SYLVIA
COLOMBO
Da
Redação
"Até o Cristo Redentor põe a mão no ouvido",
diz a letra de "Os Três Pagodeiros do Rio''. Heresia
mesmo cometem os sambistas Moreira da Silva, Dicró e Bezerra
da Silva no CD "Os 3 Malandros'', que será lançado
na próxima semana pela gravadora CID.
Os
sambistas resolveram fazer uma sátira à pompa e ao glamour
dos tenores Plácido Domingo, José Carreras e Luciano Pavarotti.
E a brincadeira vai ainda mais longe. "Estamos revoltados
também com a falta de espaço da gente simples no cenário
cultural. O samba do morro não desce para a cidade'',
diz Dicró.
Em
" Ópera do Morro'' eles desafiam Pavarotti e cia.
a subirem o morro e tocarem o pagode. "Lá em cima
não há Metropolitan e nem acompanhamento de luxo, queria
só ver o talento deles acontecer'', diz Moreira da Silva.
Dicró
usa requintes de crueldade. "E se eu desse uma partitura
em papel de pão, imagine a cara deles.'' A idéia da gravação
do disco partiu do produtor musical Esdras Pereira. "Primeiro
nós íamos gravar só Bezerra da Silva e Dicró. Depois que
Moreira se juntou pintou a idéia, afinal são três malandros
ou não?''.
O
resultado foi um disco bem-humorado, que dá um breque
até na Quinta Sinfonia de Beethoven. Os três estão longe
de não gostar de música clássica. " Ópera é lavagem
cerebral, faz um bem enorme'', diz Dicró.
O
trio insiste em manter a diplomacia e juram não dirigir
a crítica a ninguém em específico, muito menos a um tipo
de público. "Humor não tem idade'', diz Dicró.
Um
grito de "Figaro'' quebra cristais, "Corneto
Mio'' vira xingamento e o bolero de Ravel ganha sua versão
pagodeira. Nada mau para quem grita a plenos pulmões:
"Eu já fui pintor/Agora sou tenor''.
Para
a gravação, os três assistiram muita ópera, conversaram
e, durante muito papo informal, as piadas foram surgindo
aos poucos. "É um processo antigo de produção, só
bate-papo e naturalidade'', diz Dicró. Mas quem for se
entusiasmando com a brincadeira logo sofre uma pequena
decepção.
A sátira aos tenores vai só até a quarta faixa. Depois
disso alternam-se interpretações individuais dos três
sambistas. O
fino da malandragem. Mulheres, jogo, noite, boêmia e dinheiro
estão presentes nas outras faixas: "Na Subida do
Morro'', "Jogando com o Capeta'', "Dava Dois''
e "Ressuscita ele''.
Em
"O Político'' volta o tom satírico e Dicró destila
sua ironia em relação às classes mandantes: "Protesto,
mesmo estando velho, é um desafio para a juventude''.
Para promover o lançamento os três devem gravar um clipe.
"Queremos fazer cenas em frente aos lugares chiques
de espetáculo do Rio'', diz Dicró.
A
capa do disco já introduz a brincadeira. Os sambistas
aparecem nas escadarias do Teatro Municipal do Rio. "Lugar
onde o nosso tipo de música nunca entra'', diz Moreira
da Silva. Saudoso da malandragem, ele recusa que ela seja
um fato datado. "Nunca vai acabar, o problema é que
as pessoas pararam de se preocupar com mensagens bonitas.''
Para ele malandragem e baixaria são opostos. "Não
uso linguagem chula e não desrespeito mulher. Grosseria
satura todo mundo.''
Apesar
da idade, os três esbanjam agilidade. Dicró, 49, Moreira,
93, e Bezerra, 65, ainda esperam fazer um videoclipe e
alguns shows juntos. "O clipe tem que ser na porta
do Teatro Municipal e eu quero um tapete vermelho'', resmunga
Dicró.
Eles
não querem nem ver os verdadeiros fãs dos reais tenores.
"Se eles tiverem bom humor tudo bem, mas pelo jeito
gente bacana pode olhar torto. Entendam que é brincadeira'',
diz Dicró. "No fundo'', confessa, "somos malandros,
admiramos os tenores e não cantamos coisa nenhuma.''
Disco:
Os 3 Malandros Com: Moreira da Silva, Bezerra da Silva
e Dicró
Gravadora:
CID .