. Eleito pelo povo e diplomado pelo órgão judiciário competente, o Congresso Nacional acaba de empossa-lo, sr. presidente, no altíssimo cargo, cujo exercício agora lhe transmito.

"A complementação de cada uma dessas etapas, testemunha nossa fidelidade aos ideais democráticos. A propaganda partidária mobilizou forças e energias que superaram as dificuldades opostas à efetivação do pleito. Manifestada nas urnas a vontade do povo, cumpria apurá-la e obedece-la. Nenhum acontecimento, novo e superior, incidira sobre a vida do país. Nenhum motivo, portanto seria bastante para alterar a decisão livremente tomada pela coletividade de que emana todo o poder, em nome da qual todo o poder é exercido. Sob a inspiração de tão nobres princípios, o egrégio Conselho Nacional e as gloriosas Forças Armadas agiram a 11 e a 21 de novembro último e esse é o sentido real e verdadeiro do movimento que conduziu, transitoriamente, ao exercício da mais alta magistratura do país. Da lealdade com que procedemos e da sinceridade da nossa atitude, o dia de hoje é a melhor confirmação.

"Ao transmitir a chefia de Estado a v. exa., sr. presidente, apenas concretizo, de forma inequívoca e solene, os propósitos manifestados pelo Poder Legislativo e pelas Classes Armadas, e constante respeito à opinião do povo brasileiro.

"A Constituição foi decretada para organizar um regime democrático, e a democracia é sempre um sistema de convivência social, em que o povo se governa a si mesmo. Assegurando a posse dos candidatos eleitos, temos a consciência tranqüila, pois com esse ato, a um só tempo cumprimos o maior objetivo da Constituição e correspondemos aos apelos da formação democrática do país.

"V. exa., sr. Presidente, assume o governo da República em hora de grandes transformações e não menor expectativa de toda a nação. Nos 10 anos de vigência do presente ciclo constitucional, a experiência acumulada evidencia a necessidade de reformas profundas nas nossas instituições. Os imperativos da sobrevivência da nossa união federal impõe a revisão do atual esquema político para o estabelecimento de um regime em que o governo se torne mais eficiente e capaz, o homem mais livre e respeitado, a ordem econômica mais justa e compreensível e a igualdade social mais generalizada e verdadeira.

"Ao transmitir a v. exa. o exercício da primeira magistratura do país, formulo votos sinceros pelo êxito do quinquênio presidencial, hoje iniciado, e rogo a Deus que ilumine e faça descer a paz sobre os lares do Brasil."

Proferidas as últimas palavras, o sr. Nereu Ramos retirou a faixa presidencial que ostentava e colocou-a a tira-colo, entre vivas aclamações, no presidente Juscelino Kubitschek.

Oração do sr. Juscelino Kubitschek

O sr. Juscelino Kubitschek, já investido nas funções de presidente da República, proferiu as seguintes palavras: "Se presidente. Agradeço a honra imensa do gesto protocolar de v. exa. transmitindo-me a faixa da Presidência da República. A sua passagem por esta casa ficará assinalada, nos anais da história do Brasil, como um dos instantes mais altos da vida cívica deste país. A sua tradição ficará imorredoura nos fatos da vida política do Brasil, como uma hora solar para democracia e para a liberdade, em nossa pátria. Congratulando-me com o Brasil por este ano em que se consolida, definitivamente, a democracia em nossa pátria, quero, sr. presidente, trazer-lhe neste instante a palavra de agradecimento de milhões de brasileiros, que viram na sua atuação a garantia mais eficaz para a consolidação da paz, da liberdade e da democracia."
Manifestação popular


Encerrada a solenidade de transmissão, o sr. Juscelino Kubitschek tentou conceder, como presidente empossado, sua primeira entrevista coletiva à imprensa, o que não conseguiu, como noticiamos abaixo, devido à aglomeração que se formou no salão de despachos.

Mais tarde, após visitar os jardins do palácio, o sr. Juscelino Kubitschek chegou a uma janela do primeira pavimento do Catete, sendo entusiasticamente saudado pela multidão que se espraiava na rua Silveira Martins, ostentando cartazes e faixas com distices reivindicatórios.

Em rápido improviso, o sr. Kubitschek dirigiu-se aos manifestantes, reiterando o seu propósito de trabalhar pela ordem, pelo direito do povo e pela justiça.

Uma voz popular, do meio da massa, se alteou das demais para dizer que o operariado brasileiro tinha muitas esperanças no seu novo presidente. Respondeu o sr. Kubitschek, debaixo de aclamações, que também contava com o apoio das classes trabalhadoras, para bem desempenhar o seu mandato e poder assim executar o seu plano de governo.

O novo governo


RIO (FOLHAS) - O sr. Juscelino Kubitschek, logo após receber cumprimentos das altas autoridades, convidados e do povo na cerimônia da transmissão do poder no Catete e de ter conduzido até a porta do Palácio o sr. Nereu Ramos, assinou decretos nomeando os ministros de Estado, a saber: Justiça, Nereu Ramos; Marinha, Almirante Alves Camara; Guerra, general Henrique Teixeira Lott; Relações Exteriores, embaixador José Carlos de Macedo Soares; Fazenda, sr. José Maria Alkimin; Viação e Obras Públicas, comandante Lucio Meira; Agricultura, Ernesto Dorneles; Educação e Cultura, Clóvis Salgado; Trabalho, Pansifal Barroso; Aeronáutica, brigadeiro Alves Seco; e Saúde, prof. Maurício de Medeiros.

Assinou ainda decretos nomeando para o cargo de chefe do gabinete Militar da Presidência da República o general Nelson de Melo e para o cargo de chefe do gabinete civil, o sr. Álvaro Lins.

Todos os ministros de Estado, bem como os chefes dos gabinetes militar e civil, foram em seguida empossados nos respectivos cargos pelo presidente.

Foi nomeado para o cargo de chefe de Polícia do Departamento Federal de Segurança Pública o general Augusto Magessi.

TRANSMISSÃO DOS GABINETES MILITAR E CIVIL

Ontem mesmo no Catete, em ato singelo, o sr. Paulo Lira transmitiu o cargo de chefe do Gabinete Civil ao sr. Álvaro Lins. Por sua vez o general Floriano de Lima Brainer transmitiu a chefia do Gabinete militar ao general Nelson de Melo.
O pitoresco e o dramático ontem, no Rio


RIO (FOLHAS) - O pitoresco e o dramático andaram misturados durante os acontecimentos políticos de ontem nesta capital. Para não falar somente no entusiasmo que coroou o ato de posse dos srs Juscelino Kubitschek e João Goulart, uma série de fatos deixou outras marcas nos sucessos que assinalaram as cerimônias.

Prisões, atropelamentos, casos de insolação, balburdia e até depredações acidentais no Palácio do Catete figuram no rol dos episódios registrados por ocasião dos atos solenes de ontem.

30 prisões

Com um verdadeiro pelotão de agentes, a Polícia Política auxiliava nos serviços de segurança. Sua primeira tarefa ingente teve lugar à frente da Câmara dos Deputados, quase à hora em que ali chegavam os srs. Juscelino Kubitschek e João Goulart. No meio da multidão os comunistas abriram suas faixas com dizeres contra o estado de sítio, pela legalidade do P.C.B., pela anistia aos presos políticos, etc., ocasião em que a autoridade foi impelida a agir, empregando processos violentos. O mesmo mais tarde ocorreu na frente do Palácio do Catete. Naquelas duas diligências foram efetuadas cerca de 30 prisões.
Acidentes e insolações


Numerosos foram os acidentes verificados por ocasião das solenidades. Só o posto central do SAMDU atendeu 150 casos a mais do que nos dias normais. A maioria, segundo fomos informados, por queimaduras de foguetes, atropelamentos de veículos e casos de insolação. Exaustivo foi também o trabalho do Pronto Socorro.

A saída do carro presidencial do Catete mais ou menos às 15 h 30 as salvas dos canhões espantaram um cavalo montado por um policial do Exército. O animal empinou enfurecido, jogou o cavaleiro ao solo e investiu contra a multidão: só foi contido depois de haver ferido várias pessoas. Felizmente não se registrou nenhum caso de maior gravidade.

Depredações no Catete


No Palácio do Catete, após haver recebido a presidência do sr. Nereu Ramos, o sr. Juscelino Kubitschek retirou-se para o salão de despachos, onde seria entrevistado e fotografado por jornalistas brasileiros e correspondentes estrangeiros.

Mal os representantes da imprensa se preparavam para a missão, as portas laterais estouraram, não resistindo à avalancha da multidão que se comprimia nas peças contíguas ao salão. Sobreveio uma balburdia infernal. E pela onda humana também ia sendo comprimido o sr. Juscelino Kubitschek. Estrategicamente auxiliado por elementos encarregados da segurança, o presidente conseguiu escapulir por um elevador.

O salão de despachos, momentos depois, parecia um campo de batalha: máquinas fotográficas danificadas, jornalistas com a roupa em fragalhos, a mesa presidencial com os seus vidros superiores completamente partidos, algumas cadeiras e sofás desengonçados e, a um canto, inteiramente danificado, um busto de Rui Barbosa.

Não fora possível a realização da entrevista coletiva. O sr. Kubitschek só voltou ao salão quando havia retornado a calma, ocasião em que assinou os atos de nomeação de seus ministros e outros auxiliares diretos.

Ouvindo dobrados


Nos jardins do Catete havia uma banda de Belo Horizonte executando dobrados. Para ali, e de forma estratégica, dirigiu-se o sr. Juscelino Kubitschek, agora cercado por forte cinturão de seguranças. Ouviu a música, aplaudiu-a, regressou ao interior do palácio. Na volta, abordado por alguns jornalistas que tinham conseguido romper o cerco, disse o presidente:

- "Trabalharei sem desfalecimentos pelos direitos do povo".

Três episódios na Câmara


Na Câmara dos Deputados, quando se aproximava o momento da posse, ocorreu um fato digno de registro: foi a homenagem prestada ao general Flores da Cunha. No instante em que tomava assento à mesa, o velho parlamentar gaúcho foi alvo de entusiásticas manifestações, sendo obrigado, por três vezes, a levantar-se para agradecer. Na última, muito emocionado, o sr. Flores da Cunha não conseguiu conter as lágrimas.

Quase ao mesmo tempo, naquela mistura de uniformes de fala, comendas, casacas, representantes de 61 nações, outro fato chamou a atenção da reportagem. Caminhava em direção ao deputado Emílio Carlos, um cavalheiro louro, tipo anglo-saxão, que envergava vistoso fraque, com algumas decorações. Pensando que o cidadão se dirigia a ele e que se tratava de membro de alguma missão estrangeira, indagou o parlamentar paulista:

- "What can I do for you?" (No que lhe posso ser útil?)

Surpreso, o cavalheiro interrogou em português:

- O quê?

Tratava-se de um cônsul brasileiro.

Aparato bélico


Desde às 10 horas da manhã tropas e viaturas do Exército começaram a tomar posição, desde o Palácio do Catete até às imediações do Palácio Tiradentes. Além dos pelotões em formação clássica, canhões de pequeno calibre e baterias antiaéreas foram colocados em toda a extensão da praia do Flamengo, praça Paris e avenida Beira Mar.

Toda essa movimentação bélica determinou, por sua vez, alteração no tráfego naqueles pontos, dificultando a circulação de veículos que durante várias horas, ou seja, até depois da chegada ao Catete do primeiro magistrado e das missões estrangeiras, teve de ser feita em fila indiana, rente ao passeio dos edifícios.

A intervalos regulares, soldados com fuzis-metralhadoras e equipamento subsidiário reforçavam o aparato militar observado no centro da cidade, com a utilização, em massa, da polícia civil e dos guardas de trânsito. Pelotões de motociclistas do Exército se mantiveram em constante circulação, para assegurar área livre nas pistas de rolamento entre o palácio presidencial e o edifício da Câmara dos Deputados, ou seja, no trajeto por onde passou o sr. Juscelino Kubitschek para as solenidades de prestação de compromisso, no Palácio Tiradentes e de posse, no Catete.

A FAB nas cerimônias

A Força Aérea Brasileira participou das solenidades de ontem. Uma esquadrilha de aviões a jato, em formação por 3, sobrevoou o centro da cidade durante a realização daquelas cerimônias.

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