BELMONTE
Quando
Hitler subiu ao poder a sua primeira preocupação, depois da caçada
épica aos communistas e judeus, foi investir com fera energia contra
os clubes de nudismo que ameaçavam transformar a austera Allemanha
num novo jardim do Eden, com Adões e Evas de varios feitios antes
do peccado original.
Achou
o "reichfuehrer" que o que se pretendia apresentar aos povos estupefactos
como sendo o exercicio salutar de um systema hygienico de vida,
não passava, em ultima analyse, de grossa patifaria. Mas, para que
se não dissesse que o dictador pretendia exercer uma tyrannia draconiana
contra os adeptos sinceros da "nachtkultur", exigiu que esses clubes
reformassem seus estatutos e que os nudistas, quando nos seus acampamentos,
exercessem uma prudente separação de sexos afim de evitar que as
macieiras da Allemanha acabassem sem uma fruta e, talvez mesmo,
sem uma folha. Jeovah certamente, não applaudiria esse saque furioso
ás maçãs do Eden...
Não
sei como acabou essa historia mas estou inclinado a crêr - na falta
dos informes sugestivos da "Lachendes Leben" - que a "nachtkultur",
na Allemanha, foi um sonho que passou... Quem quizer andar nú, que
o faça dentro de casa, muito ás occultas, praticando a helliotherapia
no rectangulo luminoso de uma janella avara. O nazismo não admitte
a existencia de Evas, principalmente na companhia perigosa de Adões,
embora estes, com evangelica pudicicia, prefiram contemplar os encantos
da natureza a deliciar-se nos fascinios das companheiras. Se nos
campos da Allemanha não ha serpentes perversas sopram macieiras
tentadoras... E quanto ás macieiras... "hoc opus, hie periculo est..."
Mas
enquanto succedem esses factos consideraveis além-Rheno, a França
acaba de eleger a sua "miss Venus" de 1935, uma garota do barulho,
loira e maravilhosa - e a Norte America vem de consagrar "o corpo
mais perfeito de Nova York" na pessoa de uma venezuelana morena,
de uma belleza equatoriana, ardente e explosiva. Ambas as "rainhas"
a loira parisiense e a "morocha" da Venezuela, são modelos de artistas
e representam bem, as inclinações estheticas de dois povos differentes.
Enquanto os desenhistas, americanos sem tradições artisticas mas
de temperamento esportivo, preferem os "modelos" magros e ageis,
os seus collegas francezes optam pela mulher - mulher, solida e
hellenica sem angulosidades osteologicas nem tapeações esportivas.
Nesse sentido, a loira que ganhou os louros na Sala Pleyel, diante
do julgamento severo desse Paris valetudinario que é o pintor Van
Dongen, representa bem o typo "standar" da belleza européa, em contraposição
á venezuelana de Nova York, magra e quasi angulosa, agil mas fragil,
que é o estalão de belleza de desenhistas, famosos como Mac Clelland,
Chandler Christy e Dean Cromwell.
Não
se conclua dahi que o liberalismo francez e americano estejam com
a mania de cultuar o nú, apenas para fazer fosquinhas ao frio moralismo
hitleriano. O desfile das Evas, tanto em Paris, como em Nova York,
foi levado a effeito em recintos fechados, diante de um jury misto
mas onde não havia Adões - ou melhor, onde os Adões estavam prudentemente
vestidos e, alguns, até mesmo encapotados. E as Venus que desfilaram
eram, quasi todas, modelos de artistas - o que não occoria nos acampamentos
de "nachtkultur", onde havia, até verdadeiros "phenomenos" anatomicos,
mais dignos de figurarem num circo ou num museu teratologico do
que diante de cidadãos de relativo bom gosto.
E
nós?
Nós,
graças aos politicos, acabaremos nús com a mão no bolso, porque
o tal reajustamento ainda nos levará a ultima camisa...
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