Por
Elaine Muniz Pires
do
Banco
de Dados
Barra Funda
NO
crescimento e desenvolvimento de São Paulo nas últimas
décadas do século 19 propiciou a ocupação
das várzeas dos rios na cidade e o surgimento de novos
bairros. Chácaras foram loteadas e a construção
de estações de trem trouxeram novas atividades econômicas
para estas regiões. O bairro da Barra Funda é um
bom exemplo deste processo. Lá se localizava a Chácara
do Carvalho, divisão do antigo sítio de propriedade
do Barão de Iguape, que abrangia ainda parte da Casa Verde
e da Freguesia do Ó. Herdada por Antônio da Silva
Prado, a sede da Chácara foi encomendada a Luigi Puci em
1890, pouco tempo antes de suas terras serem loteadas.
A ocupação do bairro está estreitamente ligada
à construção de estradas de ferro para escoamento
da produção do café na cidade. Em 1875, a
estação Barra Funda da Estrada de Ferro Sorocabana
foi inaugurada integrando o primeiro trecho da linha. A estação
permaneceu como depósito e armazém de produtos transportados
entre o porto e o interior até os anos 20 quando passou
a transportar passageiros. Já a estação da
São Paulo Railway inaugurada em 1892, bem próxima
à estação da Sorocabana, onde hoje se encontra
o viaduto Pacaembu, atendeu desde o início à crescente
população do bairro atraída pela demanda
de trabalho gerada nos armazéns das ferrovias e de particulares.
Os primeiros habitantes da Barra Funda, após o loteamento
da chácara, foram imigrantes italianos. Além dos
trabalhos relacionados à ferrovia, estabeleceram nas suas
casas serrarias e oficinas mecânicas que atendiam à
população abastada dos Campos Elíseos. Porém,
o que mais marca sua presença na Barra Funda é a
construção civil. Até hoje a maior parte
das casas do bairro possuem uma arquitetura simples com algumas
características em comum: construções geminadas
que possuem uma entrada lateral, uma fileira de cômodos,
uma cozinha, um quintal e um porão. Esta arquitetura é
conhecida como "ponta de chuva", por serem as casas
traçadas pelos capomastri (mestre de obras) italianos com
a ponta de um guarda-chuva na terra no início da construção.
No início do século 20, as características
do bairro começam a mudar. A população que
era predominante branca passou a receber os primeiros negros,
presença que se intensificou nas décadas seguintes.
O sistema de transportes da região foi contemplado, em
1902, com o primeiro bonde elétrico de São Paulo
que ligava a Barra Funda ao largo São Bento. Acompanhando
o trajeto do bonde, ruas como Barra Funda, Brigadeiro Galvão
e Anhanguera_ onde se localizava o ponto final_ aglutinaram atividades
comerciais e de serviços. O desenvolvimento deste pólo
comercial, assim como sua proximidade dos bairros Higienópolis
e Campos Elíseos, atraiu alguns representantes da classe
média cafeeira e industriais que nesta região passaram
a residir, enquanto estabeleciam suas indústrias do outro
lado do bairro, a Barra Funda de baixo. A divisão do bairro
data da construção das linhas de trem que separaram
a região localizada entre a linha de trem e a marginal
Tietê (Barra Funda de baixo) e a localizada entre a linha
de trem e os Campos Elíseos (Barra Funda de cima). Por
muito tempo foram ligadas por duas porteiras, uma na rua Anhanguera
e outra na rua Assis. A parte de cima até hoje goza de
maior infra-estrutura e poder aquisitivo.
Diante da infra-estrutura que o bairro possuía e da concentração
de mão-de-obra, as primeiras décadas do século
20 assistiram a uma ocupação industrial impressionante.
Além das indústrias instaladas na própria
Barra Funda, na Água Branca, um grande parque industrial
foi erguido na década de 20: as Indústrias Reunidas
Matarazzo. Com uma área de 100 mil metros quadrados, reuniam
diversas atividades industriais e empregavam um grande número
de moradores do bairro. Até uma estação de
trem da São Paulo Railway foi construída nas mediações
do parque industrial para o escoamento do que ali era produzido.
Mas o desenvolvimento econômico da região seria abalado
pela crise de 29. Os casarões da antiga classe média
cafeeira foram abandonados e com o tempo se transformaram em cortiços.
Indústrias fecharam ou transferiram suas atividades. Ao
bairro restaram as oficinas mecânicas, serrarias, marcenarias
e indústrias alimentícias ou têxteis de pequeno
porte.
No plano cultural, este período marcaria a história
da música nacional. A região é considerada
um dos berços do samba paulista. O Largo da Banana era
o ponto de encontro para os sambas de rodas, rodas de tiririca
(capoeira) e serestas. Conhecido assim pela venda de cachos de
banana, o largo é louvado em sambas conhecidos, como nas
letras de Geraldo Filme. Lá que foi fundado por Dionísio
Barbosa o primeiro cordão carnavalesco paulista, o Grupo
Carnavalesco Barra Funda. Formado por membros da população
negra que se sentiam excluídos da Festa do Momo, o grupo
teve que paralisar suas atividades nos anos 40 por problemas políticos.
Reorganizado como Camisa Verde por Inocêncio Tobias, foi
perseguido pela polícia política de Vargas confundido
como simpatizante do Partido Integralista até a alteração
do nome para Camisa Verde e Branco. O primeiro desfile do grupo
data de 1954, na comemoração do IV Centenário
de São Paulo.
Os anos 70 marcam a chegada dos migrantes nordestinos ao bairro.
O pólo industrial ali localizado nas primeiras décadas
do século sofreu um processo crescente de refluxo com o
fechamento, transferência ou falências das unidades
produtoras, o que propiciou uma maior ocupação residencial
do bairro com a chegada dos novos habitantes. No início
dos anos 80, o setor industrial se apresentava quase reduzido
a zero na região. Porém, a partir de 1989 as coisas
começariam a mudar. Foi inaugurado Terminal Intermodal
Barra Funda que reúne todas as modalidades do transporte
coletivo (metrô, trens de passageiros das antigas linhas
Sorocabana e Santos-Jundiaí sob a administração
da CPTM, transporte rodoviário, ônibus municipais
e intermunicipais). No mesmo ano, no antigo Largo da Banana, foi
inaugurado o Memorial da América Latina projetado por Oscar
Niemeyer. Estas transformações trouxeram nova vida
ao bairro. Muitas casas deram lugar a estabelecimentos comerciais,
prédios de negócios se instalaram, imóveis
antigos foram revitalizados. Em 1995, a Rede Record ali se estabeleceu
e em suas proximidades o Parque Industrial Thomas Edison e o Centro
Empresarial Água Branca, inaugurado em 2001.
No campo cultural e de entretenimento, além do Memorial
da América Latina, o bairro possui um galpão de
exposições onde funciona regularmente o Mercado
Mundo Mix_que reúne confecções e artigos
de decoração de novos designers, o Teatro São
Pedro, datado de 1917, e o Parque de Diversões Playcenter.
Nos arredores se localizam também o Shopping West Plaza,
o Parque Antártica, o Galpão Fábrica, o Parque
da Água Branca e o Sesc Pompéia.