II EXERCITO DOMINA O VALE DO PARAIBA

Publicado na Folha de S.Paulo, quarta-feira, 1 de abril de 1964

Neste texto foi mantida a grafia original

Vale do Paraiba, 1º (De Antonio Aggio Jr. e Lenine Severino enviados especiais) - Toda a região do Vale do Paraiba está sob controle das forças fiéis ao general Kruel, com a rodovia Presidente Dutra fortemente policiada por tropas do II Exercito e da Força Publica. O comando geral da região, subordinado à ID/2, está sob as ordens do coronel Souza Lobo, que assumiu o posto do general Euriale de Jesus Zerbini. Segundo informações que circulavam hoje cedo em Caçapava, o gen. Zerbini "desapareceu" durante a madrugada, sendo desconhecido o seu paradeiro.
Em Taubaté, a Força Publica ocupou a estação local da Estrada de Ferro Central do Brasil e, em Pindamonhangaba, o 2º Batalhão de Engenharia tomou conta militarmente da cidade, instalando ninhos de metralhadora.
Pela via Dutra seguiram em direção ao Rio 10 carros de combate leves, do Regimento Anhanguera, sabendo-se que por via ferrea segue tambem todo o 1º Batalhão de Carros de Combate Leves, com sede em Campinas.

Tropas em Minas

Sob o comando do cel. Gomes das Neves, chegaram à localidade de Serraria, nas vizinhanças de Paraibuna, as tropas enviadas pelo ministro da Guerra, gen. Jair Dantas Ribeiro, para dar combate as forças do gen. Olimpio Mourão Filho. O comando ocupou o Café e Bar Rio-Minas, ali estabelecendo o seu QG.
A coluna seguiu em duas centenas de caminhões e atingiu a divisa com Minas Gerais às primeiras horas da madrugada de hoje. Patrulhas avançadas já estabeleceram os primeiros contatos com as tropas do gen. Mourão. A tropa do 1º Exercito, que leva equipamento para alguns dias de campanha, está apoiada por numerosos obuses e unidades mecanizadas.

AB: não temos mais regime federativo

Nervosismo intenso foi o clima psicologico que dominou, durante todo o dia de ontem, o Palacio dos Campos Elísios, transformado, desde o início da manhã, num dos principais focos do interesse da imprensa. Informações dadas oficialmente eram logo depois desmentidas, provocando confusão nos representantes da imprensa, que tambem eram insistentemente "interrogados" sobre as ultimas informações dos acontecimentos no resto do país, principalmente a situação em Minas Gerais.

Rumores e reunião

O sr. Ademar de Barros chegou cedo à sede do governo, depois de efetuar rapida visita ao Hospital do Servidor Publico, onde se encontra convalescendo a primeira dama do Estado.
Interrogado sobre a situação nacional, e convidado a pronunciar-se sobre a crise militar no país, o governador negou-se a receber pessoalmente os representantes da imprensa.
Assessores oficiais do chefe do Executivo não confirmaram o propalado encontro do presidente da Camara Federal, dep. Ranieri Mazzilli, com o governador, que teria tido por local a residencia do senador Auro de Moura Andrade, durante a madrugada.
Por volta das 9 horas, o Serviço de Imprensa informava que o cardeal arcebispo de São Paulo, d. Carlos Carmelo de Vasconcelos Mota, se avistaria com o governador antes do almoço. O encontro acabou não se dando, informando-se posteriormente que o prelado havia comparecido ao colegio Sion, para uma reunião com bispos e não pudera comparecer aos Campos Elísios.
Depois de receber o vice-governador Laudo Natel e de despachar com o chefe da Casa Civil, os secretarios do Governo e da Segurança, alem do comandante da Força Publica, gen. Franco Pontes, o governador presidiu, no Salão Vermelho, reunião, com as bancadas do PSP e dos partidos situacionais na Assembléia Legislativa (noticiario em outro local).

Almoço secreto

Por volta das 12 horas, chegavam ao Palacio do Governo quatro altos oficiais da Marinha de Guerra, pertencentes - segundo declararam - à Comissão Naval em São Paulo, Grande sigilo cercou essa visita, tendo os militares se recusado terminantemente a declarar seus nomes aos jornalistas. O sr. Ademar de Barros recebeu os oficiais nos aposentos superiores da ala residencial, almoçando e mantendo encontro com eles. À sua saida, percebendo a presença de jornalistas, os militares deixaram o Palacio às escondidas, dali se retirando através de um tunel que liga a residencia à garagem, enquanto a perua da Marinha tentava despistar os reporteres.

Engenheiros e convocação

À tarde, um grupo de socios do Centro Democratico dos Engenheiros levou ao governador sua solidariedade, pelos recentes pronunciamentos e pela posição assumida pelo sr. Ademar de Barros na atual conjuntura nacional.
Agradecendo a manifestação, o governador paulista pronunciou discurso, lembrando que há muito tempo vinha prevendo os acontecimentos que ora se desenrolam. "Hoje - afirmou - não há mais necessidade de linguagem parabolica, como "vai chover", "previnam-se com guarda-chuvas, galochas e capas". Eu rezei muitas vezes para evitar esta encruzilhada. Mas, agora, desejo que ela venha, a fim de evitar que caminhemos para a miseria. O regime federativo não existe mais. A quebra da autoridade vem de cima. Vejam os senhores o episodio da Marinha de Guerra".
O sr. Ademar de Barros criticou a seguir, asperamente, o discurso feito na vespera pelo presidente João Goulart, dizendo que suas palavras foram "verdadeiros instrumentos para a agitação nacional".
Finalizando, despediu-se dos engenheiros, fazendo-lhes uma convocação: "Quero convocá-los. O que será, eu não sei. Mas tenho a certeza de que não será uma luta facil. Posso assegurar que haverá ordem em São Paulo. Que ninguem pense que irá pegar-nos desprevenidos".

Nova recusa

No inicio da noite, os jornalistas tentaram novamente um pronunciamento do governador, mas este, mais uma vez, recusou-se. Informou, através de um assessor, que não desejava pronunciar-se sobre a situação, enquanto não se confirmassem as noticias que vinha recebendo, às 20h30, gravou um videotape contendo uma declaração em favor da legalidade, transmitido, através de uma rede de emissoras de TV, às 22h30.

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